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Ramón Fonseca: "Há mais dinheiro sujo em Nova Iorque e Londres do que no Panamá"

É um dos fundadores da Mossack Fonseca, a firma no centro do escândalo “Panamá Papers”, mas está seguro que este caso não vai levar aos tribunais. Diz que dorme de consciência tranquila e critica o que chama de "caça às bruxas". ,

Reuters
05 de Abril de 2016 às 13:11
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Um dos fundadores da Mossack Fonseca, a firma no centro do escândalo "Panama Papers", disse em entrevista ao Financial Times que não acredita que os acontecimentos recentes "conduzam a um único caso legal". O responsável caracterizou o caso como "uma caça às bruxas" sobre um negócio legítimo. "Garanto que há mais dinheiro sujo em Nova Iorque, em Londres e Miami do que no Panamá", acrescentou.

Ramón Fonseca, co-fundador da firma de advogados Mossack Fonseca, deu uma entrevista ao jornal na sequência do escândalo de corrupção "Panama Papers" que expôs 11,5 milhões de documentos que revelam firmas "offshore" alegadamente utilizadas para esconder fortunas, fugir aos impostos e lavar dinheiro.

Centenas de figuras públicas – entre os quais 140 antigos e actuais dirigentes políticos - estão implicadas no caso divulgado no domingo, 3 de Abril, pelo Consórcio Internacional de Jornalistas de Investigação.

"Não espero que isto [Panama Papers] conduza a um único caso legal", disse o responsável ao Financial Times (FT), acrescentando que "montar empresas não é um pecado".

"O direito à privacidade é muito importante – todos têm direito a ela. É algo que se tem vindo a perder nos dias de hoje mas é um direito humano", salientou Ramón Fonseca, recusando qualquer má prática da sua empresa.

cotacao O direito à privacidade é muito importante – todos têm direito a ela. É algo que se tem vindo a perder nos dias de hoje mas é um direito humano. Ramón Fonseca Co-fundador da firma de advogados Mossack Fonseca

 

Para o responsável, este caso é "uma caça às bruxas" que pretende minar uma indústria legítima que é a de montar empresas "offshore".

"Nós abrimos mais de 250 mil empresas… os nossos padrões são muito altos", garantiu, acrescentando que qualquer sinal de más práticas por parte dos clientes teria levado a Mossack Fonseca a recuar. Todavia, reconhece, "estatisticamente, algumas poderiam ter alguns problemas".

Ramón Fonseca explicou que a empresa não lidava directamente com os clientes e que nos primeiros tempos, antes da introdução de regulação mais restritiva no Panamá e a nível global, a empresa nem sequer saberia a sua identidade. A firma actuava sobretudo através de intermediários, esclareceu, tipicamente bancos ou advogados.

"É como se você comprasse um carro e o vendesse a um stand e o stand vende a uma mulher que mata alguém – a fábrica não é responsável", exemplificou.

"Garanto que há mais dinheiro sujo em Nova Iorque, em Londres e Miami do que no Panamá", disse Ramón Fonseca, insistindo que o país tem um sector financeiro regulado.

Recorda o Financial Times que Ramón Fonseca era conselheiro do presidente Juan Carlos Varela, do Panamá, um cargo que abandonou no mês passado depois de a sua firma se ver envolvida no escândalo brasileiro Lava Jato. A Mossack Fonseca fechou os seus escritórios no Brasil na sequência deste caso, mas, segundo Ramón Fonseca as investigações não deram em nada pelo que a firma está a ponderar reabrir nesta localização.

A entrevista terminou com Ramón Fonseca a garantir que "dorme sempre bem à noite". "A minha consciência está tranquila", acrescentou.

Panama Papers Perguntas e respostas O que são os "Papéis do Panamá"?
Só começaram a ser divulgados na noite de domingo, 3 de Abril, mas os "Papéis do Panamá" ("Panama Papers" em inglês) já são apontados como a maior investigação jornalística da história, envolvendo o Consórcio Internacional de Jornalistas de Investigação (ICIJ, na sigla inglesa), com sede em Washington. Resultado de uma fuga de informação, a investigação refere que milhares de empresas foram criadas em "offshores" e paraísos fiscais para centenas de personalidades mundiais administrarem o seu património.

Que quantidade de dados foi interceptada?
Mais de 11,5 milhões de documentos e 2,6 terabytes de informação secreta foram retirados da base de dados interna da empresa Mossack Fonseca, com sede no Panamá e especializada na gestão de capitais e de património, respeitantes a quase quatro décadas de actividade desta sociedade. É o maior caso de fuga de dados, maior do que os telegramas diplomáticos dos Estados Unidos lançados pelo WikiLeaks em 2010 e também do que os documentos de serviços secretos facultados em 2013 por Edward Snowden.

Quem está a divulgar a informação?
Os documentos que envolvem mais de 214 mil empresas "offshore" em mais de 200 países e territórios foram obtidos pelo jornal alemão Sueddeutsche Zeitung, que os partilhou com o consórcio internacional de jornalistas. Deu assim origem a uma investigação que envolveu mais de 370 jornalistas de 76 países, incluindo os órgãos de comunicação social portugueses, Expresso e TVI.

Quantos nomes estão envolvidos?
Os dados já revelados apontam para o envolvimento de 140 políticos e autoridades públicas em esquemas montados em paraísos fiscais, mas a lista completa das empresas e nomes envolvidos só deverá ser divulgada em Maio. Os nomes incluem ainda 12 antigos e actuais líderes mundiais, entre eles Sigmundur Davíð Gunnlaugsson, primeiro-ministro da Islândia, o primeiro-ministro do Paquistão, o Presidente da Ucrânia e o Rei da Arábia Saudita. E há pelo menos 33 pessoas ou entidades que constam da "lista negra" dos Estados Unidos, devido ao seu envolvimento em negócios com os barões da droga mexicanos, organizações terroristas como o Hezbollah ou países como a Coreia do Norte e o Irão.

E não há nenhum português abrangido?
Idalécio de Castro Rodrigues de Oliveira é o único português envolvido até este momento. É CEO do Lusitania Group, constituído por 14 companhias sedeadas nas Ilhas Virgens Britânicas e criadas entre 2003 e 2011. Apesar de pouco conhecido em Portugal, está a ser investigado no âmbito da operação Lavo Jato por ter transferido 10 milhões de dólares para uma conta suíça de um lobista do partido PMBD, que terá depois transferido 1,5 milhões de dólares para o presidente da Câmara dos Deputados do Brasil, Eduardo Cunha. O Expresso, que integra o consórcio de jornalistas, já revelou que há mais portugueses na lista.

O que faz e quem gere a Mossack Fonseca?
É um escritório de advogados com sede no Panamá e operações em 42 países, cujos serviços incluem a administração de património e a incorporação de empresas em jurisdições "offshore", como as Ilhas Virgens Britânicas. É o quarto maior fornecedor mundial de serviços offshore, conta com 600 colaboradores e trabalha actualmente para mais de 300 mil empresas. A Mossack Fonseca resultou em 1986 da fusão dos pequenos negócios do alemão Jürgen Mossack, filho de um operacional nazi, e de Ramón Fonseca Mora, que até Março foi ministro conselheiro do Presidente da República, Juan Carlos Varela. E que já salvaguardou que não pode ser responsabilizada pelas actividades dos seus clientes.

 

 

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