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Isabel Meirelles 03 de Abril de 2008 às 13:59

A união pelo átomo de Brown e Sarkozy

A visita a Londres de Nicolas Sarkozy, a primeira desde há 21 anos de um chefe de Estado francês, foi tudo menos cinzenta e, antes, serviu de mote a uma série de comentários políticos, e outros mais pessoais, que apimentaram as notícias que saíram no mund

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Claro que a principal questão era a nova primeira-dama e o desnudar do seu passado que longe de obnubilar as questões de política europeia e mundial antes lhes deram uma nova visibilidade.

De resto, não fora este picante mediático, podia ter passado perfeitamente despercebido o facto de Sarkozy querer inaugurar uma nova era nas relações bilaterais entre Paris e Londres, uma nova fraternidade franco-britânica como lhe chamou, em questões tão prementes como a imigração ilegal ou terrorismo ou, na cena internacional e no quadro da NATO, o envio de mais soldados para o Afeganistão, a juntar aos 1.500 militares gauleses estacionados nesse país.

Claro que os negócios estão sempre na linha da frente, sobretudo com os britânicos que concebem, primacialmente, o espaço europeu como uma zona de comércio livre, de que Gordon Brown continua um defensor acérrimo. De facto, as questões do abastecimento energético são das que mais preocupam os governos europeus, a ponto de se tentar construir uma política comum nesta matéria que prevê uma diversificação das fontes de abastecimento, a aposta nas energias renováveis e uma cláusula de solidariedade de execução prática duvidosa.

Nesta senda, a chave desta parceria seria a energia atómica, no sentido de um projecto conjunto de construção pelos dois países de reactores termonucleares de última geração susceptível mesmo de ser exportada para o resto do mundo. Recorde-se que, neste domínio, a França já produz 80% da sua energia por fissão nuclear contra 20% no Reino Unido. Mas também a indústria bélica, área nevrálgica de cooperação, faz parte dos planos de colaboração dos dois países, no sentido de conseguir economias de escala, tornando-a assim mais eficiente e rentável.

Claro que este exercício de sedução em que Sarkozy parece ser perito, fazendo jus ao charme francês, não deixa de preocupar Angela Merkel que se viu ostracizada desde que discordou dos planos do chefe de Estado francês para uma aliança mediterrânica que, de algum modo, era conflituante com o processo de Barcelona. Desde então, este eixo Paris-Berlim, sem ser desfeito, passou a não ser essencial, o que demonstra cada vez mais que, tal como na vida real, a política também é muito feita de empatias pessoais ou nem por isso.

De resto, ainda a propósito do charme de Sarkozy, ele conseguiu, como bom latino, exceder-se e assombrar os lordes e os deputados do Parlamento britânico que ficaram literalmente esmagados com tantos elogios e mesmo bajulações e cuja tradicional fleuma nunca os tinha feito imaginar que eram, nas palavras de um francês, ainda por cima o mais alto dignitário do Estado, os mais belos, gentis e inteligentes e que o futuro estava numa nova fraternidade franco-britânica. Tão irresistível foi que a Presidente da Câmara dos Lordes soçobrou e agradeceu mesmo aquela imensa paixão.

No contraponto, recorde-se o emblemático comentário de Jacques Chirac acerca dos britânicos, em que metaforicamente afirmou que não se podia confiar em gente que cozinhava tão mal!

Em suma, tudo correu na perfeição para a visita de Estado de Sarkozy, até porque não faltaram os condimentos essenciais como muita pompa e circunstância, cavalos, carruagens, pratarias, estandartes, sedas e brocados.

Foi como uma visita de conto de fadas, que a espartana Alemanha não tem capacidade para competir, até porque cultural e sociologicamente tem a fealdade do pragmatismo e da eficácia.

Estéticas à parte ou nem tanto, o que é facto é que a visita foi um êxito e centrou, novamente, as atenções na política europeia, mais que não seja porque uma foto nua da mulher do presidente francês, Carla Bruni, foi publicada nas primeiras páginas de vários jornais britânicos, cujo original vai ser leiloado em Nova Iorque.

Longe deste incidente causar embaraços parece até ter dado um empurrão à visibilidade de Sarkozy que se começa a posicionar como líder incontestado da União Europeia e cuja presidência do próximo semestre dos Conselhos da União, ameaça tudo menos ser monótona.

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