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Puigdemont aceita eleições mas pergunta se Madrid aceitará vitória independentista
O presidente deposto da Generalitat assegura que o governo catalão se mantém em funções e garante não estar em Bruxelas para pedir asilo político mas para tentar obter as "garantias jurídicas" que a União Europeia possa dar.
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Em conferência de imprensa realizada no centro internacional de imprensa, em Bruxelas, Carles Puigdemont começou por garantir que não está na Bélgica para pedir asilo, dado que esta não é "uma questão política" belga, mas para poder agir "em liberdade e segurança". O ex-dirigente catalão diz que parte do antigo executivo da Generalitat vai permanecer na capital belga "por tempo indefinido" e avisa que só regressará à Catalunha quando se verificarem "garantias que neste momento não existem" na Espanha.
De seguida listou quatro decisões saídas de uma reunião realizada na noite de sexta-feira pelo governo catalão. Em primeiro lugar explicou que a ida para a capital belga serve para "mostrar ao mundo o grave défice democrático que hoje existe no Estado espanhol".
No segundo ponto da "ordem de trabalhos" acordada pelo governo independentista destituído, Puigdemont afiançou que a Generalitat permanece em funções pese embora todo o governo catalão ter sido demitido pelo primeiro-ministro Rajoy, notando que o "governo legítimo" da Catalunha continuará a fazer o seu "trabalho". "Uma parte do governo veio para Bruxelas para tornar claro que existe um problema na Catalunha. A outra parte do governo e da aliança Juntos pelo Sim continuará a fazer o seu trabalho" na Catalunha.
"Não abandonámos o governo", continuou criticando a justicialização de uma questão política e assegurando que "vamos enfrentar politicamente a Justiça", um combate que será feito dentro "dos limites que pressupõem a nossa estratégia de não confrontação". Confirma-se a ideia de uma espécie de "governo deposto no exílio".
No terceiro ponto enunciado, o antigo edil de Girona prometeu que o bloco independentista tudo fará para "apoiar as diferentes iniciativas" por forma a que o artigo 155 "não seja colocado em prática". Nesse sentido, declarou "apoio" aos sindicatos e aos titulares de cargos públicos que se mantiveram em funções e pediu-lhes que "evitem a demolição das instituições catalãs".
DIRECTO | Puigdemont dice que no volverá a España hasta tener "garantías" https://t.co/k6XixdFqlD pic.twitter.com/Hp7CFvWwjq
— EL PAÍS Catalunya (@elpaiscatalunya) 31 de outubro de 2017
Por fim, sustentou que as eleições de 21-D "são um repto democrático" do qual "não temos medo". Puigdemont considera que as eleições autonómicas marcadas por Rajoy constituem "um plebiscito para legitimar o [artigo] 155" mas, mesmo assim, "vamos aceitar" os resultados finais desse acto eleitoral independentemente do vencedor. Mas pergunta se Madrid está disposta a fazer o mesmo se for o bloco soberanista a vencer. "Pergunto ao Estado espanhol se vai fazer o mesmo, se vai respeitar os resultados das urnas", prosseguiu pedindo clareza "sem ambiguidades" ao governo espanhol. Na segunda-feira, PDeCat (partido conservador de Puigdemont) e ERC (esquerda nacionalista) anunciaram que vão às eleições.
Puigdemont critica politização e parcialidade da Justiça
O dirigente catalão disse que a ida para Bruxelas se deve também à "politização" e à "parcialidade" demonstrada pela Justiça espanhola, que "quer prender-me por cumprir o meu programa eleitoral". Lembrou que as penas pedidas pela procuradoria-geral espanhola para o conjunto dos visados pelas acções independentistas "poderiam somar 500 anos de prisão".
Puigdemont garante que a intenção da Generalitat passa por privilegiar a "prudência", o "diálogo" e "evitar a violência", "o que nestas condições era impossível", o que o leva a concluir da "beligerância do Estado espanhol" que "pede 30 anos de prisão para cada um de nós".
DIRECTO | Puigdemont: "El Govern acordó que priorizaría la prudencia, la seguridad y la negociación" https://t.co/8KnKOH2Ft6 pic.twitter.com/8HgZJMAHev
— EL PAÍS (@el_pais) 31 de outubro de 2017
Esta segunda-feira, quando ainda se discutia se a fotografia publicada na rede social Instagram por Puigdemont tinha sido ou não tirada no palácio do governo autonómico (Generalitat), surgiam as primeiras notícias a dar conta que o antigo autarca de Girona estava na Bélgica. Mais tarde esta informação não só foi confirmada como se percebeu que cinco ex-conselheiros (ex-ministros) da Generalitat estavam junto a Puigdemont em Bruxelas.
Logo se começou a conjecturar quais os motivos para que estes dirigentes catalães depostos tivessem viajado para a Bélgica, precisamente no dia em que, minutos antes, a procuradoria-geral da Espanha anunciara a apresentação de queixas contra todo o governo da Generalitat e contra os membros da Mesa do parlamento catalão por crimes de rebelião, sedição e desvio de fundos. Entretanto, esta terça-feira o Supremo Tribunal anunciou que vai investigar os seis membros da Mesa do parlamento catalão. Também esta manhã, o Tribunal Constitucional a declaração unilateral de independência (DUI) feita na sexta-feira e que levou Madrid a efectivar o artigo 155.
Apesar de depois de ter sido colocado no terreno o artigo 155 da Constituição espanhola - que implicou a suspensão do autogoverno catalão -, o bloco independentista ter assegurado que a Generalitat seguiria o seu caminho de consolidação da república independente proclamada na sexta-feira, ontem parecia que todos os governantes catalães (assim como os membros do parlamento) haviam acatado as destituições decretadas pelo executivo chefiado por Mariano Rajoy (houve apenas a excepção do ex-ministro do Território e Sustentabilidade, Josep Rull, que se apresentou ao trabalho durante escassos minutos).
A presença de seis ex-membros da Generalitat na Bélgica fez soar vários alarmes. Em causa poderia e poderá estar um potencial conflito diplomático entre Bruxelas e Madrid e entre a Espanha e a própria União Europeia, além de que, perante um eventual pedido de asilo, a posição que venha a ser adoptada pelo governo belga poderá abrir brechas no governo federal liderado pelo francófono Charles Michel.
Puigdemont pode vir a pedir asilo?
De acordo com a Declaração Universal dos Direitos Humanos e a Carta dos Direitos Fundamentais da UE, a requisição de asilo é um direito que assiste a Puigdemont e aos restantes antigos colegas do governo autonómico. Em qualquer Estado-membro da União é possível pedir asilo perante uma circunstância de "perseguição política". No entanto, a história não ajuda as eventuais pretensões de Puigdemont, já que até hoje nunca na UE se verificou uma situação similar em que o direito de asilo tenha sido concedido.
Ainda que, sublinha o jornal La Vanguardia, Paul Bekaert, advogado que confirmou estar a representar Puigdemont e que nas últimas três décadas defendeu vários ex-etarras (ETA) que requereram asilo na Bélgica, conseguiu em duas ocasiões evitar a extradição de antigos membros daquela organização separatista.
Por outro lado, a viagem de Puigdemont para a Bélgica poderá também representar uma tentativa de atrasar o processo de investigação ontem anunciado pela Justiça espanhola. O procurador-geral José Manuel Maza pediu que os os visados pelas queixas fossem "urgentemente" chamados pelos tribunais para que sejam aplicadas as medidas cautelares necessárias. Se tal acontecer e os visados não se apresentarem, Madrid pode pedir às autoridades belgas a extradição das pessoas em causa.
(Notícia actualizada às 13:35)