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TCE confirma alertas de que atrasos nos PRR podem inviabilizar absorção total de fundos até 2027

Tribunal de Contas Europeu alerta que a bazuca europeia pode não ser absorvida na totalidade até ao prazo definido para a sua conclusão. Na primeira metade do calendário, foram cumpridos apenas 30% dos PRR. Transição de reformas para investimentos ameaça agravar panorama.

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02 de Setembro de 2024 às 16:06
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O acumular de atrasos na execução dos Planos de Recuperação e Resiliência (PRR) dos 27 Estados-membros está a pôr em risco a absorção integral da chamada "bazuca" europeia. A conclusão é de um relatório do Tribunal de Contas Europeu (TCE), divulgado esta segunda-feira, que vem confirmar algumas das preocupações já levantadas por alguns dos Estados-membros.

"As dificuldades e os atrasos enfrentados pelos Estados-membros no cumprimento dos seus marcos e metas até às datas indicadas nas decisões de execução do Conselho, até mesmo na fase inicial do MRR [Mecanismo de Recuperação e Resiliência, a chamada "bazuca" europeia onde estão os PRR dos 27], revelam que existe um risco para a absorção dos fundos e que as medidas não serão concluídas como previsto, tendo em conta o efeito cumulativo esperado destes atrasos", lê-se no relatório do TCE.

O auditor europeu nota que, num inquérito feito às entidades de cada Estados-membros que coordenam a execução do PRR em termos nacionais, a esmagadora maioria considera que é pouco provável que todos os marcos e as metas, associados a investimentos e reformas, sejam alcançados até 2027, data prevista para a conclusão da implementação dos PRR. Só dois Estados-membros estão convencidos do contrário.

Os PRR iniciais continham 2.530 medidas (1.541 investimentos e 989 reformas) destinadas a apoiar a retoma pós-covid e a tornar as economias europeias mais sustentáveis e resilientes. Segundo o TCE, a maioria dos Estados-membros decidiu começar pelas reformas, por, em alguns casos, essas serem "importantes para facilitar a execução eficiente e eficaz dos investimentos". Mas essa opção pode prejudicar a execução.

Isso acontece porque os investimentos, especialmente em infraestruturas, tendem a ser "de natureza bastante complexa e são em geral mais sensíveis a atrasos causados por circunstâncias externas", que escapam ao controlo dos países. "Assim, é provável que o diferimento dos investimentos agrave ainda mais o risco de atrasos e de abrandamento da absorção", avisa a entidade sediada no Luxemburgo.

Além disso, o TCE nota que "o número de marcos e metas a alcançar não está repartido uniformemente ao longo do período de execução do MRR". Para a primeira metade do calendário para executar os PRR, foi pensada a realização de "apenas cerca de 28%" das 6.234 metas e marcos que os Estados-membros têm a cumprir e essas registaram atrasos significativos.

Nos acordos assinados com a Comissão Europeia, estava a prevista a apresentação de 104 pedidos de pagamento de subvenções e empréstimos do PRR por parte dos Estados-membros até ao final de 2023. Mas só 70% (73) foram realizados no prazo estipulado. Portugal foi um nove países a pedir atempadamente os pedidos definidos, a par da Alemanha, Itália, Croácia, Dinamarca, Letónia, Eslováquia, Chéquia e Malta. 

Porém, o acordo de operacionalização de cada PRR previa um calendário indicativo que derrapou em todos os países. "A situação é muito variável, não só em termos do número de pedidos de pagamento atrasados, que vão de um (Finlândia e Irlanda) a seis (Polónia, Roménia, Eslovénia), mas também na duração do atraso, que, para o primeiro pagamento, oscila entre um mês (Chipre) e 12 meses (Estónia)", revela o TCE.

No caso de Portugal, os primeiros dois pedidos de pagamento foram feitos dentro do calendário previsto, mas o terceiro e quarto pedidos – que foram feitos em simultâneo em outubro de 2023 – tiveram um atraso de 9 meses no caso do terceiro pedido e de 3 meses no caso do quarto

Os incumprimentos de prazos na apresentação dos pedidos de pagamento tornaram-se "mais frequentes à medida que a execução do MRR progrediu". No primeiro pedido de pagamento, 56% (18 de 32) dos pedidos foram apresentados atempadamente, segundo o TCE. No segundo, a percentagem diminuiu para 27% (oito em 30) e, no terceiro pedido, desceu para 9,5% (dois em 21).

Em termos de financiamento, os Estados-membros apresentaram pedidos de pagamento no valor de 228 mil milhões de euros, em vez dos 273 mil milhões previstos – cerca de 16% menos. Deste montante, cerca de 182 mil milhões de euros tinham sido pagos aos Estados-membros.

Da inflação à subestimação de prazos: as razões apontadas para os atrasos

As razões mais apontadas para os atrasos na execução dos PRR variam entre os Estados-membros, mas as mais frequentes são as alterações das circunstâncias externas (mencionada por 81% das entidades de coordenação do PRR), como a inflação, falhas no aprovisionamento ou alterações no contexto político, e desadequação das medidas acordadas com Bruxelas ou subestimação do tempo necessário para as executar (referida por 77% das entidades).

O TCE nota também que as incertezas quanto às regras específicas de execução do PRR, como o princípio de "não prejudicar significativamente" e o cumprimento satisfatório dos marcos e metas associados aos investimentos e reformas acordados, também pesam nesse atrasos. Acrescem ainda dificuldades relacionadas com a capacidade administrativa dos Estados-membros (23%).

"Além disso, 57% dos organismos de coordenação do MRR inquiridos pelo tribunal consideraram provável ou muito provável que a absorção de fundos do MRR para além de outros fundos da UE no período de 2021-2027 constituísse um verdadeiro desafio". É o caso de Portugal que, além dos 22,2 mil milhões de euros do PRR para executar, tem ainda mais 23 mil milhões do atual quadro comunitário, PT2030, por absorver.

O auditor europeu reconhece que a Comissão Europeia e os Estados-membros tomaram medidas para facilitar a absorção, mas diz que "é demasiado cedo para avaliar se estas têm um impacto positivo". 

Dinheiro demora a chegar aos destinatários finais

O TCE admite que a possibilidade de os Estados-membros recorrerem a um pré-financiamento de até 13% do total de subvenções e empréstimos a que têm direito – que são depois "descontadas" nos pedidos de pagamento posteriores – "permitiu, numa fase inicial, disponibilizar rapidamente mais fundos e, por conseguinte, era coerente com o objetivo do MRR de dar resposta à crise".

Até ao final de 2023, a Comissão Europeia tinha desembolsado um total de 213 mil milhões de euros, incluindo 56,5 mil milhões de euros sob a forma de pré-financiamentos.

Porém, sete países (Bélgica, Países Baixos, Irlanda, Finlândia, Suécia, Polónia e Hungria) não tinham recebido quaisquer fundos. Desses, a Bélgica, Irlanda, Finlândia e Polónia tinham já apresentado pedidos de pagamento até ao final do ano passado, mas sem receberem qualquer financiamento. Já a Hungria e os Países Baixos não tinham ainda assinado sequer o acordo operacional que operacionaliza os PRR.

O relatório do TCE mostra ainda que há países que não fornecem informações completas e coerentes sobre o destino das verbas desembolsadas pela Comissão Europeia aos Estados-membros, no âmbito do PRR. Nos 15 Estados-membros que disponibilizam essa informação (incluindo Portugal), "quase metade" dos fundos desembolsados ainda não tinham chegaram aos destinatários finais até ao final de 2023.

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