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O processo de destituição de Dilma arrancou. E agora?

Ao autorizar a abertura do processo de "impeachment" da presidente do Brasil, o presidente da Câmara dos Deputados apenas deu o primeiro passo numa caminhada que pode, ou não, levar à queda de Dilma Rousseff, acusada de ter cometido crimes graves contra os interesses do país.

Reuters
Eva Gaspar egaspar@negocios.pt 03 de Dezembro de 2015 às 15:39

Ao autorizar a abertura do processo de "impeachment" da presidente do Brasil, o presidente da Câmara dos Deputados apenas deu o primeiro passo numa caminhada que pode levar, ou não, à queda de Dilma Rousseff, acusada de ter cometido crimes graves contra os interesses do país.

O que aconteceu?

Eduardo Cunha, presidente do Câmara de Deputados, recebera já quase três dezenas de pedidos de "impeachment" de Dilma Rousseff – número recorde na história do Brasil - mas até agora não dera seguimento a nenhum deles. Nesta quarta-feira, 2 de Dezembro, acabou por autorizar a abertura de um processo de destituição da presidente do Brasil com base num dos mais recentes pedidos assinado por dois pesos pesados do país: Hélio Bicudo, fundador do Partido dos Trabalhadores, PT (partido da própria Dilma e de Lula da Silva) e Miguel Reale Júnior, um dos mais respeitados juristas do Brasil e ex-ministro da Justiça de Fernando Henrique Cardoso (PSDB, maior partido da oposição).

 

Porque só actuou agora?

Eduardo Cunha é membro do PMDB, partido aliado do PT na governação do Brasil (o vice-presidente Michel Temer é deste partido) e também está em maus lençóis. A Comissão de Ética da própria Câmara quer ponderar a sua destituição depois de a operação Lava Jato ter descoberto contas ocultas na Suíça. Até agora, havia a suspeita de que existia um pacto de bastidores: a liderança do PT travava o inquérito contra Cunha (o PT tem três deputados na comissão de Ética cujo sentido de voto pode ser decisivo) a troco deste não dar andamento aos pedidos de "impeachment" de Dilma. O que parece agora certo é que ao deixar avançar o processo contra a presidente Eduardo Cunha terá também dado um passo decisivo no seu próprio afastamento da presidência da Câmara.

O que acontece a partir de agora?
Explica o jornal Globo que o pedido será agora analisado por uma comissão especial formada por deputados de todos os partidos, proporcional ao tamanho de cada bancada. Serão ouvidas testemunhas, poderão ser realizadas diligências, e a presidente será convidada a apresentar a sua defesa. Essa comissão dará depois um parecer - a favor ou contra a abertura do processo de "impeachment". Tem 15 sessões parlamentares para concluir esta etapa.

Se o parecer for positivo, ele será, de seguida, votado no plenário. Se a Câmara considerar por uma maioria de dois terços (mínimo de 342 num total de 513 deputados) que existem indícios graves de violação dos preceitos constitucionais será formalmente aberto o processo de "impeachment" de Dilma. Nesse caso, esta será obrigada a afastar-se do cargo por 180 dias (nesse período será substituída pelo "vice" Michel Temer) e o processo seguirá para o Senado.

No Senado, o processo será presidido pelo presidente do Supremo Tribunal e a destituição de Dilma só se confirmará se, de novo nessa instância, dois terços votarem a favor (ou seja, um mínimo de 54 em 81 senadores).


De que é acusada Dilma?

De crimes de responsabilidade, que remetem para infracções cometidas por agentes políticos no desempenho de sua função que atentem contra a Constituição, a probidade da administração, a lei orçamental, entre outros, e que estão previstas em lei.


Quais são em concreto os crimes apontados à Presidente?

Como explicava Miguel Reale Júnior, em entrevista recente ao Negócios, há três conjuntos de actos alegadamente ilegais cometidos por Dilma:

- Enquanto Presidente do país, assinou decretos para destinar a diversos órgãos verbas não autorizadas pela lei orçamental, sem lastro na contabilidade pública, em violação da Constituição;

- Dilma contraiu ainda empréstimos com entidades financeiras do próprio Estado – Banco do Brasil, Caixa Económica Federal, BNDES – para financiar programas do Governo, de novo sem registo na contabilidade pública, permitindo transformar ilusoriamente dívida em excedente primário.


Recorde-se que o Tribunal de Contas do Brasil recomendou por unanimidade ao Congresso que chumbe a execução do orçamento de 2014. É a primeira vez, desde 1937, que a prestação de contas de um governo federal é rejeitada pela entidade fiscalizadora. As irregularidades detectadas totalizam o equivalente a 24 mil milhões de euros e incluem manobras para ocultar dívida assumida pelo Estado usando dinheiro de bancos públicos, entre os quais o BNDES e a Caixa Económica.

 

- Enquanto presidente do Conselho de Administração da Petrobras (cargo que ocupou nos dez anos anteriores a assumir a presidência do país, em 2011), Dilma é, por último, acusada de crime de responsabilidade contra a probidade na Administração. Em causa estão diversas operações, desde a compra que se revelou ruinosa da refinaria de Passadena passando pelo esquema de desvio de dinheiro para partidos e de corrupção montado com as grandes empreiteiras. Paralelamente, correm na na justiça (no âmbito da operação Lava Jato) processos que apontam para que parte dos recursos desviados da Petrobras foram directamente para as contas do PT e para financiar as próprias campanhas eleitorais de Dilma.

 

Como reagiu Dilma?
"Não paira contra mim nenhuma suspeita de desvio de dinheiro público. Não possuo conta no exterior, nem ocultei do conhecimento público a existência de bens pessoais. Nunca coagi ou tentei coagir instituições ou pessoas, na busca de satisfazer meus interesses. Meu passado e meu presente atestam minha idoneidade e meu inquestionável compromisso com as leis e a coisa pública", afirmou Dilma em comunicado, no qual acrescenta que se deve "ter tranquilidade e confiar nas nossas instituições e nos Estado Democrático e de Direito". Em recentes manifestações públicas, Dilma tem considerado que os pedidos de "impeachment" são "golpismo descarado", alegando que são as forças da oposição que estão a tentar chegar ao poder e "construir de forma artificial o impedimento de um governo eleito".

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