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15 de Setembro de 2011 às 11:37

TSU requer solução política ao nível europeu

Ontem em Washington o representante do FMI na Troika defendeu uma descida de mais de 8 pontos percentuais da TSU em Portugal.

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Ontem em Washington o representante do FMI na Troika defendeu uma descida de mais de 8 pontos percentuais da TSU em Portugal. Concordo com o argumento de que a descida da TSU tem de ser forte para ter impacto nas decisões e na competitividade das empresas. No entanto, se realizada da forma como Paul Thomsen defendeu, isto é, de forma generalizada em todos os sectores, tal conduziria a uma perda de receita de 3,4 mil milhões de euros, o que obrigaria a um aumento generalizado das taxas mais baixas de IVA.

Isso teria efeitos sociais negativos, uma vez que não seria possível conseguir este aumento sem aumentar a taxa de todos ou pelo menos de muitos dos bens de primeira necessidade que estão na taxa reduzida. Se a medida for tomada da forma proposta pela Troika, o aumento de receita de IVA a que obriga terá efeitos importantes quer no aumento da inflação, quer na redução de competitividade e emprego de alguns sectores, como o da restauração, em particular das empresas situadas nas regiões fronteiriças.

É por isso importante olhar para as alternativas. Uma das mais interessantes é a de restringir a diminuição da TSU aos sectores transaccionáveis. Esta, em minha opinião, e também na opinião das finanças - de acordo com o Documento de Estratégia Orçamental recentemente publicado, seria a forma mais interessante de implementar a medida. No entanto, esta opção não terá merecido acolhimento da Troika.

A Troika não ter aceite, no entanto, não deve ser visto como o fim do processo, mas antes, como uma posição que obriga a uma negociação mais difícil.

Sou dos que concordam que a desvalorização fiscal pode ser parte da solução para o problema de défice externo português. Isto acontece tanto por a redução da TSU contribuir para o aumento da competitividade e das exportações nos sectores transaccionáveis, como por o aumento do IVA reduzir o consumo e consequentemente contribuir para diminuir as importações.

O peso de cada uma destas duas componentes depende da forma como a medida for desenhada. Se a redução da TSU for focada nos sectores transaccionáveis é possível conseguir um forte estímulo ás exportações, sem um custo fiscal muito elevado, o que implica que, um aumento moderado da receita do IVA será suficiente para anular os efeitos orçamentais da medida. Nesta situação predomina o contributo do aumento das exportações, enquanto o efeito de redução do consumo será mais moderado. Esta parece-me a opção mais indicada num momento em que o consumo já esta a cair e o país esta em recessão.

Não é, no entanto, a solução preferida da Troika, que parece confiar mais no efeito de redução do consumo, acreditando que este é mais imediato, do que o efeito de aumento de competitividade e das exportações. Por outro lado, sendo esta missão liderada por funcionários, de alto nível, mas funcionários, é natural a predilecção por medidas que se enquadram de forma mais simples na legislação comunitária.

É obvio que a medida terá de ser enquadrada nas normas comunitárias e da organização mundial do comércio. Estas determinam que não se possa dar apoios directos à exportação. O regime de apoios de Estado também determina que as medidas fiscais não devem ser dirigidas a produções particulares.

Eu concordo com o principio de que não se deve ter apoios ou descriminações fiscais que escolham quais os sectores ou empresas a promover face a outros. No entanto, aplicando a descida da TSU a praticamente todos os sectores transaccionáveis, não se estaria a promover alterações artificiais da estrutura de especialização do país, mas apenas a contribuir para o necessário ajustamento macroeconómico, que está na base da própria ideia da desvalorização fiscal. Seria, assim, uma forma mais eficaz de fazer o mesmo.

Numa situação em que a resolução dos problemas de competitividade dos países do Sul da Europa estão no centro da agenda, existem argumentos fortes para pressionar a Comissão a aceitar que a redução da TSU se faça da forma mais eficaz, e não da forma como seria mais confortável para as normas comunitárias, mas mais penalizadora para os portugueses.

A ideia pela qual a Comissão Europeia defende que Portugal proceda a uma desvalorização fiscal é a de favorecer as actividades transaccionáveis, pelo que será estranho que impeça que isso seja feito da forma mais eficaz, directa e transparente. Penso que será possível encontrar e negociar uma forma jurídica que permita enquadrar uma descida focada da TSU na legislação nacional, comunitária e da OMC.

Existem inúmeras excepções ao regime de apoios de Estado, nomeadamente para casos de empresas que criam empregos, ou que estão em regiões desfavorecidas, ou que dão contributos ambientais relevantes, etc. Não seria demasiado estranho que pudesse haver excepções para medidas temporárias tomadas por países com reconhecidas dificuldades de equilíbrio externo.

Existem já exemplos de descriminação sectorial. O regime fiscal de apoio ao Investimento, em vigor em Portugal, com concordância das instâncias comunitárias, tal como as regras dos fundos do QREN, já descriminam o acesso a empresas de determinados sectores (CAE), com base numa estratégia de "concentração de recursos no apoio ao desenvolvimento competitivo das actividades de bens e serviços transaccionáveis". Já existem também regimes de TSU mais reduzida baseados em argumentos geográficos, ou sectoriais (a pesca e as actividades domésticas beneficiam em Portugal de uma taxa da TSU mais reduzida).

Houve no passado negociações difíceis, quando se criaram regimes de apoio sectoriais específicos em Portugal (por exemplo aos têxteis), dos quais a Comissão Europeia discordava. Tal como no passado e como no caso de tantos outros países e excepções, o que é necessário é ter a vontade politica e negociar uma forma de aplicar a redução da TSU, dentro de um quadro aceite a nível europeu, mas que sirva os interesses de Portugal.

As alternativas a esta negociação, serão o Governo desistir da desvalorização fiscal, deixando cair a mais emblemática medida de competitividade que defendeu nas últimas eleições, ou aplicar uma pequena redução de taxa a todos os sectores, com fortes custos e efeitos muito limitados para a competitividade das empresas portuguesas.



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