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11 perguntas e respostas sobre o conflito laboral na Autoeuropa

O Negócios conta como começou a greve histórica na fábrica da Volkswagen, o que exigem trabalhadores e administração e quais as consequências se esta guerra laboral escalar.

Bruno Simão
02 de Setembro de 2017 às 15:00
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1 - Porque aconteceu a greve na Autoeuropa?

 

A questão de fundo na Autoeuropa é o dia de trabalho ao sábado. A administração quer introduzir o dia de trabalho ao sábado devido à chegada do novo modelo, o SUV citadino T-Roc. Mas os trabalhadores rejeitaram em referendo a proposta da administração para remunerar o dia de trabalho ao sábado.

 

O pré-acordo alcançado entre a comissão de trabalhadores e a administração no final de Julho acabou por ser chumbado dias depois pelos trabalhadores da Autoeuropa, o que provocou a demissão da comissão de trabalhadores. A greve de 30 de Agosto tinha sido marcada anteriormente, a 21 de Julho, mas com o pré-acordo chumbado por 75% dos trabalhadores e a comissão de trabalhadores demissionária, o dia de paragem em Palmela avançou mesmo.

 

O sindicato SITE, afecto à CGTP, disse que a "adesão à greve foi total. Desde às 23:30 que a Autoeuropa está completamente parada. Não se produziu um único automóvel". Já a administração da fábrica apontou que a adesão à greve tinha sido de 41%.

 

2 - O que querem os trabalhadores?

 

A greve de 30 de Agosto foi aprovada pelos trabalhadores da Autoeuropa em dois plenários realizados a 21 de Julho. A primeira grande questão deste conflito laboral é a obrigatoriedade de trabalhar todos os sábados. O sindicato SITE Sul considera que os novos "horários de trabalho ameaçam de morte o direito a conciliar o trabalho com a vida pessoal e familiar" e exige que a administração recue na sua intenção.  

 

Em segundo lugar, surge a discórdia por razões financeiras. Os trabalhadores consideram que a proposta apresentada pela administração (extra de 175 euros por mês) fica abaixo do valor que receberiam se o sábado fosse pago como horas extraordinárias (400 euros mensais).

 

O sindicato SITE Sul vai ser recebido pela administração da fábrica no dia 7 de Setembro, onde vai apresentar a resolução aprovada por 3.000 trabalhadores da Autoeuropa a exigir o recuo da obrigatoriedade de trabalhar aos sábados.

 

 3 – O que quer a administração?

 

A fábrica de Palmela vai passar para a "liga das grandes fábricas" pois vai ter finalmente um "carro de grande volume" de produção, depois de anos a produzir "modelos de nicho", segundo o director-geral da fábrica, Miguel Sanches.

 

Isto implica que a Autoeuropa vai ter que quase triplicar a sua produção para 240 mil unidades em 2018 face aos níveis de 2016. Se esta meta for atingida, vai eclipsar o recorde anterior de produção em Palmela: 139 mil unidades em 1998.

 

Para produzir estas 240 mil unidades, sendo a maioria T-Roc, a fábrica está a contratar 2.000 trabalhadores, que se vão juntar aos cerca de 3.500 trabalhadores da empresa. Mas para atingir este nível de produção a fábrica vai introduzir o turno nocturno e também o dia de trabalho ao sábado. No total, a fábrica da Autoeuropa vai trabalhar sem parar durante seis dias por semana, em três turnos diários, num total de 18 turnos semanais.

 

 4 - Porque é que a greve aconteceu nesta altura?

 

A primeira greve da Autoeuropa em mais de vinte anos de vida, sem contar com as greves gerais, acontece devido a uma mudança de paradigma na produção da fábrica portuguesa da Volkswagen.

 

A produção vai atingir recordes com a chegada do T-Roc, e um novo máximo de trabalhadores, e para isso vai precisar de estar a produzir sem interrupções durante 24 horas por dia, seis dias por semana.

 

Ora, isto é uma novidade para os trabalhadores da Autoeuropa, pois o trabalho ao sábado nunca foi usado numa base permanente em Palmela, tendo os turnos nocturnos já sido usados durante vários anos.

 

A par da mudança de paradigma na produção, a fábrica também perdeu este ano o histórico sindicalista, António Chora, que se reformou depois de 20 anos como coordenador da comissão de trabalhadores.

 

Sete meses após a sua saída, a Autoeuropa viveu uma greve histórica no dia 30 de Agosto. António Chora, ligado ao Bloco de Esquerda, disse estar "espantado" com esta greve e acusou o sindicato SITE Sul, afecto à CGTP, de ser "populista" e de estar a realizar um "assalto ao castelo", de forma a passar a controlar a comissão de trabalhadores.

 

5 - Como é que o conflito laboral escalou na Autoeuropa?

 

Foram seis meses de negociações sem sucesso para alcançar um acordo sobre a remuneração do trabalho ao sábado. As negociações foram interrompidas no dia 14 de Julho. Logo de seguida, o conflito laboral escala, atingindo um pico a 21 de Julho quando os trabalhadores aprovam um dia de greve para 30 de Agosto.

 

Debaixo de fogo, pressionados pela hipótese de greve, a comissão de trabalhadores e a administração dão início a uma maratona negocial que se prolonga pela madrugada fora do dia 27 de Julho quando saiu fumo branco da Autoeuropa: um pré-acordo tinha sido alcançado.

 

Mas 24 horas depois, os trabalhadores foram chamados a votar o pré-acordo em referendo e 75% chumbaram-no. Esta não é a primeira vez que um pré-acordo foi chumbado, pois  rejeitaram outros acordos no final de 2005 e em Julho de 2009, mas a direcção  e os trabalhadores acabaram depois por chegar a um compromisso.

Como resultado do chumbo, a comissão de trabalhadores, coordenada por Fernando Sequeira, apresentou a sua demissão no dia 2 de Agosto. A CT reconheceu "que a maioria dos trabalhadores pretende outro caminho, deixamos assim aberto espaço para que outros demonstrem as suas capacidades negociais".


Negócios explica a greve na Autoeuropa
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André Cabrita-Mendes, jornalista do Negócios, explica o que se está a passar na Autoeuropa, que cumpre esta quarta-feira, 30 de Agosto, um dia de greve.

 

6 - Quais são os próximos passos?


Já está marcada uma reunião para dia 7 de Setembro onde o sindicato SITE Sul vai entregar à administração da fábrica a resolução aprovada pelos trabalhadores nos plenários realizados no dia 28 de Agosto.

"O objectivo desta reunião é transmitir a resolução aprovada nos plenários onde os trabalhadores rejeitaram a proposta e querem a retirada da proposta pela administração", disse Eduardo Florindo do SITE Sul.

Depois vai ser preciso esperar um mês para terem lugar as eleições para a nova comissão de trabalhadores, marcada para o dia 3 de Outubro.

7 - A direcção da Autoeuropa ainda quer alcançar um acordo?

Sim. A mensagem tem sido clara por parte da administração. Apesar de considerar que poderia avançar para o trabalho ao sábado sem nenhuma compensação extra, a direcção quer chegar a acordo com os trabalhadores como manda a tradição de diálogo social nas empresas alemãs.

"O nosso objectivo será sempre chegar a um acordo que convenha às duas partes. Num processo de co-gestão o nosso objectivo será sempre chegar a um acordo com os representantes dos trabalhadores, por forma a que os objectivos de crescimento, de emprego, de produção, sejam cumpridos", disse o director-geral da Autoeuropa, Miguel Sanches, em entrevista ao Negócios.

8 - Quando é que arrancam novamente as negociações?

Os trabalhadores e a administração vão regressar à mesa de negociações depois da eleição de 3 de Outubro que vai decidir quem é que vai ser a nova comissão de trabalhadores.

Mas porque é que os dois lados vão esperar um mês para voltar a negociar? Tal como sempre aconteceu até agora, os acordos laborais na Autoeuropa são sempre negociados pela administração e por uma comissão de trabalhadores eleita pelos próprios colaboradores.

Este ano foi pródigo em acontecimentos laborais extraordinários na Autoeuropa, com a realização da primeira greve e também o primeiro plenário organizado por um sindicato, o SITE Sul. Mesmo neste cenário a administração continua irredutível e rejeita negociar um acordo com os sindicatos, preferindo esperar pela nova comissão de trabalhadores.

"É essencial dar continuidade ao processo de diálogo com uma comissão de trabalhadores eleita, à semelhança das boas práticas laborais da Volkswagen Autoeuropa e do grupo Volkswagen", disse a administração da fábrica no dia 30 de Agosto. 

Agora é preciso esperar pelas eleições de dia 3 de Outubro para ter uma nova comissão de trabalhadores. Até lá, as negociações de um acordo laboral sobre a compensação do trabalho ao sábado continuam congeladas.

A CGTP está contra o facto da administração deixar de fora os sindicatos do processo negocial, com o secretário-geral da CGTP, Arménio Carlos, a dizer que a administração não pode "hostilizar ninguém".

9 - Que consequências pode ter o escalar do conflito laboral?

Caso não haja acordo laboral, a Volkswagen na Alemanha pode decidir por deslocalizar parte da produção do T-Roc. O director-geral da Autoeuropa já avisou que a administração da Volkswagen na Alemanha pode tomar esta decisão se não houver acordo: "É um cenário que pode estar em cima da mesa, mas tanto a administração como a equipa da Autoeuropa irão fazer todo o possível para evitar esse cenário e manter toda a produção do carro em Portugal", disse Miguel Sanches em entrevista ao Negócios.

Também o antigo coordenador da comissão de trabalhadores, António Chora, avisou que a empresa alemã pode tomar medidas drásticas. "Se a Volkswagen não conseguir produzir os automóveis aqui, há-de produzi-los noutro lado", afirmou na entrevista ao Negócios.

E deu dois exemplos em Espanha de casos semelhantes dentro do grupo. "Eu já vi isto acontecer em 2005 e 2006 na Volkswagen em Pamplona e na Seat em Barcelona. Num caso não foram admitidos trabalhadores, noutro caso foram para a rua", afirmou António Chora que considera que, caso aconteça uma deslocalização de parte do T-Roc, estariam em risco cerca de 700 a 800 postos de trabalho das 2.000 novas contratações previstas.

O escalar do conflito laboral na Autoeuropa pode vir a ter consequências a montante, ao colocar em risco a criação de 400 novos postos de trabalho nas empresas fornecedoras da fábrica da Volkswagen.

"Se não encontrarem uma solução, obviamente as empresas vão deixar de recrutar os trabalhadores que têm previsto contratar", avisou o coordenador das comissões de trabalhadores do parque industrial da Autoeuropa, Daniel Bernardino.

Este parque industrial com 13 empresas, situado ao lado da Autoeuropa, conta com 1.600 trabalhadores. A chegada do T-Roc a Palmela vai fazer com que  estas empresas recrutem, pelo menos, mais 400 trabalhadores, que podem ficar em risco.

10 - Qual a posição da casa-mãe na Alemanha? 

A Volkswagen acredita que a administração e os trabalhadores da Autoeuropa vão acabar por chegar a um acordo sobre a remuneração do trabalho aos sábados. 

"Vamos fazer o máximo para estabilizar as relações laborais em Portugal. Palmela vai-se tornar numa fábrica muito importante para nós, vamos ter um grande crescimento com o T-Roc. Estamos confiantes num acordo", disse ao Negócios o presidente da marca Volkswagen, Herbert Diess, a 23 de Agosto durante a apresentação mundial do T-Roc.

Em relação à possibilidade de deslocalizar parte da produção, o também administrador do grupo Volkswagen rejeitou esse cenário por acreditar num acordo. "Muitas vezes nestas situações há ameaças dos dois lados, mas isso é errado. As pessoas devem sentar-se e tentar chegar a acordo para um futuro em comum. Os nossos investimentos são de longo prazo, o que precisamos é de uma relação estável com a força laboral", afirmou Herbert Diess.


11 - Como é que o Governo e os partidos políticos têm reagido a esta crise?

O Governo não se quis alongar nos comentários em relação à greve e o primeiro ministro, António Costa, limitou-se a dizer que a Autoeuropa é uma empresa "da maior importância para o país". 

Já o ministro da Economia, Manuel Caldeira Cabral, disse a 23 de Agosto esperar que a administração e os trabalhadores consigam "chegar a uma solução".

O CDS disse ser "lamentável que a Autoeuropa seja palco de outras guerras que não têm a ver com os direitos dos trabalhadores", apontando que existe "uma guerra entre a área mais afecta à CGTP e ao PCP e a área mais afecta ao Bloco de Esquerda", disse Assunção Cristas.

O PSD, pelo seu lado, acusou o Governo de permitir que a CGTP se instale na Autoeuropa "a troca de aprovações de orçamentos do Estado", afirmou Maria Luís Albuquerque.

O PCP, por seu turno, mostrou a sua solidariedade para com os trabalhadores em greve, referindo que é "natural" que os trabalhadores "tomem uma posição" sobre os seus direitos.

Já a líder do Bloco de Esquerda, Catarina Martins, disse estar a olhar para esta greve com "enorme apreensão", sublinhando que a Autoeuropa é um "exemplo do respeito pelos seus trabalhadores, que é bom que se mantenha".

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