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A votação que deverá deixar Espanha à beira de novas eleições
Ao que tudo indica, Rajoy vai falhar esta sexta-feira a investidura como primeiro-ministro. E a menos que haja uma inesperada reviravolta até 31 de Outubro, Espanha terá mesmo novas eleições. É cada vez mais certo que a incerteza se vai prolongar até 2017.
Esta sexta-feira, 2 de Setembro, podia ser o dia das decisões em Espanha, país sem governo em plenitude de funções há mais de oito meses. Mas não deverá ser. Em princípio, e de acordo com as indicações dadas nos últimos dias pelos partidos espanhóis, Mariano Rajoy deverá ver chumbada a sua candidatura a primeiro-ministro na sessão de investidura que tem hoje lugar às 19:00 (18:00 em Lisboa) no Congresso de Deputados espanhol.
Depois de ter falhado a primeira votação para ser investido como primeiro-ministro, nesta segunda tentativa bastaria ao ainda chefe de Governo em funções garantir uma maioria simples dos 350 deputados. Contudo, Rajoy chega ao Congresso com os mesmos 170 votos favoráveis de quarta-feira, 137 do PP, 32 do Cidadãos e ainda o do parlamentar eleito pela Coligação Canária. E é improvável que hoje o presidente do PP consiga somar devendo, portanto, voltar a ver os restantes 180 parlamentares rejeitar a sua investidura.
Tendo em conta a continuação do bloqueio institucional vigente desde as eleições inconclusivas de 20 de Dezembro do ano passado, ganha contornos cada vez mais carregados a possibilidade de Espanha ter de realizar novas eleições, as terceiras no espaço de um ano.
Falhada a tentativa de investidura realizada há dois dias, começaram a contar na quarta-feira os 60 dias constitucionalmente previstos para a formação de governo, período findo o qual, se não tiver sido encontrada uma solução governativa, o rei Felipe VI é obrigado a dissolver as cortes e a convocar novas eleições gerais.
O que, tendo em conta os prazos, atiraria as eventuais eleições para o dia 25 de Dezembro. Esta é uma hipótese de tal forma provável que em Espanha os partidos já tratam de perceber como poderão antecipar o hipotético novo acto eleitoral por forma a que o mesmo não caia no dia de Natal. O PSOE já revelou que proporá que essas eleições acontecessem em 18 de Dezembro, enquanto já esta sexta-feira o porta-voz parlamentar do PP, Rafael Hernando, avisou que os populares tomarão "medidas" para evitar que as eleições aconteçam no Natal.
As alternativas para evitar eleições
Se é verdade que a realização de terceiras eleições é o cenário mais provável, ainda é possível que sejam evitadas. Começando pelo PP, o ainda primeiro-ministro em exercício pode ser hoje investido se houver uma "rebelião" de deputados socialistas face à reiterada rejeição da direcção do PSOE e do seu secretário-geral, Pedro Sánchez, ao nome de Rajoy. Hipótese improvável.
Bastam 11 abstenções de parlamentares do PSOE (ou de outros partidos, hipótese também improvável) para que Mariano Rajoy seja investido. A acalentar esta possibilidade estão as divergências ainda pouco ruidosas no seio socialista, com importantes figuras, tais como o ex-líder e antigo primeiro-ministro Felipe González, a defenderem uma mudança de posição na cúpula do partido para evitar novo acto eleitoral.
Acreditando na imobilidade do veto socialista a Rajoy - que ficou ainda mais claro no primeiro dia do debate de investidura - o presidente do PP poderia ainda renovar o seu mandato como chefe de governo se garantisse o apoio dos nacionalistas bascos (PNV). Com eleições regionais no País Basco – e também na Galiza – agendadas para 25 de Setembro, Mariano Rajoy pode esperar por essa altura para então tentar obter o apoio dos cinco deputados do PNV, alternativa que o Cidadãos até já parece contemplar enquanto última alternativa para evitar eleições, pese embora o partido liderado por Albert Rivera sempre tenha dito que rejeitaria apoiar uma solução que integrasse forças soberanistas.
Mas mesmo assim Rajoy precisaria de mais um deputado. A chave poderia então ser Pedro Quevedo, independente eleito pelas listas do PSOE nas Canárias, que poderia votar a favor do presidente do PP e assim superar o actual bloqueio político.
"Governo Frankenstein"?
Todavia, também Pedro Sánchez pode ainda acalentar a esperança de chegar a primeiro-ministro. Isto porque depois do pré-anunciado falhanço de Rajoy na sessão desta sexta-feira, Felipe VI poderá retomar as rondas de auscultação aos partidos e indicar um novo nome como candidato à chefia do governo, num processo que pode prolongar-se até que seja encontrado um primeiro-ministro ou até que acabem os dois meses para a formação de um Executivo (em 31 de Outubro).
O PSOE já admitiu que haverá uma nova reunião do Comité Federal (órgão de topo do partido que ratificou, em duas ocasiões, o "não" a Rajoy), presumivelmente depois das eleições regionais de 25 de Setembro. Altura em que os socialistas poderiam ajustar a sua posição, abrindo a porta a negociações, não apenas com o Podemos mas também com os pequenos partidos nacionalistas.
Se fosse mandatado por tal decisão colegial, Sánchez poderia procurar garantir o apoio dos deputados do Unidos Podemos (aliança entre o Podemos e a força pró-comunista Esquerda Unida) do Partido Democrata da Catalunha (PDC) e do PNV, uma solução já classificada pelo ex-secretário-geral socialista, Pérez Rubalcaba, de "governo Frankenstein".
A dificultar esta solução está a forte oposição de importantes sectores do PSOE a um "governo das esquerdas" com apoio de forças independentistas. Até porque a aproximação de Sánchez a tal cenário poderia abrir caminho a que Susana Díaz, presidente do governo autonómico da Andaluzia e forte crítica de acordos com o Podemos, desafiasse em definitivo a actual liderança, responsável pelos dois piores resultados do partido em legislativas desde a transição democrática espanhola.
Mas como recentemente recordou Pablo Iglésias, secretário-geral do Podemos, ao líder socialista, Sánchez tem de decidir-se porque "ou tenta uma alternativa connosco (Podemos), ou então é porque quer novas eleições". Pelo seu lado, na terça-feira, Mariano Rajoy fez questão de se assumir como a alternativa "mais conveniente e razoável", a única capaz de governar depois de o PP ter sido o único partido a sair reforçado em votos e mandatos nas eleições de 26 de Junho.