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Tsipras arrisca eleições, só falta saber quando
À medida que o terceiro resgate para a Grécia entra na fase final de aprovação em vários países do euro, adensa-se a dúvida sobre se, em Atenas, haverá Governo com condições de executar o prometido.
Apresentar uma moção de confiança para obrigar os deputados insurrectos do Syriza a escolher fileiras, mesmo correndo o risco de ser forçado a convocar eleições antecipadas no caso (provável) de perda de maioria parlamentar, parecia ser até agora o "plano A" de Alexis Tsipras. Aproveitando a janela de oportunidade de as sondagens ainda lhe serem favoráveis, o primeiro-ministro poderia, desta forma, tentar recuperar legitimidade política e uma solução de Governo mais estável que lhe permita aplicar o pacote de austeridade e de reformas económicas que acordou a troco do terceiro resgate europeu – e que é praticamente o negativo do programa eleitoral com que se elegeu há seis meses.
Independentemente do resultado (sempre incerto), antecipar eleições significará, porém, pelo menos um mês de actividade parlamentar suspensa, o que provavelmente obrigaria a adiar a aprovação prevista para Outubro de um Orçamento rectificativo para este ano e do plano orçamental para os próximos três, como prometido por Atenas. "Para demonstrar o seu compromisso com políticas orçamentais credíveis, o Governo vai adoptar, em Outubro de 2015, um orçamento rectificativo para 2015 como necessário, o projecto do orçamento para 2016 e o programa de estratégia orçamental de médio prazo para 2016 a 2018", com medidas que incluam "uma segunda fase da reforma de pensões", "uma reforma do código fiscal sobre o rendimento" e "a eliminação gradual do tratamento fiscal preferencial dado aos agricultores", lê-se no novo memorando.
Atrasados ficariam também o processo de recapitalização dos bancos, bem como o calendário da primeira avaliação da troika, sem o qual os europeus não voltarão a flexibilizar as condições de reembolsos dos mais de 200 mil milhões de euros já emprestados – e sem isso, o FMI não entra no terceiro resgate, e sem o FMI a bordo a Alemanha promete cair fora.
Legislar mais medidas impopulares e depois eleições, ou inverter a ordem?
No seio do Governo, o risco desse vazio legal está também a ser pesado – e estará a pesar mais do que o desgaste da popularidade de Tsipras, que aconselha a antecipação de eleições. Segundo alguma imprensa grega, Tsipras está a ponderar convocar uma sessão parlamentar extraordinária para aprovar rapidamente as medidas previstas para Outubro e só depois apresentará uma moção de confiança, atirando o calendário de eventuais eleições antecipadas de meados de Setembro para o fim do mês de Outubro. O parlamento grego funciona a meio gás entre Julho e Setembro, exigindo-se a disponibilidade rotativa nesses meses de apenas um terço dos seus 300 deputados. Tsipras terá a expectativa de que, nesse universo mais pequeno, seja mais fácil aprovar nova legislação sem assistir a uma nova sangria de apoios.
Relativamente certo é que, mais mês menos mês, os gregos serão chamados de novo às urnas pela terceira vez em menos de um ano (contando com o referendo de Julho, que deu uma vitória inconsequente ao "não" a mais austeridade).
"Tsipras pode surfar uma série de ondas no Outono. Depois de conseguir um terceiro resgate com relativamente pouco alarido e ‘feedback’ positivo dos decisores europeus, ainda tem uma chance de convencer os eleitores do centro de que é capaz de estabilizar a Grécia, ao mesmo tempo que, se avançar nos seus planos para combater a corrupção e a injustiça social, pode manter viva a esperança de manter o apoio da esquerda", analisa Nick Malkoutzis. "Estas serão mensagens muito mais fáceis de fazer passar se os gregos ainda não estiverem a sentir o custo de uma nova ronda de cortes nas pensões, aumentos do IVA e outros ajustamentos", alerta o editor de economia do site noticioso Macropolis.
Vários deputados fiéis ao primeiro-ministro têm defendido esta via, argumentando ser fundamental obter um novo mandato popular e ao mesmo tempo separar as águas no seio do Syriza, um conglomerado de mais de uma dezena de movimentos políticos feito para fazer oposição e que se está a desfazer com os compromissos da governação. "As eleições são imperativas para a estabilidade política. Devido aos problemas na maioria (parlamentar) do governo, a situação pode ser chamada de qualquer coisa menos de estável", disse nesta semana o novo ministro da Energia, Panos Skourletis.
Um terço dos deputados do Syriza rebelou-se contra o primeiro-ministro Alexis Tsipras na passada sexta-feira, votando contra ou abstendo-se quando este submeteu ao parlamento o projecto de "memorando de entendimento" onde se descrevem as metas e as medidas que terão de ser seguidas até ao fim de 2018 a troco de um terceiro empréstimo europeu de até 86 mil milhões de euros. O memorando acabou por ser aprovado graças aos votos dos partidos europeístas na oposição, Nova Democracia, Pasok e To Potami, que já avisaram que não votarão uma moção de confiança que exigirá 120 votos favoráveis – menos do que os 118 obtidos por Tsipras entre as suas fileiras nesta última votação.
Syriza: divórcio à vista
A rebelião é protagonizada por duas importantes figuras do Syriza: Panagiotis Lafazanis, ex-ministro da Energia da Grécia entretanto afastado por Tsipras, e Zoe Constantopoulou, presidente do parlamento. Lafazanis, figura de proa da Plataforma de Esquerda, a corrente mais à esquerda entre os que integram a coligação de esquerda radical, anunciou entretanto a criação de um novo movimento que tem como finalidade o combate político às medidas de austeridade aceites pelo governo a troco do novo resgate financeiro.
Hoje mesmo, o ministro de Estado Nikos Pappas acusou os seus companheiros de partido de quererem "um empréstimo europeu para financiar o regresso ao dracma", e de preferirem uma via que "seria muito mais prejudicial para as classes sociais que a esquerda quer representar". O congresso do partido, agendado para Setembro, promete assim, ditar a morte do Syriza nos moldes actuais, formalizando o divórcio das suas principais correntes.
Aparentemente certo, é que Tsipras não mexerá um dedo até esta quinta-feira, 20 de Agosto, dia em que se vencem 3,2 mil milhões de euros de títulos de dívida grega comprados em 2010 pelo BCE, para o qual precisa de um novo cheque europeu. O novo resgate grego entrou na fase final de aprovação nos parlamentos dos demais países do euro, mas ainda falta o "ok" de alguns, designadamente do parlamento alemão, que deverá votar nesta quarta-feira, revelando uma crescente resistência à concessão de mais empréstimos à Grécia.