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[213.] CGD, Cytothera, OJE

A campanha da Caixa Geral de Depósitos na imprensa com Luís Filipe Scolari tem um pormenor tão importante que quase lhe chamaria fundamental: ele não está a olhar para o interlocutor na loja, seja a florista, seja o livreiro. A falha é tão estranha que nã

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A situação criada pelos publicitários implicaria um olhar franco directo nos olhos do interlocutor e ele não existe. Na livraria, Scolari olha nitidamente para a esquerda do empregado (na Bertrand do Chiado?), e percebe-se que o empregado também não está olhando para ele. E o mesmo na florista: o olhar de Scolari está obviamente desviado em relação ao da vendedora. Será possível que se tenha fotografado situações separadas e depois reunido digitalmente? Qual a ideia? Porque existe esse contacto no spot televisivo e não na imprensa? O resultado é negativo e compromete a campanha.

Por falar em “conhecidos”: o jornalista João Adelino Faria arriscou o seu estatuto de “conhecido” da TV adquirido na SIC Notícias entregando-se à invisibilidade da rádio. Mas a publicidade do Rádio Clube em jornais revistas, etc. devolve ao espaço público a cara que a rádio tirou: a maioria dos anúncios centra-se no jornalista, usando a sua notoriedade e mostrando a sua fotografia. É um paradoxo interessante: J.A. Faria sai dum media da imagem para um media só do som mas a publicidade coloca a sua imagem em mais media do que o que inicialmente lhe deu a notoriedade.

E ainda por falar em “conhecidos”: o bebé Olavo será um dia músico, talvez Bilac; o bebé Paulo será um dia treinador de futebol, talvez Bento; o bebé Rodrigo será um dia jornalista, talvez Guedes, quiçá de Carvalho; o bebé José será um dia secretário-geral, talvez Sócrates, quem sabe se Pinto de Sousa. Os anúncios  da Cytothera sobre a “criopreservação das células estaminais”, aproveitam-se dos “conhecidos” mostrando bebés em vez deles e sem sequer os referirem, mas o observador infere a relação com os “conhecidos” que citei. O anúncio apenas diz, por exemplo, “Rodrigo. Jornalista. As grandes decisões tomam-se muito cedo!”  Esta campanha consegue, pois, uma proeza realmente criativa. Ainda por cima simples: um verdadeiro ovo de Cristóvão, navegador.

E ainda por falar em mais “conhecidos”: o jornal OJE, concorrente do Jornal de Negócios, reuniu num só anúncio 18 “conhecidos”. Enfim, julgo que as 18 pessoas são todas “conhecidas”, mas não reconheço todas, porque se trata de caricaturas e algumas apresentam uma deformação superior à minha capacidade de reconhecimento de “conhecidos”. Ao centro está Marcelo Rebelo de Sousa, com o jornal aberto e em seu redor estão os outros 17, entre os quais empresários, políticos, jornalistas e homens do negócio do futebol, como Luís Figo e, julgo reconhecê-lo, José Mourinho. A frase “O jornal de economia mais lido em Portugal” aparece duas vezes e corrobora ou é corroborada pela multidão de gente famosa e de gente anónima (atrás, no escuro, como compete aos “desconhecidos”), lendo o mesmo exemplar do periódico. Nada tenho contra o simpático concorrente deste jornal em que escrevo, e, assim, espero que os observadores deste anúncio de intenção cómica não julguem o rigor das notícias do OJE pelo rigor das caricaturas.

Tal como a Cythotera, o OJE recorre a “conhecidos” sem os mostrar em carne e osso, o que, afinal, não é muito diferente do que fez a CGD com um Scolari de carne e osso mas que parece enxertado digitalmente nos locais. Nestas três campanhas os “conhecidos” passaram do mundo real ao mundo simbólico, não são pessoas, já quase nem são imagens, são meros simulacros que o observador deve reconstituir na sua imaginação.

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