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"Bazuca" europeia está a ser desviada do combate às alterações climáticas. Portugal é um dos culpados

O Tribunal de Contas Europeu concluiu que o fundo de recuperação da UE pode não ser, afinal, tão ecológico como se faz crer e que há, pelo menos, 34,5 mil milhões de euros "desviados", que podem não ter contribuído para a ação climática.

11 de Setembro de 2024 às 16:04
Olivier Matthys/EPA
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Da "bazuca" europeia de 731 mil milhões de euros, à qual se somou, em 2022, o plano REPowerEU em resposta à crise energética mundial, no valor de 19 mil milhões de euros, restavam em fevereiro de 2024 648 mil milhões de euros disponíveis, refere o Tribunal de Contas Europeu. Sendo a transição ecológica um dos pilares do Mecanismo de Recuperação e Resiliência, a Comissão Europeia ditou que Estados-Membros têm de afetar pelo menos 37% das suas dotações à ação climática.

Para Bruxelas, esta meta foi excedida na fase de planeamento, tendo-se atingido, em média, 42,5% na União Europeia (ou seja, 275 mil milhões de euros). Em Portugal esta percentagem ronda os 40%, que equivalem a 9,1 mil milhões de euros. 

No entanto, o Tribunal de Contas Europeu vem agora dizer que o fundo de recuperação da UE pode não ser, afinal, tão ecológico como se faz crer e que há, pelo menos, 34,5 mil milhões de euros "desviados", que podem não ter contribuído para a ação climática.

Isto porque nem todas as medidas são tão ecológicas como a sua classificação indica e não se conhecem as verbas realmente aplicadas na ação climática nos países da UE. A conclusão é da mais recente auditoria levada a cabo pelo TCE - em quatro países: Grécia, Croácia, Portugal e Eslováquia - para avaliar se a conceção e a execução do MRR e dos planos nacionais de recuperação e resiliência (PRR) contribuem eficazmente para a transição ecológica.

Nos países auditados, onde Portugal se inclui, o tribunal detetou "insuficiências" e "incoerências" na execução das medidas, que colocam em causa a concretização dos objetivos climáticos e ambientais. "Por conseguinte, o TCR considera que o contributo do MRR para a transição ecológica é pouco claro", refere o TCE no seu relatório.

A estimativa agregada dos Estados-Membros ascendeu a cerca de 40% das dotações do MRR, ou seja, 203 mil milhões de euros dos 504 mil milhões de euros inicialmente orçamentados pelos Estados-Membros. Em fevereiro de 2024, o contributo climático foi revisto
para 275 mil milhões de euros (42,5%) de um total de 648 mil milhões de euros. 

O TCE salienta que, entre vários problemas, esse cálculo contém, pelo menos, 34,5 mil milhões de euros que não contribuíram para o clima. E aponta também para falhas nos marcos e nas metas associados às ações climáticas, na comunicação das despesas reais e na classificação de alguns projetos como sendo ecológicos.

"O MRR é um investimento de peso em toda a UE. Se for bem executado, deverá acelerar muito o cumprimento das ambiciosas metas climáticas da União", afirma Joëlle Elvinger, Membro do TCE responsável pelo relatório. "No entanto, os planos que o executam são muito pouco precisos, há diferenças entre o planeamento e a prática e não se sabe bem quanto dinheiro foi aplicado diretamente na transição ecológica", critica.

Em Portugal, esta auditoria do TCE identificou vários destes problemas:

Uma medida florestal de adaptação às alterações climáticas financiou os projetos de arquitetura e as obras de renovação de centros de proteção civil em zonas rurais. O Tribunal considera que estas despesas têm apenas uma relação moderada com a adaptação às alterações climáticas.

Outra medida de renovação de edifícios privados para melhorar a sua eficiência energética tinha como meta inicial um milhão de metros quadrados de área renovada. O Tribunal constatou que os projetos financiados excederam 10 vezes a meta (10 milhões de m²) com 41% dos custos estimados (123 milhões de euros de um total de 300 milhões de euros). O capítulo REPowerEU de Portugal complementou esta medida com mais 120 milhões de euros, atualizando a meta para 7,6 milhões de m² de área renovada. Tendo em conta os projetos que já tinham alcançado a meta, o Tribunal considera que a meta fixada para esta medida foi demasiado baixa para os montantes atribuídos.

No hidrogénio, os projetos de produção  têm de passar por um processo moroso para obter uma autorização de exploração. Os atrasos na obtenção de licenças e as perturbações na cadeia de abastecimento também abrandaram a execução. Em Portugal, à data da visita do Tribunal (julho de 2023), apenas um dos 23 projetos aprovados tinha recebido um adiantamento para iniciar os trabalhos

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