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"A poupança cresceu ao longo deste ano a uma dimensão que não esperávamos." A frase é de Pedro Passos Coelho, de Setembro de 2012. O primeiro-ministro justificou a incapacidade de atingir a meta de défice desse ano com a decisão dos portugueses de não gastarem o dinheiro que tinham "por receio ou precaução". Essa decisão prejudicou a economia, as receitas fiscais e, por arrasto, o cumprimento das metas do défice.
Depois de vários anos com uma taxa de poupança saudável (estava nos 20% em 1982), entre 2003 e 2007, a poupança dos portugueses caiu para 7% do seu rendimento disponível bruto, o valor mais baixo entre todos os países da Zona Euro. A tendência era mundial. A poupança caiu, arrastada por juros baixos, legislação flexível no crédito e a emergência de novos produtos financeiros. Em Portugal, a crise e os sucessivos pacotes de austeridade, trouxeram uma nova inversão desta tendência em 2009. Hoje, as famílias portuguesas comparam bem com os outros países da moeda única. Mas numa altura de tentativa de recuperação económica pode isso ser um mau sinal?
Afinal, por que devemos poupar? Além de criar uma almofada financeira para alturas de crise, a teoria económica aponta a poupança como uma espécie de semente do investimento. Explicado de forma muito simples: os bancos recebem poupanças, normalmente sob a forma de depósitos, e distribuem-nas via concessão de crédito a empresas e famílias. Teoricamente, essa poupança dinamiza o investimento e o consumo, faz mexer a economia e acaba por gerar mais emprego e rendimento.
Paula Carvalho, economista-chefe do BPI, explica ao Negócios que "não faz sentido dizer que os portugueses estão a poupar demais". "São valores robustos, mas nem são os mais elevados da Zona Euro. Claro que, no imediato, prejudica a actividade económica, mas é preciso não esquecer que a poupança actual é investimento futuro."
Um país poupar demais não é um fenómeno inédito e tem nome: paradoxo da poupança. O termo popularizado por Keynes significa que se todos pouparmos mais durante uma recessão, a queda da procura e os efeitos no consumo e economia, acabarão por reduzir as poupanças.
Os últimos números comparáveis entre países europeus mostram que Portugal – que terminou 2012 com uma taxa de poupança de 11,6% – está acima da média da União Europeia. Ainda muito longe dos 16,4% alemães ou dos 15,2% franceses, mas acima de países como Irlanda (10%) e Espanha (10,4%).
Excessivo ou não, o certo é que o aumento da poupança dos portugueses surpreendeu. E o motivo pode ser o "choque de expectativas" referido pelo primeiro-ministro: nos últimos dois anos, o consumo das famílias caiu duas vezes mais do que o seu rendimento disponível. Sucessivos pacotes de austeridade deixaram marcas. "Reflecte mais incerteza quanto ao futuro, ao mercado de trabalho e ao rendimento", sublinha Paula Carvalho.
Ainda hoje, o Japão é provavelmente conhecido por ter taxas de poupança elevadíssimas, apesar de isso já não ser verdade. Nos anos 90, a taxa de poupança das famílias japonesas chegou a estar nos 44%, tendo caído progressivamente até aos 2%. No próximo ano, deverá ficar abaixo de 1%. Uma das principais justificações avançadas para este fenómeno é o envelhecimento significativo do país. A partir de determinada idade, o incentivo para poupar reduz-se consideravelmente. Outros estudos atribuem pouco influência ao factor demográfico e apontam como motivo o maior número de famílias com dificuldades de liquidez ou o maior apetite por investimentos financeiros. Actualmente, quem são os mais poupados em todo o mundo? Os chineses, com uma taxa de poupança de 38%.