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João Ferreira do Amaral 02 de Maio de 2007 às 13:59

O PIB e os sectores produtivos

Normalmente, quando apreciamos a evolução conjuntural da actividade económica, dedicamos especial atenção à evolução do Produto Interno Bruto na sua totalidade. Percebe-se porquê. De facto, o PIB é um indicador da evolução da produção no País e mede o val

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Por outro lado, muitas outras variáveis, como por exemplo o investimento ou as receitas do Estado, têm  a ver, directa ou indirectamente, com a evolução do PIB. E, no entanto, dito tudo isto, a verdade é que a análise da evolução do PIB na sua totalidade é muito insuficiente para se apreciar a forma como a produção se comporta. Principalmente porque não nos dá uma ideia de como a evolução conjuntural se relaciona com os caminhos de mais longo prazo, seja em relação ao passado, seja em relação ao futuro. Por isso, é bom, sempre que possível, complementar a análise do PIB total com a apreciação da evolução dos contributos dos diversos sectores de actividade para o PIB.

No caso português, isso não só é possível como também singularmente instrutivo. Se olharmos para a evolução do valor acrescentado bruto a nível sectorial desde 1996 a 2005, e fazendo alguns cálculos com base nos dados do Banco de Portugal, encontrarmos os seguintes valores para as taxas médias de crescimento anual em percentagem:

- Agricultura -1,9
- Indústria 1,8
- Serviços financeiros 9,6
- Outros serviços 2,2

Nota-se, como é evidente, um grande desequilíbrio entre a evolução dos serviços financeiros e dos outros sectores de actividade (para 2006, entretanto, o desequilíbrio terá sido reduzido devido a uma desaceleração da actividade de seguros e pensões). A disparidade verificada nos ritmos de crescimento sectorial causa alguma preocupação sobre a tendência que a economia portuguesa tem vindo a adoptar desde os anos 90. A hipertrofia relativa dos serviços financeiros, a continuar, pode a prazo ser pouco saudável para a economia.

Note-se que considero os serviços financeiros como uma actividade essencial ao crescimento económico. Uma economia que se pretenda moderna necessita de um sólido e eficiente sector financeiro. Mais: é mesmo natural (isso sucede um pouco por todo o mundo) que os serviços financeiros tendam a ganhar peso no PIB, ou seja, que tenham um crescimento superior à totalidade do PIB. O que já não é natural é que a diferença de ritmos de crescimento seja tão pronunciada como a que se tem verificado no nosso país. A explicação para isso tem a ver em grande parte com a verdadeira explosão do crédito às famílias (seja para a habitação, seja para consumo) e com o aumento da actividade de seguros e pensões que se verificaram há uns dez anos a esta parte, já que o efeito do crescimento da circulação mundial de capitais, sendo também muito importante, se verifica para todos os países e não diferenciaria portanto a nossa economia das outras.

Uma grande parte da actividade do sector financeiro é não transaccionável, uma vez que, apesar de todas as inovações tecnológicas e financeiras e apesar da liberalização da actividade a nível mundial, continua a ser preponderante a actividade relacionada com o mercado interno. Isto significa que a evolução da economia portuguesa tem como principal motor um sector que é, em grande parte, não transaccionável.

E se é certo que outro sector de grande dinamismo até há uns anos e quase totalmente não transaccionável – a construção – deixou de ser um sector em crescimento, sofrendo um ajustamento para baixo (o que era inevitável), a verdade é que assentar o crescimento em sectores não transaccionáveis continua a ser um padrão de crescimento sem futuro. Felizmente os indicadores mais recentes da economia apontam para uma maior animação da produção de sectores de bens transaccionáveis, o que significa que começam a ter efeitos algumas das medidas de incentivo a esses sectores que têm sido tomadas.

Esperemos que este efeito se mantenha, aumente, e que as medidas não esmoreçam para que a economia portuguesa possa reentrar num caminho mais equilibrado de crescimento sectorial.

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