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Liberalização com chumbo

A liberalização tem costas largas e muito azar em cima. Desde que o regime na distribuição de combustíveis mudou em Portugal, já lá vão três anos, o gasóleo já subiu 44% e as várias gasolinas têm aumentos médios acima dos 25%. Em qualquer dos casos, é mu

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A liberalização tem costas largas e muito azar em cima. Desde que o regime na distribuição de combustíveis mudou em Portugal, já lá vão três anos, o gasóleo já subiu 44% e as várias gasolinas têm aumentos médios acima dos 25%. Em qualquer dos casos, é muito.

Mas nada tem a ver com mercados liberalizados ou regulados. Simplesmente desde então a escalada do petróleo revelou-se imparável. E dá-se o caso de Portugal não ter uma única reserva de petróleo conhecida.

A equação é, então, muito simples: as cotações internacionais disparam, o país importa o crude todo e paga muito mais caro, além disso não se atenuam os factores internos (como a carga fiscal) que contribuem para o preço final, portanto, este sobe.

A matemática é realmente mais simples que a realidade. E esta diz-nos que, no nosso caso, o consumidor nem sempre está a pagar aquilo que resulta de uma fórmula objectiva e imutável. É o que acontece no mercado dos combustíveis nacional, que vive com graves problemas estruturais de concorrência.

A actividade de exploração e extracção de petróleo é, porque não a temos, irrelevante na cadeia de valor dos combustíveis. Os mecanismos de mercado só podem então funcionar na refinação, na distribuição grossista e nos postos de venda no retalho.

Na refinação temos um caso de monopólio: a Galp, com duas refinarias, abastece quase todo o mercado nacional, pois só menos de 10% é importado. E quase tudo é gasóleo, porque, ao contrário das gasolinas, a produção interna é deficitária.

Aqui entra o Estado. E a absurda política fiscal que incentiva, através do preço, ao consumo do combustível que precisamente o país não tem. E que, além da irracionalidade económica, é ainda por cima uma opção mais poluente.

Na comercialização grossista, o monopólio transforma-se num oligopólio, em que a Galp continua a dispor da maior quota, mas reparte o domínio do mercado com a Repsol e a BP. E as barreiras à entrada são tremendas. Se o Mibel é a ficção oficial, se o mercado ibérico do gás é já a miragem oficiosa, estamos longe, muito longe de construir o sistema de oleodutos que nos ligue à rede espanhola de transporte de produtos petrolíferos.

No retalho, a parte mais visível desta sucessão de mercados que vão acabar no consumidor final, é o campo onde a Autoridade da Concorrência está mais activa. E vindo a confirmar que, de facto, as fórmulas matemáticas não funcionam em mercados onde a transparência não existe.

Pois é exactamente aqui, na passagem dos grossistas para os postos de venda de retalho, que existe fortes indícios de novas práticas de cartel.

Sabemos, porque acontece aos olhos de toda a gente, que há o fenómeno de "Maria vai com as outras" nas mudanças de preços: a Galp sobe ou desce e todos vão atrás. Não é suficiente para gritar "concertação", porque existe a razão de mercado.

Mas se o petróleo está estável. Se o euro valorizou 14%. Se é em euros que os retalhistas portugueses compram os produtos petrolíferos já refinados. E se o consumidor, em vez de pagar menos, está ainda por cima a pagar mais caro o combustível, não insulte os matemáticos e chame a polícia, avise a guarda.

Ou Abel Mateus. Porque há problemas. Eles existem e não é por liberalização a mais. É exactamente o contrário. Este sector, sem concorrência, sem transparência, sem a cultura de consumidor, é o resultado de um longo período de intervenções discricionárias e motivações obscuras.

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