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Crude pisa linha vermelha dos grandes produtores

Nem o furacão Francine, que levou ao fecho de atividade de petrolíferas nos Estados Unidos, conseguiu sustentar os preços. A fasquia dos 70 dólares por barril da OPEP+ foi quebrada e o corte da oferta deverá manter-se mais tempo. Há 33 meses que o Brent não valia tão pouco.

O crescimento da procura mundial de petróleo deverá desacelerar. Ainda assim, há quem conside robusto o atual nível de consumo.
O crescimento da procura mundial de petróleo deverá desacelerar. Ainda assim, há quem conside robusto o atual nível de consumo. Ints Kalnins/Reuters
11 de Setembro de 2024 às 09:00
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A Organização dos Países Exportadores de Petróleo e os seus aliados – o chamado grupo OPEP+, composto por 22 membros – não tem tido mãos a medir. Nos últimos anos, desde o arranque de 2017, o cartel e os seus parceiros, liderados pela Rússia, têm alinhado a oferta de crude no mercado com a necessidade de fazer subir ou descer os preços do “ouro negro”. Desde 2020, com os confinamentos decorrentes da pandemia, que o grupo tem retirado matéria-prima do mercado numa dimensão mais significativa – e em 2022, com a invasão da Ucrânia pela Rússia, tem vigorado um segundo acordo de corte da oferta, levado a cabo por oito países que decidiram, voluntariamente, reforçar este esforço. No entanto, tudo parece estar a falhar, num contexto de perspetiva de menor procura, e nesta terça-feira os preços quebraram um patamar muito importante para os grandes produtores.

O West Texas Intermediate (WTI), “benchmark” para os Estados Unidos, seguia na terça-feira, ao final do dia, a ceder 3,76% para 66,21 dólares por barril. Já o Brent do mar do Norte, crude negociado em Londres e referência para as importações europeias, desvalorizava 3,16% para 69,64 dólares. Foi a primeira vez desde dezembro de 2021 que o Brent negociou abaixo dos 70 dólares por barril, um valor que é considerado – se bem que isso não seja dito de forma declarada – como o mínimo razoável pelo cartel e seus aliados.

Mas o que levou a este novo mergulho das cotações nos mercados internacionais? Recuando um pouco, na semana passada a OPEP+ adiou por dois meses a entrada faseada de crude adicional no mercado – eram mais 180 mil barris por dia, que iriam começar a chegar aos consumidores já a partir de outubro (com esse volume a aumentar gradualmente até setembro de 2025). Contudo, a decisão foi protelada, pelo menos para já, para 1 de dezembro. Nessa altura, os preços reagiram com subidas tímidas, precisamente por se tratar de uma solução temporária para travar a sangria dos preços.

Para se perceber melhor todo o contexto, há que lembrar que a OPEP+ tem atualmente em vigor dois acordos de retirada de crude do mercado, que ascendem no total a 5,86 milhões de barris diários – e que correspondem a 5,7% da procura mundial. Esta abertura de torneiras a partir do próximo mês incidia sobre o acordo voluntário de redução de 2,2 milhões de barris por dia da oferta por parte de oito membros da OPEP+: Arábia Saudita, Rússia, Iraque, Emirados Árabes Unidos, Koweit, Cazaquistão, Argélia e Omã. O outro acordo, que abarca todos os membros e não é de base voluntária, é de 3,86 milhões barris por dia e irá manter-se em vigor pelo menos até ao final de 2025.

Os preços não se aguentaram durante muito tempo em alta pelo facto de a OPEP+ apenas ter adiado por dois meses a abertura de torneiras. E, por isso mesmo, poder-se-á ter apenas atirado para o final do ano o potencial problema do excesso de oferta. Este cenário já estava a ser colocado por se estimar uma menor procura por parte da China, que é o maior consumidor mundial, mas nesta terça-feira agravou-se com a publicação, pela OPEP, do seu mais recente relatório do mercado petrolífero – onde revê em baixa o crescimento da procura mundial de crude em 2024 e 2025.

A China continua a revelar uma debilidade económica e nos EUA surgiram sinais semelhantes, além de que a Líbia mostrou-se pronta a retomar as suas exportações de crude após conflitos internos que retiraram a sua matéria-prima do mercado.

Este novo desaire para os grandes produtores provocou um forte deslize dos preços, que nem a tempestade tropical Francine – que assola o estado norte-americano do Louisiana e que estava a intensificar-se, a caminho de se tornar um furão – ajudou a inverter, apesar de ter levado os produtores de petróleo e gás a encerrarem toda a sua produção no Golfo do México.

Analistas já reveem em baixa as estimativas para os preços

Perante esta derrocada, algumas casas de investimento começaram já a cortar as estimativas para o preço do Brent no último trimestre ano. É o caso do Morgan Stanley, que reviu a sua projeção de 80 para 75 dólares por barril, e do Goldman Sachs – que também cortou a sua previsão em cinco dólares, apontando agora para um intervalo entre 70 a 85 dólares por barril. Já o Citi considera que o Brent pode mesmo cair para os 60 dólares por barril no próximo ano se a OPEP+ não conseguir implementar mais cortes de produção – observação que deita por terra a entrada faseada de mais crude no mercado a partir de dezembro deste ano.

O UBS, em contrapartida, mantém o otimismo. “Do ponto de vista dos fundamentais, se atendermos à queda dos stocks globais desde maio, podemos dizer que o mercado continua com défice de oferta, apesar da fraca procura chinesa. E, por isso, consideramos que os participantes de mercado estão a ser demasiado pessimistas. Continuamos a achar que o Brent poderá recuperar, negociando acima dos 80 dólares nos próximos meses”, sublinha Giovanni Staunovo, analista de matérias-primas do banco suíço, numa nota de análise a que o Negócios teve acesso.

Atualmente, a depreciação do petróleo leva o mercado a apresentar uma estrutura de “backwardation” (quando os preços dos contratos a mais curto prazo são superiores aos dos contratos de futuros com datas mais distantes), o que deixa antever que, neste preciso momento, a procura está mais forte do que a oferta – cenário que vai ao encontro do otimismo do estratega do UBS.

 

Podemos dizer que o mercado continua com défice de oferta, apesar da fraca procura chinesa. Giovanni Staunovo
Analista de “commodities” do UBS

 

 

Achamos que os participantes de mercado estão a ser demasiado pessimistas. Giovanni Staunovo
Analista de “commodities” do UBS

 

 

O Brent pode cair para 60 dólares por barril no próximo ano se a OPEP+ não conseguir implementar mais cortes de produção. Nota de “research” do CITI

 

 

70
Brent
Desde dezembro de 2021 que o Brent não negociava abaixo dos 70 dólares, valor que a OPEP+ tenta sempre que não seja quebrado.

 

 

5,86
Barris
O atual corte da oferta da OPEP+ ascende a 5,86 milhões de barris por dia. Cartel e aliados queriam começar a abrir as torneiras.

 

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