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03 de Agosto de 2010 às 13:46

A China precisa de uma revolução no sector dos serviços

Goste ou não, a China está a reajustar a sua taxa de câmbio.

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Enquanto as autoridades chinesas continuam a fugir da questão sobre a melhor altura para deixar o renminbi apreciar, os trabalhadores industriais estão a votar com os pés… e com protestos.

A Honda ofereceu aos seus trabalhadores da fábrica de transmissões na China um aumento salarial de 24% para evitar uma greve que podia arruinar a empresa. A Foxconn, a fabricante tailandesa para a Apple e para a Dell, anunciou aumentos salariais de 70%. Para evitar problemas a Shenzhen anunciou um aumento do salário mínimo de 16%. A autoridade municipal de Pequim aumentou preventivamente o salário mínimo da cidade em 20%
O resultado será um aumento dos preços das exportações chinesas e da procura de combustível para as importações. O efeito será muito semelhante a uma apreciação da moeda.

A China deveria ter em conta estes aumentos salariais como uma medida do seu sucesso.

Rendimentos mais elevados são um corolário normal do crescimento económico.

A única diferença é que na China o ajustamento tem sido evitado e agora está a ocorrer de forma abrupta. Teria sido melhor que as autoridades chinesas tivessem promovido este ajustamento mais cedo e de forma mais gradual e que este tivesse ocorrido através da apreciação da moeda. Desta forma teria aumentado a influência dos trabalhadores nas importações e não na inflação, algo que não beneficia ninguém. Mas isso são coisas do passado.

Com a exportação dos produtos industriais mais cara, a China terá que crescer produzindo outra coisa. Terá que se afastar de uma estratégia em que a indústria é o motor de crescimento para um modelo de uma economia mais madura, na qual o emprego está cada vez mais concentrado no sector dos serviços.

A China nunca poderá rivalizar com a Índia como exportador de serviços tecnológicos e empresariais, porque carece de uma larga parte da população fluente em inglês como acontece na Índia. Mas a China tem uma ampla margem para aumentar a prestação de serviços pessoais e empresariais a um mercado doméstico desesperadamente carente destes serviços e cada vez mais próspero. Esta é a tese defendida pelo economista-chefe do Morgan Stanley, Stephen Roach, no seu mais recente livro, The Next Asia.

As boas notícias, sublinha Roach, é que o sector dos serviços pressupõe uma carga menor sobre os recursos naturais e cria mais emprego do que a indústria. A primeira boa notícia é boa para a pegada de carbono do país, a segunda para a estabilidade social.

Mas a má notícia é que transição que agora é pedida à China – mudar para o sector dos serviços sem experimentar uma queda significativa do crescimento da produtividade – não tem na Ásia. Todas as economias asiáticas com elevadas taxas de crescimento e grande intensidade que o tentaram sofreram um forte abrandamento.

O problema não se limita a uma simples tendência da produtividade crescer mais devagar nos serviços do que na indústria. O crescimento da produtividade do sector dos serviços em economias que antes era fortemente dependente da indústria tem sido decepcionante segundo os padrões internacionais.

Tanto na Coreia como no Japão, para citar dois exemplos importantes, o problema não é simplesmente o facto da produtividade nos serviços ter crescido apenas um quarto da produtividade da indústria ao longo de uma década. É que o crescimento da produtividade no sector dos serviços tem sido metade do dos Estados Unidos.

O que explica esta situação? Em países tradicionalmente dominados pela indústria, o sector dos serviços é pouco desenvolvido e dominado por pequenas empresas: empresas familiares. A estas empresas falta escala para serem eficientes, a capacidade de explorar informação tecnológica moderna e capacidade de investir em pesquisa e desenvolvimento. Na Coreia do Sul, menos de 10% da pesquisa e desenvolvimento dos últimos dez anos tem sido dirigida para o sector dos serviços. Isto contrasta com os Estados Unidos, onde metade de toda a pesquisa e desenvolvimento está associada aos serviços. Não é preciso dizer mais nada.

Tanto na Coreia como no Japão, a entrada de grandes empresas no sector dos serviços é travada por regulação restritiva, na qual os pequenos produtores são um “lobby” importante.

A regulação impede que os grossistas expandam a sua actividade para o retalho, ou vice-versa.
As empresas estrangeiras portadoras de tecnologias e conhecimentos organizadores inovadores estão impedidas de entrar. Contabilistas, arquitectos, advogados e engenheiros recorrem a requisitos de licenciamento restritivos para limitar a oferta, a concorrência e entrada estrangeira.

Podemos imaginar perfeitamente os merceeiros, os donos dos talhos e os trabalhadores dos cuidados de saúde chineses a seguir este exemplo, os resultados seriam devastadores. Enquanto o valor da indústria chinesa tem crescido em 8% ao ano, a produtividade do sector dos serviços não deverá exceder 1% se a China não tiver a sorte de seguir o exemplo da Coreia ou do Japão.

Empregar trabalhadores em sectores onde a sua produtividade está estagnada não seria uma boa solução para a estabilidade social. A China precisa de evitar o antigo modelo que negligenciou o sector dos serviços e criou uma classe de negociantes instalados que os meios políticos para manter a sua posição. Talvez a China consiga evitar este destino. Pelo menos neste caso, não ser uma democracia pode ser uma vantagem menos sombria.


Barry Eichengreen é professor de Economia e Ciência Politica na Universidade da Califórnia, Berkeley.



Direitos de Autor: Project Syndicate, 2010.
www.project-syndicate.org

For a podcast of this commentary in English, please use this link:
http://media.blubrry.com/ps/media.libsyn.com/media/ps/eichengreen18.mp3






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