Notícia
Luís Portela: escalou a mais alta montanha farmacêutica
Luís Portela ousou investir numa estratégia de longo prazo para integrar a Bial num grupo de elite à escala mundial: os criadores de medicamentos. A maior farmacêutica portuguesa, que investe cerca de 20% das suas receitas em I&D, já tem dois no mercado global e um terceiro na calha.
Natal de 2009: na redacção discutia-se nomes para a eleição da Personalidade do Ano. Num tempo tão negativo, com um país de cabeça perdida, quem é que se tinha distinguido por ter andado ao contrário da crise? Quem é que podia servir de farol para Portugal encontrar um novo rumo? Resposta: Luís Portela, presidente da Bial, uma empresa onde não se navega à vista, que cumpre uma estratégia que demora décadas a dar resultados.
Luís tem um fascínio avassalador pelo Tibete, tendo até já pensado em mudar-se para um mosteiro. Entretanto, decidiu escalar a mais alta montanha farmacêutica. Após um investimento de 300 milhões de euros, num processo em que concentrou no seu "quartel-general" na Trofa uma centena de investigadores de todo o mundo, tinha finalmente conseguido criar o primeiro medicamento de raiz e patente portuguesa.
Foi preciso ter paciência de monge tibetano, visão estratégica do tamanho da China e espírito empreendedor para esperar 15 por resultados. Em 1994, a equipa de I&D da Bial concluiu que uma das 11 mil moléculas que tinha sintetizado funcionava. Nome de código: bia 2-093.
A patente do antiepiléptico foi registada em 1996. Seguiram-se os testes em animais e, posteriormente, os ensaios clínicos finais em mais de mil epilépticos de 23 países. O composto passou no teste com distinção. Baptizado como Zebinix, começou por chegar às farmácias da Alemanha, Reino Unido, Dinamarca, Áustria, Noruega e Suécia, em Outubro de 2009, e entrou nas farmácias portuguesas a 1 de Abril do ano seguinte.
Um percurso notável, reconhecido pelos seus pares: ainda hoje fazem procissões à Trofa para perceber como se faz tanto com tão pouco. É que a Bial gastou pouco mais de um terço do preço médio de criação de um medicamento. E a procissão promete continuar. Porque a Bial lançou no mercado mundial, há dois anos, o seu segundo medicamento - o Ongentys, para a doença de Parkinson, em que investiu outros 300 milhões de euros. E o terceiro, destinado à hipertensão pulmonar arterial, deverá estar cá fora dentro de quatro anos. Como é que a Bial chegou até aqui? Quem é Luís Portela?
Nascido em 28 de Julho de 1951 em Águas Santas, no Porto, Luís Portela teve "uma infância tristonha" e começou a trabalhar muito cedo - com apenas 17 anos, para justificar a mesada paterna. Era "um jovem que queria sobretudo ser útil ao outro, e que pensou em formas diferentes de ser útil ao outro. Pensou ser frade, monge tibetano e médico", contou o próprio, no Verão de há nove anos, ao Negócios. Escolheu Medicina.
Aos 21 anos, quando estava a meio do curso, o pai, António Emílio Portela, faleceu. Luís foi médico durante três anos no Hospital de São João, e deu aulas de Psicofisiologia, na Faculdade de Medicina do Porto, durante seis anos. Até que, em 1978, como o seu irmão mais velho, que então geria a Bial, não lhe comprava a participação, acabou por adquirir as acções dos outros accionistas.
O médico decidiu então abandonar o doutoramento em Londres e recuperar a empresa fundada, nos anos 20 do século passado, pelo seu avô, Álvaro Portela, conjuntamente com o sócio, o senhor Almeida. Daí o nome Bial, porquanto a empresa foi criada pelo dois "al" - Almeida e Álvaro.
À frente da Bial, Luís pensou para a empresa uma estratégia assente na inovação. Ao contrário das concorrentes, que apresentavam cópias, procurou "licenciar novas tecnologias, novos medicamentos com empresas multinacionais para trazer para Portugal". E em 1992 a Bial arrancou as suas actividades em I&D, onde anualmente investe cerca de 20% das suas receitas.
Luís Portela transformou os pequenos Laboratórios Bial na maior farmacêutica portuguesa, que fechou 2017 com uma facturação de 270 milhões de euros, 70% dos quais gerados em mais de 50 mercados externos, e com o seu "porta-aviões", o Zebinix, a representar 80 milhões de euros. Com mais de 900 trabalhadores, pretende agora duplicar para 200 a sua equipa de cientistas, de oito nacionalidades.
Neste percurso de excelência, há que referir um evento que colocou em risco o capital mais crítico de uma farmacêutica: a reputação. Em 2015, em França, registou-se a morte de um homem que participou no ensaio clínico de uma empresa francesa para a Bial, que viria a abandonar a investigação da molécula em causa para fins comerciais. Um abandono que representou a perda de "dezenas de milhões de euros", viria a admitir António Portela, filho de Luís e antigo campeão nacional de natação, que substituiu o pai no cargo de CEO em 2011.
Luís Portela, "chairman" da Bial desde que passou a liderança executiva a António, que tinha então 36 anos, tem uma paixão enorme pela escrita, pela leitura e pela conhecimento. Ao longo da sua vida publicou vários livros sobre o sentido da vida e a espiritualidade, como "Para Além da Evolução Tecnológica", "À Janela da Vida" ou "O Prazer de Ser". Entretanto, depois de "Ser Espiritual - Da Evidência à Ciência", publicado em 2013 e já com 24 edições, Luís lançou, na semana passada, um novo livro. Chama-se "Da Ciência ao Amor - Pelo Esclarecimento Espiritual", em que aprofunda um dos principais interesses que tem atravessado toda a sua obra já publicada - a compreensão da dimensão integral do homem, tanto sob os aspectos físicos como do ponto de vista espiritual.
Luís Portela, o homem-exemplo, é um pacifista. "Sou incapaz de fazer mal a uma mosca. Se ela me incomodar apanho-a com a mão (20 anos de karaté permitem-me a concentração para apanhar a mosca à mão), abro a janela e ponho-a lá fora. Eu não mato uma mosca, como não mato uma centopeia. Sou um pacifista que alarga o pacifismo ao universo", afirmou ao Negócios no Verão de 2009. De entre as obras que mais o marcaram está "O Livro do Caminho Perfeito", de Lao Tsé.
Luís tem um fascínio avassalador pelo Tibete, tendo até já pensado em mudar-se para um mosteiro. Entretanto, decidiu escalar a mais alta montanha farmacêutica. Após um investimento de 300 milhões de euros, num processo em que concentrou no seu "quartel-general" na Trofa uma centena de investigadores de todo o mundo, tinha finalmente conseguido criar o primeiro medicamento de raiz e patente portuguesa.
Se fomos capazes de desenvolver a educação, a ciência, a saúde, porque é que não havemos de ser capazes de desenvolver também a economia? Luís Portela
A patente do antiepiléptico foi registada em 1996. Seguiram-se os testes em animais e, posteriormente, os ensaios clínicos finais em mais de mil epilépticos de 23 países. O composto passou no teste com distinção. Baptizado como Zebinix, começou por chegar às farmácias da Alemanha, Reino Unido, Dinamarca, Áustria, Noruega e Suécia, em Outubro de 2009, e entrou nas farmácias portuguesas a 1 de Abril do ano seguinte.
Um percurso notável, reconhecido pelos seus pares: ainda hoje fazem procissões à Trofa para perceber como se faz tanto com tão pouco. É que a Bial gastou pouco mais de um terço do preço médio de criação de um medicamento. E a procissão promete continuar. Porque a Bial lançou no mercado mundial, há dois anos, o seu segundo medicamento - o Ongentys, para a doença de Parkinson, em que investiu outros 300 milhões de euros. E o terceiro, destinado à hipertensão pulmonar arterial, deverá estar cá fora dentro de quatro anos. Como é que a Bial chegou até aqui? Quem é Luís Portela?
Nascido em 28 de Julho de 1951 em Águas Santas, no Porto, Luís Portela teve "uma infância tristonha" e começou a trabalhar muito cedo - com apenas 17 anos, para justificar a mesada paterna. Era "um jovem que queria sobretudo ser útil ao outro, e que pensou em formas diferentes de ser útil ao outro. Pensou ser frade, monge tibetano e médico", contou o próprio, no Verão de há nove anos, ao Negócios. Escolheu Medicina.
Aos 21 anos, quando estava a meio do curso, o pai, António Emílio Portela, faleceu. Luís foi médico durante três anos no Hospital de São João, e deu aulas de Psicofisiologia, na Faculdade de Medicina do Porto, durante seis anos. Até que, em 1978, como o seu irmão mais velho, que então geria a Bial, não lhe comprava a participação, acabou por adquirir as acções dos outros accionistas.
2009
1.º medicamento
A Bial lançou em 2009 o Zebinix, o primeiro medicamento de raiz e patente portuguesas.
20%
Investimento em I&D
A Bial é a empresa industrial que mais investe em I&D no país - 20% das suas receitas.
O médico decidiu então abandonar o doutoramento em Londres e recuperar a empresa fundada, nos anos 20 do século passado, pelo seu avô, Álvaro Portela, conjuntamente com o sócio, o senhor Almeida. Daí o nome Bial, porquanto a empresa foi criada pelo dois "al" - Almeida e Álvaro.
À frente da Bial, Luís pensou para a empresa uma estratégia assente na inovação. Ao contrário das concorrentes, que apresentavam cópias, procurou "licenciar novas tecnologias, novos medicamentos com empresas multinacionais para trazer para Portugal". E em 1992 a Bial arrancou as suas actividades em I&D, onde anualmente investe cerca de 20% das suas receitas.
Luís Portela transformou os pequenos Laboratórios Bial na maior farmacêutica portuguesa, que fechou 2017 com uma facturação de 270 milhões de euros, 70% dos quais gerados em mais de 50 mercados externos, e com o seu "porta-aviões", o Zebinix, a representar 80 milhões de euros. Com mais de 900 trabalhadores, pretende agora duplicar para 200 a sua equipa de cientistas, de oito nacionalidades.
Neste percurso de excelência, há que referir um evento que colocou em risco o capital mais crítico de uma farmacêutica: a reputação. Em 2015, em França, registou-se a morte de um homem que participou no ensaio clínico de uma empresa francesa para a Bial, que viria a abandonar a investigação da molécula em causa para fins comerciais. Um abandono que representou a perda de "dezenas de milhões de euros", viria a admitir António Portela, filho de Luís e antigo campeão nacional de natação, que substituiu o pai no cargo de CEO em 2011.
Luís Portela, "chairman" da Bial desde que passou a liderança executiva a António, que tinha então 36 anos, tem uma paixão enorme pela escrita, pela leitura e pela conhecimento. Ao longo da sua vida publicou vários livros sobre o sentido da vida e a espiritualidade, como "Para Além da Evolução Tecnológica", "À Janela da Vida" ou "O Prazer de Ser". Entretanto, depois de "Ser Espiritual - Da Evidência à Ciência", publicado em 2013 e já com 24 edições, Luís lançou, na semana passada, um novo livro. Chama-se "Da Ciência ao Amor - Pelo Esclarecimento Espiritual", em que aprofunda um dos principais interesses que tem atravessado toda a sua obra já publicada - a compreensão da dimensão integral do homem, tanto sob os aspectos físicos como do ponto de vista espiritual.
Luís Portela, o homem-exemplo, é um pacifista. "Sou incapaz de fazer mal a uma mosca. Se ela me incomodar apanho-a com a mão (20 anos de karaté permitem-me a concentração para apanhar a mosca à mão), abro a janela e ponho-a lá fora. Eu não mato uma mosca, como não mato uma centopeia. Sou um pacifista que alarga o pacifismo ao universo", afirmou ao Negócios no Verão de 2009. De entre as obras que mais o marcaram está "O Livro do Caminho Perfeito", de Lao Tsé.
CV
Luís Portela nasceu em 1951 no Porto, onde se licenciou em Medicina. Exerceu actividade clínica durante três anos e durante seis deu aulas de Psicofisiologia. Assumiu a presidência da Bial aos 27 anos. Lançou um novo livro - "Da Ciência ao Amor - Pelo Esclarecimento Espiritual".