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26 de Setembro de 2003 às 10:27

Eco-chatos

Só não se pode dizer que tenha passado em brancas nuvens porque não é branco o fumo que sai dos carros, mas que este Dia Mundial Sem Carros foi uma piada, isso foi.

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Em Portugal, a oposição culpa o Governo. Está no seu papel. Os portugueses em geral, embarcam na onda – é sabido que “falar mal do Governo” é um dos mais populares desportos nacionais. Estão também os portugueses, na sua generalidade, a cumprir o papel que se espera deles.

Sem pretender defender o Governo, digo-lhes que o Executivo não tem – ou não deveria ter – nada a ver com isso. O sentido que pode haver numa iniciativa como a do Dia Mundial Sem Carros é supra (ou infra, dependendo do ponto de vista) governamental. Não se trata de não poder passar de carro por ruas fechadas (pelo Executivo) ao trânsito, mas de nos abstermos (nós) de andar de carro por ruas perfeitamente abertas ao trânsito.

E – que isso não seja lido como atenuante, mas como agravante – o fiasco que se viu em Portugal repetiu-se, em maior ou menor dose, no mundo todo. É sinal de que, em todo o mundo, a questão ambiental vai mobilizando cada vez menos dessas figuras simpáticas e simples, chamadas de “cidadãos comuns”, ou seja, “nós”.

Saiba, caríssimo leitor, que fiquei uns bons 15 minutos à procura de expressão que substituísse a surradíssima “questão ambiental”. É que ninguém mais aguenta falar em “questão ambiental”, em “ecologia”, em “desenvolvimento sustentável”, etc, etc... e, no entanto, os problemas que fizeram furor há dez anos continuam actualíssimos e agravados. Fartámo-nos do problema antes de o resolver.

A culpa? Pode haver várias, mas a que me parece mais gritante é a dos “eco-chatos” – esses fundamentalistas do meio-ambiente que vêem na raça humana um cancro e que, coerentemente (o fundamentalismo é o exagero da coerência), opõem-se a tudo o que tenha mão humana.

Um exemplo: os eco-chatos são o principal obstáculo à criação de parques eólicos em Portugal. Acham que aqueles moinhos de vento – que, até pelo que representam, parecem-me muito bonitos – ferem a paisagem!!! Dá ou não dá vontade de mandar que os eco-chatos (e, por extensão, a própria ecologia, o Dia Mundial Sem Carros, etc) vão... pastar vento?

Corro o risco de errar, mas acho que foi Pierre Cardin que respondeu, quando lhe pediram uma definição de “moda”: “É tudo o que sai de moda”. A lástima é que coisas que se referem ao nosso presente imediato, sim, mas também às gerações que nos hão de seguir (os nossos queridos netinhos) – como a tão ‘démodé’ “questão ambiental” – fiquem sujeitas – tanto como botas, vestidos e casacos – às volubilidades da moda.

PS: Se não cabe ao Executivo fechar ruas para que nos abstenhamos de usar o carro no Dia Mundial Sem Carros, cabe, isso sim, ao Executivo, fazer cumprir a lei, que, todos os dias, proíbe o estacionamento em cima do passeio.

PPS: Para não parecer pimba (e só para não parecer pimba), recuso o rótulo de “eco”, mas assumo o de “chato”... e é como tal que continuo a minha (vã) pregação contra o uso de passeios públicos como se estacionamentos fossem. E asseguro-lhes (sem provas) que boa parte dos carros estacionados em cima dos passeios de Portugal foi lá posta por gente que se insurge contra os parques eólicos por ver neles um atentado à paisagem.

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