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07 de Março de 2008 às 13:59

O Casamento de MacArthur

Os tribunais portugueses tiveram esta semana um dia grande. É que, meus queridos leitores, tão frequentemente como beber uma bica é queixarmo-nos de que as sentenças são aleatórias, de tal forma é por vezes difícil compreendermos o que vai por dentro da c

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Não que neste caso o juiz não tivesse razão. No fim de contas, 124 mil rosas era o dote que o homem havia prometido à mulher, quando – queixa-se ela – nem um café lhe paga quando vão jantar fora. Acontece que no Irão, pelos vistos, não cumprir promessas é caso para tribunal e uma dívida de dote é exigível em qualquer altura do casamento e pode dar prisão. Nem com o divórcio um tipo pode dizer “desta já me safei”, pois o prometido é devido na mesma. Isto até faz lembrar o General Douglas MacArthur quando foi expulso das Filipinas em 1942 e saiu com o seu famoso “I shall return”. Só que voltou mesmo, dois anos e meio depois, em Outubro de 1944.

Infelizmente, este foi um caso raro, pois cumprir uma promessa é cada vez menos frequente. Há mesmo promessas que a evidência empírica mostra que serem cumpridas é uma anomalia, como é o caso do “já te telefono”, “pago-te na próxima semana” ou “estou aí às sete”, para não falar do “o cheque seguiu pelo correio” e do nosso vencedor: “sou do Governo e estou aqui para ajudar.”

Foi neste apaixonante tema que se especializou o finlandês Vay Pacear, da Universidade de Tensmuy Talábia, e que ilustra com um paradoxo moderno: porque juramos fidelidade eterna no casamento quando está provado estatisticamente que 50% dos casamentos acaba em divórcio? E porque votamos num político que nos promete que o sistema de segurança social não está em causa quando sabemos que a verdade é exactamente o contrário?

Explicar o inexplicável foi o que este nosso notável finlandês conseguiu magistralmente no seu paper “On Broken Promises: a Strategic Role for Superglue”, publicado no Political Lies Daily. Começa Vay Pacear por mostrar que esta coisa de não cumprir promessas já é muito antiga. Com efeito, já na alta Idade Média as vítimas destas promessas não cumpridas juntavam-se nas Confrarias do Pau, que atacavam pela calada da noite quem faltava a promessas à traulitada, com bastões de madeira e comprimento entre os 20 cms, para promessas pequenas, e a meia jarda (quase meio metro) no caso das promessas mais importantes. Esta é considerada por alguns a origem do termo trauliteiro, que designaria os membros destas confrarias.

Também no Oriente este costume é antigo. Na China do Imperador Toka Pa Gar era costume pintar a cara de quem rompia promessas, de cor tanto mais escura quanto mais importante era a promessa não cumprida. Esta é uma das origens da tinta da China, negra como breu, o que mostra bem como as coisas já eram na altura.

Mas porque isto acontece, ou seja, porque é que uma promessa não é cumprida? Vay Pacear diz-nos que as promessas podem ser de três tipos: as que são de tal forma incríveis que já quando são feitas não são para ser cumpridas. É o caso de quando se promete a lua, só alguém muito distraído acreditaria, normalmente designado “aluado”. Estas são promessas feitas por profissionais, com larga experiência nisto de prometer e que conseguem ter um ar sério mesmo neste caso. Muitos políticos pertencem a esta categoria, e um exemplo típico é o conhecido “votem em mim que não aumentarei os impostos”.

O segundo tipo é o das promessas pessoais, geralmente específicas e dirigidas a alguém próximo, muitas vezes feitas depois das 20 horas. São as que mais baixo índice de incumprimento têm, pois são promessas de amador, feitas no calor do momento, o que vale aos seus autores e respectivos destinatários a designação de “acalorados”.

Finalmente temos as promessas impessoais, que são feitas a um público mal definido e em geral com um enunciado simples e aparentemente claro, mas que depois se revela difícil de interpretar e complexo de avaliar.

Cuidadosamente formuladas por autênticos especialistas, mesmo que falsas para muita gente, são verdade para, pelo menos, uma pessoa. São geralmente feitas de dia, para uma larga audiência que as “engole”, pelo que a estes acontecimentos é frequente chamar “comícios”. Quem as faz invoca mais tarde que foram cumpridas com alguém, só não se sabe com quem.

Em que ficamos, então? Acreditar, só nas promessas que fazemos a nós próprios. E mesmo essas?

Frederico Bastião é Professor de Teoria Económica das Crises na Escola de Altos Estudos das Penhas Douradas. Quando lhe perguntámos o que se deve fazer a quem promete e não cumpre, Frederico respondeu: “Arrancar-lhe os dentes. Assim não pode dizer que mente com quantos dentes tem.”

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