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16 de Janeiro de 2008 às 13:59

Globalização e referendo

Gorou-se uma oportunidade única de os Portugueses se pronunciarem sobre a forma como está a decorrer o processo de integração europeia. Para muitos, como eu, que, sem serem militantes, apoiaram o PS no movimento das Novas Fronteiras e que consideram essen

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Tanto mais que são pouco convincentes os argumentos usados para justificar a não realização do referendo. Pelo contrário, são válidos e substanciais os argumentos que aconselhariam a realização do referendo. E não falo apenas do argumento das transferências de soberania, aliás inteiramente pertinente. A representação concedida pelos eleitores a favor dos deputados dá a estes o direito de exercerem o poder em nome desses mesmos eleitores, mas não lhes dá o direito de transferirem esse exercício de poder para quem muito bem lhes apeteça. Este argumento, por si só, justificaria o referendo, uma vez que existem de facto importantes transferências de soberania no Tratado. Mas não é nesse argumento que me vou centrar. Existe um outro que pouca gente tem assinalado.

É que a União, com este tratado, muda de finalidade última. A prioridade deixa de ser a realização da paz na Europa para ser a regulação da globalização segundo os chamados valores europeus. Devo dizer que concordo com esta mudança de enfoque. E sempre tenho dito que, justamente, o que a União Europeia deveria fazer é preocupar-se com os problemas que resultam da vida de relação entre os estados europeus entre si e com o resto do mundo e não intrometer-se diariamente na vida de cada estado. Mas concordando com esta finalidade põe-se agora a questão: será o novo tratado adequado ao prosseguimento desta finalidade? A resposta, infelizmente, é não, é totalmente inadequado. Porque há duas formas de tentar regular a globalização. Uma, que é a que o tratado prossegue, é a de tentar formar uma superpotência europeia centralizando enormemente as decisões em todos os domínios da vida política, em particular naqueles que mais se relacionam com a vida económica. É essa a (má) tradição europeia e, como disse, é essa que o tratado prossegue. Está completamente ultrapassada. A segunda alternativa seria a de construir gradualmente uma nova União adequada à nova finalidade, que deixasse ampla margem de manobra aos estados para escolherem o seu próprio caminho de adaptação à globalização, fornecendo-lhes os instrumentos para que o fazerem e coordenando apenas as acções comuns essenciais. A melhor base para a Europa influir no mundo é ser formada por estados dotados de autonomia e de capacidade de definirem os seus respectivos caminhos, cooperando num pequeno número de questões essenciais. Não é formar uma superpotência à moda antiga como o tratado pretende, tentando decidir quase tudo a nível central. O que não só não terá viabilidade, como se a tivesse seria um desastre para a civilização europeia. Três exemplos no domínio económico, que já vêm de trás, são outros tantos exemplos de políticas inadequadas à adaptação à globalização: a moeda única e as suas instituições, a política de concorrência e a política agrícola comum. Todas elas ilustram à saciedade as disfunções do centralismo, principalmente neste admirável novo mundo globalizado.

A realização de um referendo sobre o tratado permitiria ajuizar duplamente se os Portugueses estão de acordo com esta mudança de finalidade da União e se consideram que o tratado é o instrumento adequado aos novos tempos.

Nem em Portugal nem em outros 25 países, por medo da decisão dos eleitores, haverá referendo sobre um tratado que à partida se revela inadequado. Não lhe auguro longa vida.

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