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01 de Outubro de 2010 às 11:13

Uma expansão da produtividade à espera?

Uma década perdida é algo bem mais sinistro do que uma recessão dupla.

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Nos Estados Unidos, existe uma preocupação crescente de que a pior recessão desde a Grande Depressão tenha danificado a capacidade da economia crescer.

De facto, há boas razões para acreditar que os Estados Unidos e outros países desenvolvidos vão viver um longo período de fraco crescimento. Afectados pela crise, os bancos apertaram os seus padrões de crédito e vão passar a estar sujeitos a exigências de capital e liquidez. Em consequência, o crédito bancário vai ser mais difícil de obter.

Uma oferta mais limitada de crédito bancário vai significar custos de capital mais elevados. As pequenas e médias empresas – a mais importante fonte de inovação e crescimento do emprego – vão sentir os efeitos de forma mais dura.

Os Governos, pelo seu lado, vão sair da crise mais endividados, o que implica impostos mais elevados no futuro, menos investimento e, consequentemente, taxas de crescimento mais lentas.

Outra preocupação é que esta crise crie um núcleo duro de desempregado cujas capacidades atrofiem e se tornem estigmatizados aos olhos dos potenciais empregadores. A subida do desemprego estrutural vai reduzir os “inputs” laborais e a eficiência. É difícil crescer quando os trabalhadores do sector da construção e os gestores de “hedge-fund” têm que aprender a trabalhar como soldadores ou enfermeiros. Esta incompatibilidade entre as capacidades oferecidas e as solicitadas representa um sério obstáculo ao crescimento do emprego.

Todos estes efeitos também foram evidentes durante a Grande Depressão. Nos Estados Unidos, entre 1933, o ponto mais baixo da Depressão e 1937, o pico subsequente do ciclo económico, registou-se um crescimento zero do crédito bancário. O investimento sofreu. Os “stocks” de equipamento e estruturas eram mais baixos em 1941 do que em 1929.

Da mesma forma, os problemas de incompatibilidade foram o obstáculo à transferência de recursos dos sectores em queda para os sectores em expansão. No Reino Unido, onde existia um elevado nível de desemprego entre os mineiros de carvão, a expansão das indústrias de veículos motorizados e de engenharia foi prejudicada por uma escassez de mecânicos qualificados. Em todo o lado, acentuou-se o desemprego de longo prazo.

As capacidades foram-se perdendo e o núcleo duro de desempregados foi estigmatizado e desmoralizado. Um influente estudo de 1933 da cidade austríaca de Marienthal, realizado pelo sociólogo Paul Lazarsfeld, descreveu, em detalhe, este panorama sombrio. George Orwell descreveu-o graficamente no The Road to Wigan Pier.

O resultado foi uma decepcionante recuperação do emprego. Nos Estados Unidos, o desemprego continuava a ser de 14% em 1937, após quatro anos inteiros de recuperação e em 1940 na véspera do país entrar na II Guerra Mundial.

Mas existe o outro lado da moeda. A produção cresceu de forma robusta após 1933. Entre 1933 e 1937, a economia norte-americana cresceu 8% ao ano. Entre 1938 e 1941, o crescimento médio superou os 10%.

O rápido crescimento da produção sem o igual crescimento do “stock” de capital e do emprego provocou um rápido crescimento da produtividade. Este é o paradoxo dos anos 30. Apesar de ter sido um período de elevado desemprego, de falências e de dificuldades económicas, os anos 30 registaram o mais rápido crescimento da produtividade de qualquer década da história dos Estados Unidos.

Como é que isto aconteceu? Como mostrou o economista Alexander Field, muitas empresas aproveitaram o “período de paralisação do trabalho”, criado pela fraca procura dos seus produtos, para reorganizar as suas operações. Empresas que antes usavam uma única fonte de energia centralizada instalaram motores eléctricos mais pequenos e flexíveis. Os caminhos-de-ferro reorganizaram as suas operações para usarem o “stock” de material e mão-de-obra de forma mais eficiente. Cada vez mais empresas estabelecerem departamentos modernos de gestão de pessoal e laboratórios de investigação internos.

Hoje existem empresas que estão a responder da mesma forma. A General Motors, perante uma crise existencial, tentou transformar o seu modelo de negócio. As companhias aéreas norte-americanas aproveitaram a queda na procura dos seus serviços para reorganizar o equipamento e o pessoal, tal como as companhias-de-ferro nos anos 30. As empresas do sector industrial estão a adoptar novas tecnologias de informação – analogia actual dos pequenos motores eléctricos – para optimizar as cadeias de oferta e os sistemas de gestão de qualidade.

Assim, mesmo que existam boas razões para esperar um período de fraco crescimento do investimento e do emprego, este não tem que significar um abrandamento da produtividade e do crescimento do produto interno bruto (PIB).

Mas esta resposta positiva da produtividade não é garantida. Os decisores políticos devem encorajá-la. As empresas pequenas e inovadoras necessitam de ter um melhor acesso ao crédito. As empresas precisam de incentivos fiscais mais fortes para investigação e desenvolvimento. O crescimento da produtividade pode ser impulsionado pelo investimento público em infra-estruturas, como aconteceu nos 30 com a Barragem Hoover e da Autoridade do Tennessee Valley.

O crescimento da produtividade torna muitas coisas possíveis. Torna mais fácil eliminar défices orçamentais e torna possível aumentar os gastos em educação e financiar programas de preparação para os desempregados de longa data. Mas mesmo, que nas actuais circunstâncias, seja possível um rápido crescimento da produtividade, este não pode ser dado como certo. Os decisores políticos precisam de agir.


Barry Eichengreen é professor de Economia e Ciência Política na Universidade da Califórnia, Berkeley.

Direitos de Autor: Project Syndicate, 2010.
www.project-syndicate.org

For a podcast of this commentary in English, please use this link:
http://media.blubrry.com/ps/media.libsyn.com/media/ps/eichengreen22.mp3






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