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14 de Setembro de 2006 às 13:59

O tabu de Tony Blair

Já vêm sendo habituais os tabus dos políticos que fazem anúncios prévios da tomada de decisões políticas de fundo sem as datar, o que é tão ou mais danoso do que quando algum, inopinadamente, foge ou bate com a porta do poder político na cara dos cidadãos

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Aconteceu assim em Portugal e também agora no reino de Sua Majestade com Tony Blair ao anunciar que deixaria, pelo seu próprio pé, uma governação de quase dez anos que mudou a face do Reino Unido e da Europa. O prazo dado foi de um ano, no máximo, mas sem indiciar data marcada o que está a gerar uma guerra civil no partido trabalhista e uma luta intestina pela sucessão que tudo leva a crer que foi preparada previamente.

Com efeito, a popularidade de Blair tem vindo a cair a pique, sobretudo em virtude do seu governo ter estado envolvido numa série de escândalos políticos e do efeito guerra do Iraque e do Líbano, que deixou o partido trabalhista com uma das mais baixas taxas de popularidade de sempre, tendo no contraponto, o partido conservador de David Cameron vindo a subir nas sondagens. E a estratégia agora é de refrescar a imagem dos trabalhistas e fazer uma transição do poder em suavidade, em tempo útil de três anos até às eleições.

Blair foi com 41 anos o mais jovem líder trabalhista que derrotou em 1997 Jonh Major, primeiro-ministro cinzento e de transição, que nunca conseguiu ascender a general. Teve, sobretudo, a coragem de adoptar a postura mais pró europeia de todos os seus antecessores, conhecidos por uma grande desconfiança em relação às questões da integração comunitária. Conseguiu, inclusive, aprovar as perspectivas financeiras 2007-2013 com a redução do sacrossanto cheque britânico, negociado por Margaret Tatcher, que impediu o Pais de ser contribuinte líquido, tendo, igualmente, viabilizado a passagem à terceira fase da União Económica e Monetária sem, contudo, ter conseguido nunca cumprir a sua promessa de fazer aderir o país ao euro.

Neste caso, talvez porque foi vítima do seu próprio sucesso, dado que fez prosperar o país em termos económicos e financeiros, dando-lhe níveis de desenvolvimento muito superiores à média da zona euro, tendo reduzido drasticamente o desemprego e apresentando o que chamou o modelo para o século XXI segundo o princípio «trabalho para os que podem trabalhar e assistência para os que não podem trabalhar», na senda de um sistema social europeu mais compassivo.

Todo este trabalho, notável para um estadista britânico, em prol da unidade europeia valeu-lhe, merecidamente, em 1999, o prémio Carlos Magno.

A questão, porém, vista de uma perspectiva nacional, é que esta decisão de deixar a liderança do país e do partido trabalhista não é uma boa notícia para a presidência portuguesa que se realiza no segundo semestre de 2007.

Ora, mesmo que como tudo aponta a saída de Blair se processe em Junho ou Julho do próximo ano, o que é facto é que nenhuma decisão importante poderá ser tomada no Conselho Europeu que decide por unanimidade, nem mesmo no Conselho da União que mesmo deliberando, em regra, por maioria qualificada, não pode prescindir de um voto de um país charneira como é o Reino Unido.

Isto porque se houver novo Primeiro-ministro que represente o país naqueles conselhos, que tudo indica será o poderoso ministro da economia Gordon Brown, este não terá ainda o conhecimento, desenvoltura e confiança suficientes para adoptar decisões que dificilmente são reversíveis no processo de construção europeu.

Noutro cenário, se Blair continuar no segundo semestre do próximo ano, estará então no termo do seu mandato, e já tão fragilizado que não quererá comprometer o líder que se segue com opções que podem ser estratégicas, designadamente em áreas nevrálgicas como a justiça e os assuntos internos.

Isto significa que a presidência portuguesa vai ter um semestre difícil e que urge, desde já, prever um plano de contingência e de rápida aproximação diplomática ao próximo responsável da governação britânica que, em qualquer caso, terá sempre a fragilidade de não ter sido sufragado nas urnas.

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