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Provedor de Justiça: Veto das Finanças nos acordos das autarquias “viola o princípio da autonomia local”

É “inaceitável” que as Finanças possam travar os acordos celebrados entre os sindicatos e as autarquias para reduzir o horário para 35 horas, considera o Provedor de Justiça, que enviou a norma para o Constitucional.

Bruno Simão/Negócios
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As normas da Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas que dão ao Ministério das Finanças intervenção na celebração e na assinatura dos acordos colectivos das autarquias – que reduzem o horário de trabalho para 35 horas – são inconstitucionais porque "violam o princípio da autonomia local", considera o Provedor de Justiça.

 

A legislação dá às Finanças poder de veto sobre os acordos assinados entre as autarquias e as associações sindicais, permitindo que o Governo bloqueie os acordos, tal como tem acontecido.

 

"Tal realidade equivale, da parte do detentor do poder executivo, a uma inaceitável expropriação das autarquias locais do seu poder de ‘autoadministração’ em matéria que respeita aos seus quadros de pessoal (artigo 243º da Lei Fundamental), concorrendo nesta valoração o entendimento que a doutrina e a jurisprudência constitucionais têm cimentado em relação ao princípio da autonomia local", sustenta o Provedor, no requerimento que fundamenta o pedido, divulgado na sua página oficial.

 

O horário de trabalho da Função Pública aumentou de 35 horas para 40 horas semanais no final de Setembro do ano passado. O diploma onde a medida foi originalmente consagrada foi apreciado pelo Tribunal Constitucional e viabilizado por um voto. Na altura, os juízes sublinharam que a decisão não poderia impedir que, no futuro, as partes pudessem celebrar acordos que estabelecessem horários inferiores. A avaliar pelas declarações de voto esta foi, aliás, uma das questões mais debatidas entre os juízes.

 

Desde então, as autarquias e o Ministério das Finanças têm travado uma longa batalha jurídica, com autarcas como António Costa (agora secretário-geral do PS) a defender a autonomia do poder local, e o ministério das Finanças a sustentar, com base num parecer do conselho consultivo da Procuradoria-Geral da República, que a lei garante ao Governo essa intervenção.

 

Vários municípios decidiram avançar para a assinatura de acordos com os sindicatos e a aplicar as 35 horas semanais. Mas o Governo travou a publicação destes acordos em Diário da República, que formalmente não estão por isso em vigor. Há por isso muitas dúvidas sobre a legalidade da situação das autarquias que praticam o horário de 35 horas por semana.

 

Cortes salariais podem beneficiar accionistas privados

 

Outra das normas questionadas pelo Provedor de Justiça é a que prevê a aplicação dos cortes salariais a empresas de capital maioritariamente público e, logo, onde possam também existir detentores privados de parte do capital.

 

A norma em causa e a fundamentação apresentada é idêntica à que o Provedor questionou no pedido de fiscalização das normas do orçamento do Estado para 2014.

 

O problema, explica o Provedor, é que a lei não prevê a entrega do montante subtraído aos salários aos cofres do Estado. Aquilo que não é pago em salários pode por isso servir para pagar dividendos a accionistas privados e não para consolidar as contas públicas. Desta forma, a lei torna-se ineficaz face aos motivos que a fundamentam.

 

"Não pode racionalmente compreender-se como adequada uma medida do legislador que, atingindo trabalhadores de empresas cujos capitais são maioritariamente públicos e sem que esteja determinada a entrega nos cofres públicos dos montantes correspondentes às reduções remuneratórias que atingem aqueles trabalhadores, se revela apta, em absoluto contraste com o sue afirmado desiderato, a gerar distribuição, na proporção devida, de dividendos ou outras vantagens patrimoniais pelos parceiros privados na mesma empresa, detentores do capital remanescente", por ler-se no requerimento.

 

O Provedor de Justiça considera, por isso, que a norma em causa viola o "princípio da proporcionalidade ou proibição do excesso", que impõe que a solução desenhada pelo legislador seja adequada para atingir o fim visado pela lei, que seria, neste caso, a "sustentabilidade das finanças públicas". 

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