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10 de Outubro de 2007 às 13:59

Topete

A Comissão Europeia vai apresentar à próxima reunião dos Chefes de Estado e de Governo, para a semana que vem, um documento sobre linhas estratégicas de actuação para a Europa. Claro que o interesse próprio deste tipo de documentos é muito limitado.

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Constituem principalmente uma operação de propaganda em que a Comissão é exímia e destinam-se a contentar o círculo de burocratas e congéneres que gravita à volta das instituições comunitárias.

Mas no documento em causa existe um outro interesse que provavelmente não estaria nas intenções da Comissão despertar. É o que deriva da hipocrisia, talvez mesmo do cinismo com que é apresentada no documento a globalização.

De facto, o mote do documento é claro na definição: “O interesse europeu: ter sucesso na idade da globalização.” E do mote resultam frases como estas: “é preciso mostrar aos cidadãos como a União Europeia é a melhor ferramenta para moldar a globalização”.

O que há de espantoso nesta frase é o cinismo com que ela é dita. Se os cidadãos dos estados europeus sofrem hoje com grande intensidade os efeitos da globalização é porque as instituições comunitárias tudo têm feito para desarmar os estados na resposta aos choques da globalização.

Na realidade, em particular os estados da Zona Euro, são dos mais desprotegidos em relação à globalização e isto devido ao caminho que o processo de integração tomou desde o tratado de Maastricht. Em três grandes domínios se nota esta acção prejudicial das instituições comunitárias.

Em primeiro lugar, a tentativa (só parcialmente lograda) de destruição da coesão nacional de cada estado (em que o acabar com as moedas nacionais foi um passo importante). Os grandes inimigos para a Comissão Europeia, na sua acção do dia a dia, são os Estados, o que se percebe porque são eles que podem moderar a sua apetência pelo poder, comum a todas as burocracias, como a Comissão, que são deficientemente controladas pelos cidadãos. Por isso a Comissão tenta surgir sempre como a instituição que corrige as falhas dos estados, que defende os cidadãos face à perversidade das instituições dos respectivos estados, que, dotada de uma bondade e de uma competência infinitas só pensa no bem comum, etc. Claro que isto não convence quem esteja minimamente informado, mas surte efeito nos mais ingénuos. Ora a resposta à globalização, para ser eficaz, passa sempre por uma forte coesão nacional. Tudo o que a prejudica como a acção da Comissão expõe mais os países aos efeitos negativos da globalização.

Um segundo aspecto é a destruição da política macroeconómica de resposta aos choques da globalização, Ao criar a moeda única e instituições deficientes para a gerir e ao impedir políticas orçamentais activas, a integração tornou, desde Maastricht, as economias muito mais vulneráveis perante a globalização, como é visível hoje em Portugal. Não tenho qualquer dúvida em afirmar que devido à moeda única Portugal está hoje mais desprotegido em relação à globalização do que grande parte das economias do mundo, mesmo de países de dimensão e nível de desenvolvimento inferior.

Finalmente, o terceiro domínio é o da política de concorrência, que põe um colete de forças tal às políticas de desenvolvimento dos sectores produtivos que só por milagre eles se podem ir adaptando às condições impostas pela globalização.

Por isso, é preciso ter topete para apresentar a integração europeia pós-Maastricht como uma resposta à globalização, quando foi justamente essa integração que permitiu acabar com as defesas que os estados naturalmente tinham para fazer face aos efeitos dessa mesma globalização.

Mas topete para isto e para muito mais a Comissão tem-no.

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