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Bolsa e real desaprovam subida de Lula a "primeiro-ministro" do Brasil

A confirmação de que Lula da Silva será o chefe da Casa Civil da presidente Dilma Rousseff levou a um acentuar da queda da Bolsa de São Paulo e da cotação do real, que acumulam nestes três dias as maiores perdas desde 2008 e 2011, respectivamente.

Reuters
16 de Março de 2016 às 18:50
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O real voltou a afundar e a Bolsa de São Paulo chegou a liderar as perdas nas praças mundiais na sequência da notícia de que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, alvo de três inquéritos por suspeitas de corrupção, ocultação de património e de obstrução à justiça, será o novo chefe da Casa Civil – uma espécie de primeiro-ministro - da presidente Dilma Rousseff, também ela alvo de um processo de destituição ("impeachment") por ter alegadamente maquilhado as contas públicas e sido cúmplice do esquema de corrupção montado na Petrobras, empresa a que presidiu antes de, em 2010, subir à presidência do país.

O real acumula a maior queda em três dias (menos 5,3%) desde 2011 face ao dólar, refere a Bloomberg, e o Ibovespa, o principal índice da Bolsa de São Paulo, acumula, por seu turno, a maior queda (5%) desde 2008, ano da grande crise financeira mundial. As acções mais castigadas são as do Itaú Unibanco, do Banco Bradesco e da Petrobras, mas, ao fim do dia, o índice bolsista recuperava 0,5% depois de ter estado a cair quase 1% quando foi confirmada a subida de Lula a ministro.

"Esta remodelação aponta para uma mudança de prioridades do governo no sentido da conveniência política e em detrimento de uma política de consolidação orçamental", disse o analista Samar Maziad da Moody's, citado pela Reuters.  "Os mercados estão agora, tardiamente, a acordar para o facto de que a crise política vai aprofundar-se, minando ainda mais o regime político do Brasil", afirmou à Bloomberg Nicholas Spiro, analista da Lauressa Advisory, consultora sediada em Londres. "Este parece ser um outro tiro no escuro por este governo que está desesperado para permanecer no poder", afirmou ainda à Bloomberg Reginaldo Galhardo, gestor cambial na corretora Treviso de São Paulo. 


A assustar os investidores está a perspectiva de um agravamento da crise política assim como a possibilidade de Lula substituir o presidente do banco central Alexandre Tombini, que tem resistido à pressão do governo de baixar as taxas de juro (em alta por causa da inflação) e de usar as reservas internacionais do país para financiar políticas expansionistas com o objectivo de tentar contrariar a maior recessão em mais de 30 anos. "É a mais rápida maneira de jogar o país numa crise financeira de proporções catastróficas. Ninguém aqui (da equipe económica) está discutindo isso até porque é uma ideia irresponsável", disse uma fonte do banco central citada pelo Valor Económico.

 

Na opinião de instituições internacionais, os gastos excessivos do governo explicam parte da crise actual e não são solução. "O Brasil chegou a meados de 2014 [período que antecedeu as eleições presidenciais, ocorridas em Setembro desse ano, e antes do início da queda da cotação do petróleo] com grandes desequilíbrios macroeconómicos decorrentes do diagnóstico de que a desaceleração económica observada desde 2010 era causada pela inexistência de suficiente procura", escrevia o FMI num relatório divulgado em 7 de Outubro, segundo o qual "embora factores externos como a deterioração dos preços das matérias-primas expliquem alguma contracção na actividade, os principais factores de travagem são domésticos".

 

O PIB brasileiro caiu 3,8% no ano passado, o rendimento per capita recuou 4,6%, a inflação ronda os 10%, valor semelhante ao do desemprego, que atingirá nove milhões de pessoas – quase a população portuguesa. O "rating" da República caiu para "lixo" na classificação das principais agências de notação de risco financeiro.


Para que serve Lula na Casa Civil?

O Palácio do Planalto e o Partido dos Trabalhadores justificam a entrada de Lula no governo como uma iniciativa destinada a melhorar a coordenação política entre o partido e o PMDB, seu aliado no Executivo, e também agilizar a aprovação de medidas no congresso e no senado, onde também proliferam acusações de corrupção. O ex-presidente deverá ficar com a articulação política e também económica, relegando Dilma - a mais impopular dos presidentes do país - para um segundo plano.

 

A subida a ministro tem sido, porém, amplamente interpretada como uma derradeira manobra de Lula para escapar a Sérgio Moro, o juiz responsável pela operação Lava Jato que esteve por detrás da detenção e condenação de alguns dos maiores empresários do Brasil, como Marcelo Odebrecht.

Na qualidade de ministro, o ex-presidente passa a beneficiar de "foro privilegiado". Isso quer dizer que terá de responder pelas acusações perante o Supremo Tribunal Federal (STF), última instância da justiça barsileira, sendo que oito dos seus 11 integrantes, incluindo o seu presidente Ricardo Lewandowski, são juízes nomeados pelos governos de Lula e Dilma - apenas três (Gilmar Mendes, Marco Aurélio e Celso de Mello) estão em funções tendo sido indicados por governos anteriores aos do PT.

 

A nomeação de Lula surge uma semana depois de este ter sido levado a depor perante a Polícia Federal (no âmbito da Lava Jato), de o Ministério Público de São Paulo ter pedido a sua prisão preventiva (por ocultação de património), e de, ontem mesmo, a Procuradoria-geral da República ter pedido uma nova investigação ao ex-presidente com base na "delação premiada" do antigo senador "petista" Delcídio Amaral. Em causa, neste último pedido de investigação, estão suspeitas de obstrução à justiça, tráfico de influências e compra de votos no Senado para proteger os seus filhos da comissão parlamentar que averiguava casos de evasão fiscal. Lula terá ainda tentado evitar que a operação Lava Jato chegasse a si, através da "compra" do silêncio de Nestor Cerveró, antigo dirigente da Petrobras que, tal como Delcídio, concordou cooperar com a justiça a troco de redução de pena.

Pelo meio, no domingo, o Brasil assistiu às maiores manifestações da sua história: mais de três milhões saíram às ruas, pedindo o fim da corrupção com bonecos de Lula e Dilma. 

  

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