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Qatar: da presença "discreta" em Portugal ao cerco diplomático no Médio Oriente
O corte de relações diplomáticas de vários vizinhos do Qatar, por alegado apoio ao terrorismo, acontece a um mês da visita do emir do Qatar a Portugal. Há menos de um mês, António Costa levava àquele país um Portugal de "mente aberta" ao investimento.
O Qatar, que esta segunda-feira, 5 de Junho, está no centro de uma polémica diplomática regional por alegados apoios ao terrorismo, era há cerca de um mês notícia por razões mais positivas, relacionadas com o potencial de relacionamento económico com Portugal.
Na altura, a 8 de Maio, aproveitando a visita do primeiro-ministro, António Costa, aquele país, a Lusa elencava o interesse económico "discreto" do emirado em Portugal, que passava por presenças no capital de grandes empresas ou investimentos de monta no país.
Desde logo, o Qatar Investment Authority – o fundo soberano do Qatar - tem uma posição de 2,27% na EDP, comprada em Agosto de 2011, na altura um investimento avaliado em 159,4 milhões de euros. As relações com Portugal intensificaram-se a partir desse ano. Em Dezembro, Paulo Portas – então ministro dos Negócios Estrangeiros - esteve no país e, no ano seguinte, dirigentes do fundo soberano vieram a Portugal para reuniões com investidores da banca e da área turística.
O sector hoteleiro, em particular, é um dos que contará também com dinheiro de investidores oriundos daquele Estado. A marca W, da Marriott, vai chegar ao Algarve com a sua terceira unidade na Europa, um hotel a inaugurar em Albufeira em 2018 e que é desenvolvido em parceria com o grupo Nozul Hotels, a subsidiária do Jaidah Group, sedida no Qatar.
Na Vinci, a empresa francesa que gere os aeroportos portugueses através da ANA-Aeroportos, a Qatari Holding LLC – por sua vez nas mãos da Qatar Investment Authority - detém uma participação de 4%. Ainda na área dos transportes aéreos, Lisboa é apontada como um dos novos destinos para a companhia aérea de bandeira do Qatar, a Qatar Airways, com início de voos previsto para 2018, a partir da capital Doha. Sete anos depois de ter manifestado essa intenção, na altura em que também se falou do interesse na compra de 40% TAP, nunca efectivado.
Portugal "de mente aberta"
António Costa, que na sua deslocação ao país foi recebido pelo emir do Qatar, acrescentava na altura que Portugal estava de "mente aberta" e esperava por sugestões das autoridades e agentes económicos sobre outras áreas de possível cooperação.
Uma das áreas em que Costa apontou a possibilidade de trabalho conjunto foi a da dívida pública, admitindo que poderia passar pelo Qatar a diversificação dos credores para obter melhores condições de mercado. "Estamos aqui [no Qatar] a trabalhar com investidores do mundo árabe nessa perspectiva", afirmou na altura, citado pela Lusa.
Esta questão, a da dívida, tinha marcado também a visita de um outro primeiro-ministro socialista ao país em Janeiro de 2011. Mas José Sócrates, numa altura em que Portugal enfrentava a pressão dos mercados- com os juros a superar 7% -, negou categoricamente que estivesse no Qatar a vender obrigações portuguesas, contrapondo com a vontade de atrair investimento.
Marcelo recebe homólogo em Julho
Já o Presidente da República, em Maio passado, considerou positiva a diversificação de credores e aventou a hipótese de haver já árabes a comprarem dívida pública portuguesa. É o mesmo Marcelo Rebelo de Sousa que deverá dentro de um mês - 4 e 5 de Julho - receber o emir Sheikh Tamim bin Hamad al-Thani (na foto, com Costa) na programada visita de Estado a Portugal.
Esta segunda-feira, recordando essa deslocação, o Gulf Times refere que há pelo menos seis memorandos de entendimento em preparação para serem assinados aquando da deslocação, em áreas como a saúde onde há empresas do Qatar interessadas em investir, e que há várias companhias à espera dessa assinatura.
Entre as empresas e insígnias portuguesas que nos últimos anos desenvolveram ou ainda têm actividade no país estão o grupo Painhas, a MSF Engenharia, o grupo Casais, além das marcas de vestuário Zippy ou Giovanni Galli.
O Negócios contactou o Ministério dos Negócios Estrangeiros, o gabinete do primeiro-ministro e a Presidência da República para avaliar qual a relação de Portugal com o Qatar depois da tensão diplomática na região – nomeadamente quais as possíveis consequências para a visita de Estado do emir a Portugal em Julho – mas até ao momento não foi possível obter resposta.
"Apoio ao terrorismo" leva a cerco diplomático do Qatar
Pelo menos cinco países – Arábia Saudita, Bahrain, Egipto, Emirados Árabes Unidos e Iémen – anunciaram esta segunda-feira o corte de relações diplomáticas com o Qatar por alegado apoio a organizações terroristas como o ISIS ou a al-Qaeda.
O corte de relações incluiu o fecho de portos e de fronteiras com a Arábia Saudita e a suspensão indefinida de ligações aéreas, além da interrupção de fluxos financeiros.
O Qatar afirmou "não haver uma justificação legítima" para o corte de relações, enquanto os membros dos Emirados Árabes Unidos deram 14 dias aos cidadãos do Qatar para deixarem o território.
A quebra de laços diplomáticos ocorre semanas depois da visita de Donald Trump à Arábia Saudita, em que o presidente norte-americano pediu aos seus aliados na região para combaterem o extremismo religioso.
(Notícia actualizada às 13:20 com mais informação)