Opinião
Notas da semana de Marques Mendes
As notas da semana de Marques Mendes nos seus comentários na SIC. O O ex-ministro e antigo líder do PSD faz uma avaliação aos dois anos do governo da geringonça, começando pelos ministros e terminando em António Costa. A liderança do PSD e a polémica do Infarmed também estão em foco.
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2 ANOS DE GOVERNO
- Evocação de dois anos – Esta evocação de dois anos de governo acontece no pior momento da vida do Governo e, sobretudo, num período de uma grande contradição:
- Por um lado, o Governo está em alta nas sondagens e tem a economia em alta;
- Por outro lado, politicamente está a viver um tempo como nunca viveu: à deriva, fragilizado, descoordenado, parecendo um governo esgotado e de mera gestão.
- Cerimónia de Evocação de 2 Anos: foi um acto de propaganda. Atá aí tudo normal. Os governos costumam fazê-lo. Acho é que representa um acto de propaganda sem qualquer eficácia:
a) Primeiro: as perguntas são demasiado genéricas para suscitarem emoção. Se fossem especialistas a perguntar, outro galo cantaria!
b) Segundo: é tudo muito longo, o que torna a cerimónia uma maçada.
c) Terceiro: soa a publicidade. E o que soa a publicidade não é eficaz em política.
- O Governo – em dificuldades – pensa que o seu problema é de comunicação. Logo, que se resolve comunicando mais e melhor. Engana-se. O seu problema é político. Só se resolve com política. Com coordenação política, com iniciativa política, com decisão política. E isso é que falta.
AVALIAÇÃO DO GOVERNO
Os Melhores Ministros
- Mário Centeno – Apesar da ajuda da economia europeia, tem inequívocos resultados a apresentar.
- Santos Silva – O pensamento político mais sólido do Governo.
- Vieira da Silva – Um peso pesado que é referência de solidez e dredibilidade.
- Maria Manuel Leitão Marques – Uma Ministra discreta mas eficiente.
- Matos Fernandes – Uma boa surpresa. Politicamente inteligente e reformador.
- Adalberto Campos Fernandes – Concilia conhecimento técnico com visão política. Apesar da precipitação do Infarmed.
- Pedro Marques – Outro Ministro que surpreendeu pelo pragmatismo e pela eficácia.
Ministros que Satisfazem
- Francisca van Dunen – Uma Ministra competente mas aquém das expectativas na acção e nos resultados.
- Capoulas Santos – Se a reforma florestal resultar, passará a ser um dos bons ministros. Para já é só papel.
- Ana Paula Vitorino – Uma boa técnica que tarda em assumir uma acção marcante.
- Manuel Heitor – Outro Ministro competente mas demasiado discreto.
- Caldeira Cabral – É excelente pessoa e a economia tem resultados. Mas precisava-se de mais dinâmica e peso político.
- Eduardo Cabrita – Como Ministro Adjunto foi demasiado apagado. Como MAI pode vir a ser um óptimo Ministro.
- Azeredo Lopes – Nesta qualificação é manifestamente o Ministro que mais está na corda bamba. Não é o responsável por Tancos mas o fantasma de Tancos não o larga.
Ministros que Não Satisfazem
- Castro Mendes – Tem sido um Ministro relativamente irrelevante.
- Tiago Brandão Rodrigues – Um erro de casting. No Ministério ou manda Mário Nogueira ou manda a Secretária de Estado Alexandra Leitão.
Mais Que Ministro
- Pedro Nuno Santos – Um Secretário de Estado que já devia ser Ministro. É, na prática, o Ministro dos Assuntos Parlamentares e o principal responsável pelo bom funcionamento da geringonça. O único Secretário de Estado que se destaca e um Secretário de Estado que tem influência que a maioria parte dos Ministros.
O Líder
- António Costa
– Num Governo que é o mais unipessoal de todos os que tivemos até hoje, o PM é o abono de família do Governo. Se o PM age bem, o Governo funciona bem. se o PM age mal, o Governo funciona mal.
– Na acção do PM, há nestes 2 anos duas fases: o antes de Pedrógão e o depois de Pedrógão. Antes, sempre em alta; depois, com altos e baixos. Ultimamente com demasiadas fragilidades.
– Mas está a fazer história. Na estabilidade política e no crescimento económico. E se chegar ao fim da legislatura é o candidato mais sério a ganhar as eleições de 2019.
AVALIAÇÃO DO GOVERNO
Pontos Positivos
- Estabilidade política e paz social – Uma mais-valia.
- Reforço do sistema financeiro – Uma acção certeira.
- Crescimento económico – Um marco importante, apesar da ajuda europeia.
- Saída da lista negra dos défices excessivos – Um momento histórico.
- Devolução de rendimentos – Uma medida justa, apesar do calendário arriscado.
Pontos Negativos
- Ausência de medidas de fundo – É um governo sem instinto reformador.
- Falta visão de futuro – É chapa ganha, chapa gasta.
- Fraca redução do défice e da dívida – É a maior oportunidade desperdiçada.
- O drama dos incêndios – Símbolo de irresponsabilidade.
- O puxão de orelhas de Marcelo – O pior momento na vida do Governo.
Em conclusão:
- Um Governo que, na estabilidade e na economia, suplantou as expectativas; na visão política, desilude – não reforma nem prepara o futuro; e, nas causas, começa a dar a sensação de que está esgotado.
DESAFIOS DE ANTÓNIO COSTA
- Primeiro desafio: levar a legislatura até ao fim.
- Se levar o mandato até ao fim, será sempre um vencedor. Fará história e apresentar-se-á como garante da estabilidade.
- Se não chegar ao fim, terá sempre de lidar com o efeito derrota. Significa que a geringonça falhou e ele foi o seu ideólogo.
- Segundo desafio: ter a economia em alta e o desemprego em baixa, de forma sustentável.
- Conseguir este objectivo pode ser duplamente importante: em termos nacionais, porque esta será a legislatura com o maior crescimento do século; depois, porque em termos eleitorais as pessoas votam sobretudo com a carteira e com o dinheiro que têm no bolso.
- Terceiro desafio: saber lidar com os seus parceiros e com os seus adversários.
- Relação com parceiros: a geringonça, tal como a conhecemos, acabou. O PS estará cada vez mais sozinho e cada vez menos acompanhado. PCP e BE serão cada vez mais oposição e menos solidários com o Governo. Tudo isto vai criar problemas ao PS. Gerir esta nova etapa sem impasses é o grande desafio de Costa.
- Relação com adversários: o PSD vai ter um novo líder. E o PM vai querer dialogar com ele. Se conseguir, isso será uma grande vitória para o PM. Apresentar-se-á ao eleitorado com um trunfo imbatível – o líder que consegue dialogar com todos, à esquerda e à direita.
- Último desafio: obter uma maioria absoluta.
- Este é o desafio mais desejado, mais difícil de alcançar e o que vai ter, desde já, consequências nefastas para o país.
- É que o Governo vai entrar desde já em modo de campanha eleitoral. Eu receio que vamos ter 2 anos (2018 e 2019) de campanha eleitoral permanente. A campanha começou hoje.
- Um desastre para o país – É que em modo de campanha eleitoral tomam-se medidas que não se devem tomar e não se tomam aquelas que se devem tomar.
- Conclusão: corre o risco de nem governar nem vir a ter a maioria absoluta.
A LIDERANÇA DO PSD
- Primeiro apontamento: esta é uma campanha que não entusiasma ninguém. Primeiro, porque é uma campanha demasiado virada para dentro; depois, porque é uma campanha excessivamente burocrática. Falta política. Faltam temas políticos e debate político mobilizador.
- Segundo apontamento: há uma falha de ambos os candidatos. É na política. Um e outro estão a fugir ao confronto com António Costa. Um e outro estão a fugir a apresentar as suas diferenças políticas em relação ao PS e ao Governo. Um e outro estão a fugir a explicar a sua estratégia política, programática e eleitoral. E isto é uma falha enorme:
- O líder do PSD é candidato a PM, logo, deve falar para o país.
- Terceiro apontamento: apesar de continuar a ser uma disputa muito equilibrada, pressentem-se duas tendências – Pedro Santana Lopes parece ter uma ligeira vantagem no aparelho partidário; Rui Rio, ao contrário, parece levar algum avanço no chamado voto livre dos militantes.
- Último apontamento: debates entre os candidatos. Estamos a mês e meio da eleição e não há nenhum debate marcado. Isto não é compreensível. No início, Santana Lopes exagerou ao sugerir a ideia de 20 debates. Agora Rui Rio exagera ao não dar abertura para um ou dois debates. Nunca se verificou uma eleição interna sem, pelo menos, um debate público.
A POLÉMICA DO INFARMED
- Sou um grande defensor da descentralização e da desconcentração dos serviços. E já disse mesmo que o Estado se devia obrigar a, quando cria um novo serviço, instalá-lo obrigatoriamente fora de Lisboa.
- Posto isto, acho esta decisão um completo disparate.
a) Primeiro, porque isto não é um plano estruturado de descentralização. Nem sequer um prémio de consolação para o Norte. Isto é uma medida pontual e desgarrada destinada apenas a evitar que se discutisse a derrota que Portugal teve em Bruxelas com a Agência do Medicamento. Isto é politiquice barata.
b) Segundo, porque esta é uma decisão tomada em cima do joelho. A prova é que o Governo decidiu e só agora é que vai estudar. Tudo ao contrário do que deve ser. Normalmente estuda-se primeiro e decide-se a seguir. Parece uma brincadeira de crianças.
c) Terceiro, porque esta é uma transferência de fachada. Para o Norte vai a sede, a placa e a Direcção do Infarmed. Em Lisboa fica tudo o resto. Conclusão: há um desmembramento do Infarmed que só é prejudicial. E o Porto, na prática, não ganha nada. Só me surpreende que o Porto ainda agradeça esta fantochada.
d) Quarto: decidir sem ouvir ninguém, designadamente os trabalhadores, é de muito mau gosto. Ainda por cima, vindo de um Governo de esquerda. Não é que os trabalhadores devem ser o único ou principal critério de decisão. Mas num serviço altamente sofisticado como o Infarmed, isto pode ser um convite à perda de trabalhadores altamente qualificados ou à sua desestabilização, o que é péssimo para o interesse público.
- Mas este caso tem ainda uma leitura política.
- Desde 15 de Outubro (dia da última tragédia dos incêndios), todas as semanas temos um caso a "manchar" a imagem do Governo.
- Foi o desastre dos incêndios; foi a remodelação em circuito fechado; foi o caso da legionella; foi o episódio do Panteão; foi a questão dos professores; é agora o Infarmed. E o mais que virá a seguir.
- O governo está meio à deriva e o PM a perder o pé.