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Terá morrido a esperança de o partido republicano vencer Trump?

Os resultados da Super Terça-feira deixaram o aparelho do Partido Republicano ainda mais longe de conseguir controlar o resultado das suas eleições primárias. Se perceber que o estão a matar, avançará para o suicídio?

Bloomberg
02 de Março de 2016 às 19:45
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A morte pode chegar sem o morto dar conta? A "onda Trump" que varreu ontem as primárias republicanas – e os maus resultados de Marco Rubio - pode ter assinado a certidão de óbito do aparelho republicano nas primárias de 2016. Será o partido obrigado a escolher entre "levar um tiro ou ser envenenado"?

 

Candidatos anti-sistema não são propriamente uma novidade na política norte-americana (de certa forma, até Obama se assumia como um "outsider"). Ainda assim, nos últimos anos, movimentos como o Tea Party, entretanto assimilado pelo Partido Republicano (GOP), ou o Occupy Wall Street aumentaram o tom e a abrangência deste tipo de discurso. A chegada fulgurante de Donald Trump à cena política, conquistando primária atrás de primária é o culminar desta tendência que, argumentam alguns, está a ameaçar a própria existência do GOP tal como o conhecemos.

 

A Super Terça-feira ("Super Tuesday") trouxe um óptimo resultado eleitoral para Trump, que venceu sete estados. Porém, talvez mais relevante, deu uma nova machada no GOP. Marco Rubio, o candidato em torno do qual o aparelho se uniu desde a desistência de Jeb Bush, ganhou ontem apenas um estado (Minnesota), a sua única vitória até agora nestas primárias.

 

Este resultado surge depois de uma semana em que Rubio decidiu tentar bater Trump no seu próprio jogo, fazendo ataques pessoais e gozando até com a aparência física do milionário (tem a pele laranja, tem dedos pequenos, etc…). O problema é que, ao contrário de Trump, tem pouco para mostrar em termos de resultados eleitorais. Uma trajectória de derrota que o Partido Republicano parece impotente para travar.

 

"O aparelho do Partido Republicano está a juntar-se em torno do senador da Florida, Marco Rubio. Mesmo a tempo para provar que o aparelho já não é relevante", escreve Bill Schneider, da Reuters.

 

Para Mike Leavitt, antigo governador do Utah, "existe uma falácia de que um pequeno grupo se pode juntar e decidir o resultado disto", refere ao Washington Post. "Isso não existe. Isto é um mercado de ideias políticas. O partido é responsável pela sua estrutura, mas não pode ditar o seu resultado."

 

Na realidade, existem dois aparelhos republicanos, explica Schneider. Um cristalizado nos corredores de Washington e Wall Street, outro que serve como uma espécie de contra-aparelho conservador. Nos últimos 30 anos, este segundo grupo foi ganhando cada vez mais poder, um processo que culminou com a emergência do Tea Party nas eleições intercalares de 2010, quando um grupo de candidatos mais radicais arrasou muitos representantes mais moderados do Partido Republicano nas eleições para o Congresso. O que Trump está a fazer é algo semelhante, aplicado à eleição presidencial, mas ainda mais populista e afastado da linha ideológica central do partido.  

 

Para este ciclo eleitoral, o favorito do primeiro grupo era Jeb Bush. Inicialmente, foi o governador da Florida que recolheu a esmagadora maioria dos apoios, angariando também milhões de dólares em donativos. Humilhado por Trump e derrotado nas urnas, Bush desistiu da corrida, passando a "tocha do aparelho" para Marco Rubio. O segundo grupo mais conservador tinha em Ted Cruz, nascido da ala Tea Party, o seu campeão por um Governo o mais limitado possível e por valores evangélicos. Alguém disposto a mergulhar os EUA em default para boicotar a reforma de saúde de Obama. "Cruz é demasiado radical para o velho aparelho republicano. Ele acredita que ameaçar a paralisação do governo federal e o default da dívida pública é uma boa táctica negocial", nota Schneider. 

 

Tanto o aparelho – que tende a procurar o candidato mais forte para as eleições gerais – como os conservadores – que buscam alguma "pureza" ideológica estão a ser abafados por uma onda de eleitores que acredita nos slogans e na bravata de Donald Trump. Portanto, o GOP parece encurralado entre um populista que não partilha muitos dos seus valores e com baixas probabilidades de ser eleito em Novembro (Trump), um conservador extremista (Cruz) e um candidato que só ganhou um estado até agora (Rubio). "Numa escolha entre Trump e Cruz, muitos daqueles que fazem parte do aparelho teriam dificuldades dizer qual preferem", escreve Dan Balz, grande correspondente do Washington Post. O senador republicano, Lindsey Graham chegou a dizer que optar entre Cruz ou Trump é o mesmo que escolher entre "levar um tiro ou ser envenenado". 

 
É possível travar Trump?

O que pode ainda o aparelho republicano fazer para voltar a deter o controlo do processo? Muitos estão a contar que, depois de Cruz já ter ganho no Estado por onde é eleito (Texas), Kasich e Rubio façam o mesmo nos seus (Ohio e Florida). Todos eles são estados importantes, como muito delegados em disputa, e funcionam num esquema de "winner-takes-all" (quem fica em primeiro lugar ganha todos os delegados).

  

Isso poderia ser o suficiente para impedir que Trump acumule mais de metade dos delegados até à convenção republicana em Julho. Nesse cenário, poderíamos ter uma convenção "brokered". Isto é, depois de uma primeira votação, se ninguém tiver mais de 50% dos delegados, estes passam a ter liberdade de voto, o que dá lugar a um processo de negociações de bastidores, a que não se assiste desde 1948 no GOP. Outra possibilidade é todos os adversários de Trump desistirem e juntarem-se em torno de um só nome (Rubio ou Cruz, muito provavelmente).

 

Leavitt considera que esse cenário resulta apenas da esperança de alguns de que estas primárias acabem por ter um resultado igual a todas as outras que a antecederam. Pode não ser esse o caso. "Acho que aquilo que estamos a ver é uma mudança muito profunda no papel que os partidos desempenham na vida das pessoas", sublinhou segunda-feira à MSNBC. "Os partidos controlam o mecanismo, mas não controlam os resultados e as pessoas já não dependem dos partidos para se informarem". 

 

Se nada resultar, existe ainda a bomba atómica. Se o GOP achar que está a ser ferido de morte com a nomeação de Trump, pode preferir cometer suicídio: alguns já avançaram com a possibilidade de ser organizada uma candidatura "independente" para concorrer contra Trump e o nomeado democrata (Clinton ou Sanders) nas eleições gerais. Na prática, isso significaria provavelmente dar a vitória aos democratas. 

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