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Seixas da Costa sobre Lula: "Pressente-se em tudo isto um grande desespero"

O ex-embaixador no Brasil aponta o dedo à forma como o Ministério Público brasileiro destratou Lula, mas diz que o ex-presidente terá ido longe demais. Uma crítica que atravessa grande parte das opiniões em Portugal.

Ueslei Marcelino/Reuters
17 de Março de 2016 às 11:02
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"Lula terá ido longe demais" ao aceitar o lugar de ministro da Casa Civil de Dilma Roussef "com o único objectivo de escapar à instância judicial em que está a ser investigado, colocando-se sob o "foro privilegiado" do Supremo Tribunal Federal". Quem o escreve é Francisco Seixas da Costa, embaixador português no Brasil entre 2005 e 2009, que critica a forma de actuação do ministério público brasileiro, mas não tem dúvidas: esta "não vai passar a ser uma linha prestigiante no currículo de um homem que, no passado, havia ganho a admiração de muitos milhões de pessoas", lê-se num artigo de opinião publicado esta quinta-feira nas páginas do Diário de Notícias.

"É verdade que o modo como sectores do Ministério Público brasileiro estavam a destratar o antigo presidente estava longe de ser aceitável, como foi flagrante na forma desrespeitosa como foi levado a prestar declarações, bem como em comentários, politicamente enviesados, feitos sobre o processo" , escreve o embaixador, para acrescentar que, no entanto, tal não serve de desculpa ao comportamento de Lula e Dilma, que parecem desesperados perante os desenvolvimentos.

"Ao decidir entrar para o governo do país, instrumentalizando-o abertamente por interesse pessoal, Lula terá ido longe de mais. Terá assim disparado a sua última bala, aquilo a que alguns chamam a 'bala de prata'. Que também passa a pertencer a Dilma Rousseff, cujo futuro fica agora, mais do que nunca, ligado ao destino de Lula ", continua Seixas da Costa, que admite mais desenvolvimentos pouco edificantes para a democracia brasileira: "Pressente-se em tudo isto um grande desespero. E o desespero, na vida como na política, nunca é bom conselheiro".


Também nas páginas do Diário de Notícias, Nuno Saraiva, subdirector, realça o contraste apontado por Seixas da Costa entre esta decisão de Lula da Silva e a que tomou no meio do seu segundo mandato, com popularidade em alta e contra a sugestão de muitos, de não alterar a Constituição para se candidatar a um terceiro mandado como presidente. "Como escreveu o embaixador Francisco Seixas da Costa, depois de com aquela longínqua decisão de respeito pela lei ter 'tirado' o Brasil da América Latina, faz agora que o país regresse ao ponto do mapa de onde afinal nunca tinha saído", escreve Nuno Saraiva, que não poupa na crítica: "No Brasil, a vergonha passou a ter a cara de Lula. Este abuso de poder, contrário ao moralismo da esquerda, é criminoso e não tem qualquer espécie de perdão", defende.

cotacao Ao decidir entrar para o governo do país, instrumentalizando-o abertamente por interesse pessoal, Lula terá ido longe de mais. Terá assim disparado a sua última bala, aquilo a que alguns chamam a 'bala de prata'. Francisco Seixas da Costa Embaixador no Brasil entre 2005 e 2009

"Lula e a negação de si mesmo" titula Manuel Carvalho, jornalista do Público, que considera que não é apenas o legado político de Lula da Silva que perde: a margem política de Dilma Rousseff e do PT ficou ferida de morte. "Lula não se imolou, apenas: afundou o governo de Dilma Rousseff e arrasou o crédito dessa máquina partidária transversal, criativa e poderosa que foi o PT", escreve o jornalista que vê a Presidente caída em desgraça aos pés de Lula: Dilma "já não é a primeira magistrada da República; ao acolher Lula tornou-se uma tarefeira ao serviço dos interesses do partido. A Presidente tornar-se-á a criatura sem espaço nem poder para disputar o protagonismo do seu criador, que certamente tenderá a acabar com as políticas de ajuste fiscal, e a optar por medidas expansionistas que podem agravar o tumulto financeiro".


O país que operou uma das grandes transformações económicas e sociais do mundo nos últimos 15 anos está agora envolto num marasmo económico e político imprevisível, com a economia a abrandar, as finanças a apertar, e múltiplas suspeitas de corrupção que, elenca Manuel Carvalho, "envolvem agora Lula, o vice-presidente, um ministro, os presidentes do Senado e da Câmara dos Deputados ou o líder do principal partido da oposição, Aécio Neves".

Perante os desenvolvimentos no seu país, Simone Duarte, directora Internacional e de Parceiras, fica sem palavras perante o que chama de "'House of Cards' à moda tropical": "Hoje há 18 anos fora, os meus amigos de todo o mundo perguntam: o que está a acontecer no teu país? E eu, bem, eu não sei o que responder".
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