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Tsipras arrisca eleições, só falta saber quando

À medida que o terceiro resgate para a Grécia entra na fase final de aprovação em vários países do euro, adensa-se a dúvida sobre se, em Atenas, haverá Governo com condições de executar o prometido.

Bloomberg
18 de Agosto de 2015 às 18:21
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Apresentar uma moção de confiança para obrigar os deputados insurrectos do Syriza a escolher fileiras, mesmo correndo o risco de ser forçado a convocar eleições antecipadas no caso (provável) de perda de maioria parlamentar, parecia ser até agora o "plano A" de Alexis Tsipras. Aproveitando a janela de oportunidade de as sondagens ainda lhe serem favoráveis, o primeiro-ministro poderia, desta forma, tentar recuperar legitimidade política e uma solução de Governo mais estável que lhe permita aplicar o pacote de austeridade e de reformas económicas que acordou a troco do terceiro resgate europeu – e que é praticamente o negativo do programa eleitoral com que se elegeu há seis meses.


Independentemente do resultado (sempre incerto), antecipar eleições significará, porém, pelo menos um mês de actividade parlamentar suspensa, o que provavelmente obrigaria a adiar a aprovação prevista para Outubro de um Orçamento rectificativo para este ano e do plano orçamental para os próximos três, como prometido por Atenas. "Para demonstrar o seu compromisso com políticas orçamentais credíveis, o Governo vai adoptar, em Outubro de 2015, um orçamento rectificativo para 2015 como necessário, o projecto do orçamento para 2016 e o programa de estratégia orçamental de médio prazo para 2016 a 2018", com medidas que incluam "uma segunda fase da reforma de pensões", "uma reforma do código fiscal sobre o rendimento" e "a eliminação gradual do tratamento fiscal preferencial dado aos agricultores", lê-se no novo memorando.

Atrasados ficariam também o processo de recapitalização dos bancos, bem como o calendário da primeira avaliação da troika, sem o qual os europeus não voltarão a flexibilizar as condições de reembolsos dos mais de 200 mil milhões de euros já emprestados – e sem isso, o FMI não entra no terceiro resgate, e sem o FMI a bordo a Alemanha promete cair fora.

Devido a esses riscos, os partidos da oposição têm-se mostrado avessos a eleições antecipadas, em particular o Nova Democracia que acaba de eleger um novo líder e que dificilmente escaparia a uma derrota eleitoral.

Legislar mais medidas impopulares e depois eleições, ou inverter a ordem?


No seio do Governo, o risco desse vazio legal está também a ser pesado – e estará a pesar mais do que o desgaste da popularidade de Tsipras, que aconselha a antecipação de eleições. Segundo alguma imprensa grega, Tsipras está a ponderar convocar uma sessão parlamentar extraordinária para aprovar rapidamente as medidas previstas para Outubro e só depois apresentará uma moção de confiança, atirando o calendário de eventuais eleições antecipadas de meados de Setembro para o fim do mês de Outubro. O parlamento grego funciona a meio gás entre Julho e Setembro, exigindo-se a disponibilidade rotativa nesses meses de apenas um terço dos seus 300 deputados. Tsipras terá a expectativa de que, nesse universo mais pequeno, seja mais fácil aprovar nova legislação sem assistir a uma nova sangria de apoios.

 

Relativamente certo é que, mais mês menos mês, os gregos serão chamados de novo às urnas pela terceira vez em menos de um ano (contando com o referendo de Julho, que deu uma vitória inconsequente ao "não" a mais austeridade).

 

"Tsipras pode surfar uma série de ondas no Outono. Depois de conseguir um terceiro resgate com relativamente pouco alarido e ‘feedback’ positivo dos decisores europeus, ainda tem uma chance de convencer os eleitores do centro de que é capaz de estabilizar a Grécia, ao mesmo tempo que, se avançar nos seus planos para combater a corrupção e a injustiça social, pode manter viva a esperança de manter o apoio da esquerda", analisa Nick Malkoutzis. "Estas serão mensagens muito mais fáceis de fazer passar se os gregos ainda não estiverem a sentir o custo de uma nova ronda de cortes nas pensões, aumentos do IVA e outros ajustamentos", alerta o editor de economia do site noticioso Macropolis.

Tsipras pode surfar uma série de ondas no Outono (...) mas as mensagens serão muito mais fáceis de fazer passar se os gregos ainda não estiverem a sentir o custo de uma nova ronda de cortes nas pensões, aumentos do IVA e outros ajustamentos
Nick Malkoutzis, editor do Macropolis


Vários deputados fiéis ao primeiro-ministro têm defendido esta via, argumentando ser fundamental obter um novo mandato popular e ao mesmo tempo separar as águas no seio do Syriza, um conglomerado de mais de uma dezena de movimentos políticos feito para fazer oposição e que se está a desfazer com os compromissos da governação. "As eleições são imperativas para a estabilidade política. Devido aos problemas na maioria (parlamentar) do governo, a situação pode ser chamada de qualquer coisa menos de estável", disse nesta semana o novo ministro da Energia, Panos Skourletis.

Um terço dos deputados do Syriza rebelou-se contra o primeiro-ministro Alexis Tsipras na passada sexta-feira, votando contra ou abstendo-se quando este submeteu ao parlamento o projecto de "memorando de entendimento" onde se descrevem as metas e as medidas que terão de ser seguidas até ao fim de 2018 a troco de um terceiro empréstimo europeu de até 86 mil milhões de euros. O memorando acabou por ser aprovado graças aos votos dos partidos europeístas na oposição, Nova Democracia, Pasok e To Potami, que já avisaram que não votarão uma moção de confiança que exigirá 120 votos favoráveis – menos do que os 118 obtidos por Tsipras entre as suas fileiras nesta última votação.


Syriza: divórcio à vista

A rebelião é protagonizada por duas importantes figuras do Syriza: Panagiotis Lafazanis, ex-ministro da Energia da Grécia entretanto afastado por Tsipras, e Zoe Constantopoulou, presidente do parlamento. Lafazanis, figura de proa da Plataforma de Esquerda, a corrente mais à esquerda entre os que integram a coligação de esquerda radical, anunciou entretanto a criação de um novo movimento que tem como finalidade o combate político às medidas de austeridade aceites pelo governo a troco do novo resgate financeiro.

Hoje mesmo, o ministro de Estado Nikos Pappas acusou os seus companheiros de partido de quererem "um empréstimo europeu para financiar o regresso ao dracma", e de preferirem uma via que "seria muito mais prejudicial para as classes sociais que a esquerda quer representar". O congresso do partido, agendado para Setembro, promete assim, ditar a morte do Syriza nos moldes actuais, formalizando o divórcio das suas principais correntes.

 

Aparentemente certo, é que Tsipras não mexerá um dedo até esta quinta-feira, 20 de Agosto, dia em que se vencem 3,2 mil milhões de euros de títulos de dívida grega comprados em 2010 pelo BCE, para o qual precisa de um novo cheque europeu. O novo resgate grego entrou na fase final de aprovação nos parlamentos dos demais países do euro, mas ainda falta o "ok" de alguns, designadamente do parlamento alemão, que deverá votar nesta quarta-feira, revelando uma crescente resistência à concessão de mais empréstimos à Grécia.

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