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Rui Alpalhão 20 de Novembro de 2007 às 13:59

Tecnologia portuguesa

Em 2002, a campanha eleitoral foi invulgarmente marcada pela discussão de medidas de política económica, com destaque para o dito “choque fiscal” que viria a ficar na gaveta do governo presidido pelo vitorioso presidente do Partido Social Democrata, Durão

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A Bolsa de Lisboa, que uns mais que outros esperarão que espelhe a economia nacional, não sentiu o choque fiscal que ficou engavetado, como não sentiu o choque tecnológico tão apregoado. Uma pesquisa no muito bem organizado site da NYSE Euronext (www.euronext.com) gera quatro respostas para empresas cotadas em Lisboa do sector “9000 – Technology”: por ordem alfabética, Compta, Novabase, Pararede e Reditus. Nenhuma delas entrou no mercado neste século: a Compta entrou no mercado em 1988, a Novabase em 2000, a ParaRede em 1999 e a Reditus, a decana, em 1987. Há mais de sete anos que nenhuma empresa tecnológica entra na Bolsa de Lisboa, na qual, aliás, se excluirmos operações de privatização e de cotação de sociedades anónimas desportivas, entraram nos últimos três anos apenas duas empresas: a Media Capital e a Martifer.

Esta aparente aversão das empresas tecnológicas pela Bolsa de Lisboa não é causada nem pela falta de necessidade de capitais nem tão-pouco pela falta de projectos relevantes que interessem a esses capitais. De facto, a natureza do negócio das empresas tecnológicas, com níveis de risco acima da média e elevadas necessidades de fundos para financiar investigação, sugere e recomenda o financiamento com capitais próprios, pacientes e adaptáveis aos imponderáveis do negócio. Por outro lado, as Universidades portuguesas têm gerado interessantes spin-offs  tecnológicos, que, como manda a teoria financeira, a pequena mas activa comunidade portuguesa de capital de risco tem financiado no início da sua actividade. Exemplos amplamente divulgados são a YDreams de António Câmara, com origem na FCT da Universidade Nova de Lisboa e financiada pela Espírito Santo Tech Ventures e pela americana Herrick Partners, a Chipidea de Epifâneo da Franca, professor do Instituto Superior Técnico, recentemente adquirida pela americana MIPS Technologies e com as capitais de risco de BES, BCP e BPI entre os vendedores, e a Acácia Semicondutores, de Bernardo Gorjão Henriques, vizinha da YDreams no Monte da Caparica e vendida de fresco à irlandesa S3, com a Change Partners e a ISQ Capital entre os accionistas vendedores.

Estes projectos têm demonstrado, com o crescimento que patenteiam, a sua qualidade, e procuram os financiadores que a teoria financeira preconiza. Naturalmente, o seu crescimento implica necessidades adicionais de capitais, que não são necessariamente satisfeitas pelos mesmos investidores. Os fundadores, como é natural, tenderão a reduzir a sua participação, e, eventualmente, a sair completamente do capital, e os investidores nos primeiros estádios de crescimento a ser substituídos por outros. No final deste percurso estará a transacção em mercados públicos de acções, a fonte última de capital, tão inesgotável quanto o capital pode ser. Aliás, a MIPS Technologies, que adquiriu a Chipidea, é uma sociedade aberta, cotada no NASDAQ. Já a S3, compradora da Acácia, é, pelo contrário, (ainda) financiada com private equity.

Estas experiências recentes sugerem pouco espaço para a Bolsa de Lisboa na solução dos problemas de financiamento de prometedoras empresas tecnológicas fundadas em Portugal por investigadores portugueses. As empresas que compõem a lista tecnológica lisboeta entraram no mercado noutros tempos, em ambos os casos em momentos de aquecimento do mercado (os primeiros anos da segunda metade dos anos oitenta e o final do século passado), correctamente atraídas por conjunturas propícias à colocação de acções no mercado português, preciosas para empresas cujo crescimento consome vorazmente capital. As tecnológicas do século XXI têm sido capazes de angariar capital de risco português, quer oriundo dos grandes grupos bancários quer proporcionado por projectos independentes de mérito indiscutível, mas não parecem encontrar nestes veículos o alcance necessário para as conduzir até ao destino final, os mercados públicos de acções. Um pormenor? Talvez não. Onde está o capital está o poder de decisão?

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