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Governo demite-se se lei dos professores for aprovada

O primeiro-ministro anunciou ao país que se a contagem integral do tempo de serviço dos professores for aprovada o Governo demite-se. António Costa responsabiliza direita de "incoerência" e retira o ónus de uma eventual demissão dos parceiros da esquerda.

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03 de Maio de 2019 às 17:26
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António Costa não deixou margem para dúvidas: se no próximo dia 15 de maio for aprovada em plenário a recuperação integral do período em que os professores tiveram as suas respetivas carreiras congeladas, o Governo apresenta a demissão.

Passavam poucos minutos das 17:00 quando o primeiro-ministro surgiu, em São Bento, para anunciar já ter comunicado aos presidentes da República e da Assembleia da República que a aprovação final da medida ontem aprovada na especialidade por PSD, CDS, Bloco e PCP "forçará o Governo a apresentar a sua demissão". 

"A aprovação final global desta iniciativa constitui uma rutura irreparável com o compromisso de equilíbrio entre a recuperação de rendimento e direitos e a consolidação das contas públicas e compromete a credibilidade internacional de Portugal", justificou o secretário-geral do PS para quem aquela medida "condiciona de forma inadmissível a governação futura".

Para António Costa tal condicionamento é uma prerrogativa que deve caber aos eleitores e não aos partidos, desde logo porque "nem no programa do Governo, nem no programa eleitoral de qualquer partido" estava previsto que o descongelamento das carreiras fosse acompanhado da "recuperação do tempo entretanto decorrido".

No final da intervenção e já na resposta a uma das quatro questões colocadas pelos jornalistas presentes, o primeiro-ministro salvaguardou a posição dos parceiros de esquerda da atual maioria parlamentar e responsabilizou a direita de "incoerência". "Se há alguém incoerente e que mostrou total desrespeito pelo princípio da responsabilidade orçamental (...) foram seguramente os outros dois partidos [PSD e CDS] que se juntaram ao PCP e ao Bloco". 

Mesmo assim, António Costa não deixou de acusar os quatro partidos (PSD, CDS, BE e PCP) que constituíram a maioria negativa para aprovar a legislação dos professores de eleitoralismo e despesismo. Costa defendeu que "os portugueses seguramente não percebem" como é que aquelas forças se entenderam para aprovar uma medida que não tinham proposto e que tem um "encargo e efeito permanente de 800 milhões de euros".


Como tal e a bem da prossecução de uma política orçamental equilibrada, António Costa proclamou que o Governo não poderia "compactuar" que, quando a legislatura se aproxima do fim, "estraguemos agora tudo o que tanto trabalho deu" e que foi possível "reconstruir ao longo destes anos". 

Antes havia rejeitado estar a fazer chantagem, acrescentando que seria "porventura fácil hoje apresentar a demissão". Porém, o Executivo socialista optou por anunciar, com as devidas "formalidades", "as consequências que terá a aprovação" da contagem integral do tempo de serviço dos professores "e as consequências que o Governo retirará".

Governo coloca futuro nas mãos dos partidos

A declaração do primeiro-ministro ao país deixa o futuro do Executivo à mercê dos partidos. A votação final global do projeto de lei dos professores só acontece a 15 de maio (última sessão parlamentar antes de uma pequena pausa para as eleições europeias), pelo que até lá decorrerão certamente conversações várias, mesmo que discretas. Para já, sabe o Negócios, o Presidente não prevê chamar os partidos a Belém, pelo menos até à votação da medida no Parlamento, deixando campo aberto a que sejam os partidos a dirimir as respetivas divergências. 

Se se concretizar a demissão do Governo, António Costa apostará na responsabilização dos restantes partidos, em particular do PSD, pelo despesismo e eleitoralismo, e na afirmação do PS como o partido da estabilidade e das contas certas. Por outro lado, a quebra de confiança no seio da geringonça, também com fissuras em temas como a Lei de Bases da Saúde ou a nova lei laboral, pode reforçar um discurso do PS contra a irresponsabilidade da esquerda parlamentar.

Carlos César, presidente do PS, já avisou esta sexta-feira que se o Bloco e o PCP não tiverem "sentido de responsabilidade" será muito difícil reeditar os acordos que permitiram constituir a atual maioria de esquerda.

Do lado dos parceiros, o PCP foi o primeiro a reagir com o secretário-geral Jerónimo de Sousa a garantir que a posição dos comunistas mantém-se e a acusar o Governo de fazer uma "pressão inaceitável". Na mesma linha, a coordenadora bloquista, Catarina Martins, criticou o Executivo socialista por fazer um "ultimato" que provoca uma "instabilidade política dispensável"

Por sua vez, Assunção Cristas, presidente do CDS, disse já ter pedido uma audiência a Marcelo para avaliar a crise política, considerando que se o Governo já não dispõe de apoio maioritário no Parlamento, "então não tem como governar". Já o presidente do PSD, Rui Rio, não vai reagir esta sexta-feira ao anúncio feito pelo primeiro-ministro. Pela direção do PSD falou o vice-presidente David Justino, que em declarações ao Público disse apenas que se os socialistas apresentarem uma "proposta que permita resolver o problema das pessoas", os sociais-democratas estarão disponíveis para ouvir. 

Caso se verifique um cenário de demissão, e consequentes eleições, Costa e o PS podem beneficiar deste tema, capturando votos ao centro-direita junto dos eleitores mais moderados. Em setembro, uma sondagem publicada pelo Expresso revelava que 69% dos portugueses estavam contra as exigências feitas pelos professores.

Costa enuncia cinco razões para não aceitar legislação dos professores

O início do discurso do primeiro-ministro foi pautado pela descrição da política de recuperação de direitos e rendimentos promovida pelo Executivo, sempre tendo em conta "não só a compatibilidade com a disponibilidade orçamental e o crescimento económico do presente como também a sua sustentabilidade futura de modo a garantir que nenhum passo seria maior do que a perna".

Circunstância que seria posta em causa pela adoção da legislação aprovada sobre os professores, defendeu Costa elencando cinco razôes: criaria encargo adicional de pelo menos mais 340 milhões de euros este ano e no próximo devido ao pagamento de retroativos; orçamento retificativo para acomodar aplicação da lei ao ano de 2019; extensão do diploma aos demais corpos especiais, o que representaria um acréscimo da despesa certa e permanente de 800 milhões de euros em cada ano; colocaria em situação de desigualdade os demais funcionários públicos como já declararam as duas centrais sindicais; a acomodação dos encargos desta medida obrigariam a inevitáveis cortes no investimento público ou aumento de impostos. 

Fechando o círculo da estratégia de dramatização, o líder socialista frisou que pôr em causa a capacidade de reforço do investimento público seria dramático num país com as atuais dificuldades verificadas no Serviço Nacional de Saúde. 

 

(Notícia atualizada pela última vez às 20:10 com reações dos partidos ao anúncio do primeiro-ministro)
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