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Nuno Ribeiro da Silva 18 de Março de 2005 às 13:59

A energia está (mesmo) a falhar!

Devemos pagar em 2004 uma factura astronómica, superior aos 6 mil milhões de dólares, de importação das matérias-primas energéticas necessárias à vida do país.

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Portugal terminou 2004 importando 13,15 milhões de toneladas de petróleo bruto. Assim, também contribuímos para o aumento recorde da procura mundial ocorrida no último ano?

Em média, cada barril deverá ter custado ao país cerca de 38,3 USD em 2004, ou seja, quase mais 10 USD do que em 2003.

Ora comprámos, em 2004, 96 milhões de barris, o que o mundo produz em 1 dia e 3 horas?

Só em matéria-prima petrolífera, excluindo fretes, seguros e outros custos, pagámos 3,7 mil milhões de dólares.

Os 10 dólares por barril – pagos a mais, de 2003 para 2004 – significaram uma punção de riqueza para o exterior de mais mil milhões de dólares. Ou seja, «voou» uma ponte sobre o Tejo, ou três pontes sobre o Douro, ou quase quatro Alquevas, enfim, sete Estádios da Luz.

Por ano, pagamos para o petróleo bruto, um aeroporto da Ota!

Atenção que o petróleo bruto é 60% do total da energia que o país consome.

Também importámos quase 6 milhões de toneladas de carvão e cerca de 3 milhões de toneladas de gás natural, que atingiram preços «record» em 2004, arrastados pelo efeito «preço director» do petróleo e pela pressão do crescimento da procura.

Sem querer aborrecer mais os leitores com números, deixem-me dizer que o custo dos fretes dos navios de transporte de todas estas toneladas, atingiu os valores mais altos dos últimos 20 anos e a refinação do petróleo – maioritariamente feita em Sines e Matosinhos, logo sem implicar «saída» de dinheiro – atingiu igualmente preços (margens) há muito esquecidas e que, aliás, contribuíram muito para o excelente resultado que a Petrogal / GALP apresentou no exercício de 2004.

O que vos quero dizer é que devemos pagar em 2004 uma factura astronómica, superior aos 6 mil milhões de dólares, de importação das matérias-primas energéticas necessárias à vida do país.

Entrados em 2005, já estamos com mais 10 dólares por barril sobre o custo médio de 2004 e, a produção de electricidade – que em ano de pluviosidade média chega, em quase 40%, a vir das «barragens» – no quadro actual de seca, poderá ficar por metade daquele valor, o que significa mais uns milhões de toneladas de combustíveis fósseis a importar para termos a electricidade que queremos.

É muito azar junto!

Bem sei que temos sorte (?), para este efeito, em estar na Zona Euro e a valorização da moeda europeia face ao dólar, «limar» um pouco do impacto do crescimento do preço das «comodities» energéticas, precisamente referenciadas ao dólar.

Bem sei que, mesmo a 55 USD o barril em 2005, é mais barato do que os 43 dólares em 1979 que, aliás, foram suficientes para pôr as economias da OCDE e da Europa «de rastos»?

Mas o que eu quero dizer ao leitor é que isto, «cheira-me», não é só azar.

Quem conhece o sector, convive com especialistas, dispõe de informação e conhece há trinta anos o problema, percebe que estamos face a uma grave situação, que não se vai esbater nos próximos anos. Pior, existem condições para que se venha a agravar.

Dirão que sou pessimista. Tenho o crédito de, nas muitas comunicações públicas que tenho feito sobre o tema, nunca me ter expressado de forma tão negativa.

Com a informação disponível, sou hoje «signatário» daquela frase que «compara» o optimista ao pessimista:

– «aquele, porque julga que vivemos no melhor dos mundos, enquanto o pessimista teme que ele tenha razão?»

O «azar» pode ser maior, porque os especialistas do clima e meteorologia apontam para maior frequência de períodos secos, logo menos precipitação, que contribui decisivamente para os já magros cerca de 10% de energia que o país produz.

Também porque, dentro de três anos, vamos pagar centenas de milhões de dólares pelo dióxido de carbono que emitimos em excesso para a atmosfera, agravando a «fuga» de riqueza e os preços da energia.

Enfim, porque tudo aponta para que os 90% da energia que importamos se torne crescente e sustentavelmente mais cara.

Os «fundamentais» do mercado mundial do petróleo nunca foram tão negativos.

Para quem sabe «descodificar» as afirmações e o jogo de palavras do sector, cada dia confirma a tensão que se vive no mercado.

A ultra prudente Agência Internacional da Energia – constituída pelos países da OCDE importadores de petróleo – sempre preocupada na desdramatização das tensões energéticas, fez ontem dois significativos apelos mundiais:

«Pedir ao mundo que mude quanto ao uso do petróleo»;

«Pedir a implementação de vigorosos programas de uso mais racional da energia e decisivo aumento na eficiência energética».

Também ontem o ministro saudita do petróleo – sentado no que se considera ser o cofre-forte mundial de crude – anunciou que vai produzir mais meio milhão e barris, ou seja, mais de 0,5% da produção mundial actual.

É o mesmo que o Banco Mundial dizer que vai dar mais 0,5% de ajuda aos países vítimas do tsunami?

Não, não é maldade ou sadismo. Já percebemos é que o Rei Fahad e os Sheiks do Golfo, vão nus?

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