Notícia
Virgolino Faneca: o que têm em comum Ronaldo, Madonna, Maria Vieira e Bruno de Carvalho?
O mundo das indignações é tão bom que até farta. A tal ponto que Virgolino Faneca resolveu escrever ao seu amigo César que mora num país onde não se passa rigorosamente nada, chamado Trinidad e Tobago, para lhe fazer negaças.
Estimado César
Espero que esta te encontre bem, a ti e a todos os teus, mas devo confessar que escrevo para te fazer negaças. Tu vives em Trinidad e Tobago, um sítio onde não se passa rigorosamente nada, e imagino que estejas a morrer de tédio. Para aumentar o teu sofrimento, devo dizer que Portugal é um local onde se passa tudo e todos os dias temos uma indignação supimpa para nos afagar a alma. Mais. Trata-se de indignações fracturantes e decisivas para o futuro do país e quiçá do mundo. Queres exemplos? Olha, o futuro do sector vitivinícola nacional está em risco e a malta está indignada e como razão. Porquê? Vê lá que a Gio (se não sabes quem é a Gio, és um analfabeto e não vou perder tempo a explicar-te) foi fotografada com um copo na mão, aparentemente de vinho, estando grávida de muitos meses.
E como é que uma futura mãe se pode comportar de forma tão abjecta, dando álcool à criança por via da placenta? Claro que não pode. É um comportamento irresponsável, justamente criticado por múltiplos utentes das redes sociais, e que terá um efeito colateral nas vendas de vinho, porque será considerado um produto nocivo. Pena é que os ditos utentes não se tenham lembrado de criticar o pai da criança, o Cristiano Ronaldo (este, sabes quem é, de certeza), por também ter bebido vinho, na medida em que sendo um futebolista, o melhor do mundo, se mostra pouco profissional e dá um mau exemplo para os seus fãs. Não se tendo ninguém indignado com este pormenor, vou direitinho à Comissão de Igualdade de Géneros (CIG) fazer uma queixa por discriminação. Se a Gio é destratada, Cristiano Ronaldo também tem de ser destratado. Ou ela é alvo de indignação apenas por ser gaja? Esta dualidade de tratamento exige uma recomendação da CIG com carácter de urgência.
Depois temos outro debate telúrico em mãos, gerador de muitas indignações, também relacionado com questões de cidadania em geral e jardinagem em particular, que se consubstanciou na situação que passo a descrever. Vê lá que a Madonna foi passear com as filhas ao jardim dos Seteais, pisou a relva num espaço onde diz expressamente "proibido pisar a relva" e, não contente com isso, publicou uma fotografia no Instagram a gabar-se do delito. Carradas de indignação justificada. Não basta sermos pisados pelos gajos da Comissão Europeia, do FMI e de dúzia e meia de espanhóis e ainda vem uma americana, artista dúbia, pisar-nos a relva. É por estas e outras que não gosto de futebol, porque andam 22 gajos a correr atrás da bola e a pisar relva sem o mínimo de cuidado pela natureza.
Sendo que as outras são um vídeo que o Bruno de Carvalho publicou no Facebook do Sporting e depois tirou (tipo Estaline dos tempos modernos, esquecendo-se de que agora as coisas não deixam de existir só porque alguém as apaga), a comparar-se ao Cristiano Ronaldo porque ambos vão ser pais. Mas isto não dá para indignação. É só uma figura ridícula que caiu aqui de pára-quedas a propósito do futebol, embora alguns sportinguistas possam sentir um misto de indignação silenciosa e vergonha com estas figurinhas do seu presidente.
Depois temos a indignação da Maria Vieira. A Maria Vieira indigna-se com os filmes indianos que passam na RTP (só para agradar ao primeiro-ministro, diz ela), desanca Tony Carreira (por causa dos plágios que lhe dão para rir, diz ela), exalta as virtudes de Donald Trump (o que deve deixar a Melania com ciúmes, digo eu), lembra que tragédias como os incêndios não ocorriam no tempo da ditadura (vá-se lá saber porquê, diz ela). De seguida, as pessoas das redes sociais indignam-se com as indignações estapafúrdias da senhora que, de seguida, lança um livro onde reúne as suas indignações facebookianas e ganha umas coroas com isso, gerando uma indignação suplementar.
Como vês, estás a perder tudo aquilo que a vida tem de bom. Rói-te de inveja, mas antes disso aceita um abraço deste teu,
Virgolino Faneca
Espero que esta te encontre bem, a ti e a todos os teus, mas devo confessar que escrevo para te fazer negaças. Tu vives em Trinidad e Tobago, um sítio onde não se passa rigorosamente nada, e imagino que estejas a morrer de tédio. Para aumentar o teu sofrimento, devo dizer que Portugal é um local onde se passa tudo e todos os dias temos uma indignação supimpa para nos afagar a alma. Mais. Trata-se de indignações fracturantes e decisivas para o futuro do país e quiçá do mundo. Queres exemplos? Olha, o futuro do sector vitivinícola nacional está em risco e a malta está indignada e como razão. Porquê? Vê lá que a Gio (se não sabes quem é a Gio, és um analfabeto e não vou perder tempo a explicar-te) foi fotografada com um copo na mão, aparentemente de vinho, estando grávida de muitos meses.
Depois temos outro debate telúrico em mãos, gerador de muitas indignações, também relacionado com questões de cidadania em geral e jardinagem em particular, que se consubstanciou na situação que passo a descrever. Vê lá que a Madonna foi passear com as filhas ao jardim dos Seteais, pisou a relva num espaço onde diz expressamente "proibido pisar a relva" e, não contente com isso, publicou uma fotografia no Instagram a gabar-se do delito. Carradas de indignação justificada. Não basta sermos pisados pelos gajos da Comissão Europeia, do FMI e de dúzia e meia de espanhóis e ainda vem uma americana, artista dúbia, pisar-nos a relva. É por estas e outras que não gosto de futebol, porque andam 22 gajos a correr atrás da bola e a pisar relva sem o mínimo de cuidado pela natureza.
Sendo que as outras são um vídeo que o Bruno de Carvalho publicou no Facebook do Sporting e depois tirou (tipo Estaline dos tempos modernos, esquecendo-se de que agora as coisas não deixam de existir só porque alguém as apaga), a comparar-se ao Cristiano Ronaldo porque ambos vão ser pais. Mas isto não dá para indignação. É só uma figura ridícula que caiu aqui de pára-quedas a propósito do futebol, embora alguns sportinguistas possam sentir um misto de indignação silenciosa e vergonha com estas figurinhas do seu presidente.
Depois temos a indignação da Maria Vieira. A Maria Vieira indigna-se com os filmes indianos que passam na RTP (só para agradar ao primeiro-ministro, diz ela), desanca Tony Carreira (por causa dos plágios que lhe dão para rir, diz ela), exalta as virtudes de Donald Trump (o que deve deixar a Melania com ciúmes, digo eu), lembra que tragédias como os incêndios não ocorriam no tempo da ditadura (vá-se lá saber porquê, diz ela). De seguida, as pessoas das redes sociais indignam-se com as indignações estapafúrdias da senhora que, de seguida, lança um livro onde reúne as suas indignações facebookianas e ganha umas coroas com isso, gerando uma indignação suplementar.
Como vês, estás a perder tudo aquilo que a vida tem de bom. Rói-te de inveja, mas antes disso aceita um abraço deste teu,
Virgolino Faneca