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Virgolino Faneca escreve sobre boçalidades e o A-380

Deu-se o infortúnio de Virgolino Faneca ter encontrado Palha, o qual sugeriu temas variados ao afamado epistoleiro. O resultado foi um autêntico desastre.

27 de Julho de 2018 às 17:00
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Sabes que isto de se ser um epistoleiro tem muito que se diga. Ou melhor, faz com que tenha sempre muita gente a sugerir, escreve isto, escreve aquilo, e as pessoas ficam zangadas quando as suas brilhantes observações não passam para o papel.

Ainda esta semana aconteceu isso. Vê lá que o teu namorado, o Palha, veio com esta conversa:


- Ó Virgolino, tinha piada escreveres sobre o encontro entre o Juncker e o Trump.

- A que propósito?

- Epá, podias sempre dizer que são os parceiros ideais para organizar festas. Um, o Juncker, leva a bebida, o outro, o Trump, leva as gajas.

- Palha, isso é um bocado boçal e até misógino.

- E depois, a malta gosta destes dichotes alarves.

- Olha que não, Palha, olha que não. Os meus leitores são pessoas ponderadas, admitem uma outra tentativa de piada subtil, mas exigem que faça a dissecação da actualidade com a perícia do João Miguel Tavares e/ou do José Manuel Fernandes, conforme as circunstâncias ou o tema. 

- Ó Virgolino, então escreve sobre o encontro dos 'motards' em Faro. Podes sempre dizer que aquilo tem lugar no Vale das Almas porque os espectáculos de striptease proporcionam momentos de ressurreição. 

- Palha, isso é ainda mais boçal e igualmente misógino.

- Estás armado em intelectual, é o que é. Tens uma mania muito grande e deves pensar que pessoas como eu não são dignas de ti. Olha, és um presunçoso, mas não consigo zangar-me derivado da nossa provecta amizade que já vem dos tempos da primária. Por isso, vou dar-te uma terceira sugestão, brilhante, que estava a guardar para quando fosse caçar pardais com o Miguel Sousa Tavares.

- Diz lá, então.

- Queres mesmo ouvir?

- Claro, claro.

- Atão é assim.

- Não é atão, é então.

- Lá estás tu com peneiras. Que sabes falar, pronuncias as palavras todas certinhas e os outros são uns parolos.

- Desculpa.

- Tá bem, eu desculpo. Atão é assim. E não me interrompas…

- Combinado (e em surdina, não é tá, é está).

- Disseste alguma coisa?

- Não, não, continua.

- Atão é assim. Tás a ver aquela cena do A-380 que aterrou em Beja e meteu a malta num virote porque aquilo é um pássaro muito grande e foi a primeira vez que veio a Portugal. Isso é material top. Dá sempre para escreveres que o aeroporto de Beja, afinal, é do cacete, e que as companhias a sério só não vão para lá porque têm bué de preconceito contra os alentejanos. E, se quiseres fazer uma comparação que as pessoas entendam, podes acrescentar que o avião é tão grande que cabiam lá dentro as festas do Juncker e do Trump e dos 'motards', juntas, e ainda sobrava espaço para o acampamento do Bloco de Esquerda.

- Isso é uma excelente sugestão.

- Tás a falar a sério.

- Claro. Já me viste alguma vez fazer troça de ti?

- Por acaso, já. Houve uma vez, quando aceitei uma boleia da Bárbara Guimarães que perguntaste se ia andar de carrinhos de choque. Só dei pelo gozo quando cheguei a casa com o braço esquerdo engessado.

- Isso são águas passadas. Vou pegar na dica do A-380 e fazê-la voar pelas asas da minha imaginação.

- Ó Virgolino, com essa prosápia, vê-se que tás mesmo a precisar de férias.

- Acertaste em cheio, Palha. O melhor é passares a ideia do A-380 ao Sousa Tavares, que eu vou a banhos para o lago salgado que descobriram em Marte.

 

Mizé, o que te peço, atendendo às circunstâncias, é que metas um pouco de senso no Palha. Será possível? Um beijo deste que te estima,

 

Virgolino Faneca

 

PS: Mizé e Palha são duas personagens do livro "Mizé - Antes galdéria que normal e remediada", escrito por Ricardo Adolfo. Se por acaso ainda não o leu, faça o obséquio. Vai ver que vale mesmo a pena.


Virgolino Faneca é filho de peixeiro (Faneca é alcunha e não apelido) e de uma mulher apaixonada pelos segredos da semiótica textual. Tem 48 anos e é licenciado em Filologia pela Universidade de Paris, pequena localidade no Texas, onde Wim Wenders filmou. É um "vasco pulidiano" assumido e baseia as suas análises no azedo sofisma: se é bom, não existe ou nunca deveria ter existido. Dele disse, embora sem o ler, Pacheco Pereira: "É dotado de um pensamento estruturante e uma só opinião sua vale mais do que a obra completa de Nuno Rogeiro". É presença constante nos "Prós e Contras" da RTP1. Fica na última fila para lhe ser mais fácil ir à rua fumar e meditar. Sobre o quê? Boa pergunta, a que nem o próprio sabe responder. Só sabe que os seus escritos vão mudar a política em Portugal. Provavelmente para o rés-do-chão esquerdo, onde vive a menina Clotilde, a sua grande paixão. O seu propósito é informar epistolarmente familiares, amigos, emigrantes, imigrantes, desconhecidos e extraterrestres, do que se passa em Portugal e no mundo. Coisa pouca, portanto.

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