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29 de Janeiro de 2007 às 13:59

Dois Fóruns, alguns riscos

Uma semana após o Fórum Social Mundial – realizado em 20 de Janeiro último e, pela primeira vez, em África, no Quénia – terminou ontem, na Suiça, mais um Fórum Económico Mundial. O Fórum Social realizado em Nairobi contou com numerosas personalidades inte

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O Fórum Social realizado em Nairobi contou com numerosas personalidades internacionais – como é o caso da ex-comissária para a ONU Mary Robinson, o ex-presidente da Zâmbia, Kenneth Kaunda, do Prémio Nobel da Paz Desmond Tutu ou da também Prémio Nobel da Paz, Wangari Maathai – e permitiu aos organizadores manifestar a sua solidariedade para com o continente mais pobre do mundo, chamando a atenção para os problemas da pobreza, da luta contra a sida, do peso da divida pública dos países mais pobres, e da dignidade da pessoa no trabalho.

Por seu turno, no Fórum Económico Mundial – que contou com a presença de cerca de duas dezenas de Chefes de Estado e de Governo e oito centenas de empresários de todo o mundo – discutiram-se os grandes temas da economia mundial e as principais questões sobre segurança internacional, assim como os riscos associados a cada um destes temas.

Em comum, ambos os Fóruns realçam a existência de alguns riscos para o mundo em 2007.

Por exemplo, publicitado uns dias antes do encontro, o relatório anual do Fórum Económico Mundial – elaborado em colaboração com o Citigroup, Marsh and McLennan, Swiss Re e o Wharton School Risk Center – realça que 15 dos 23 principais riscos mundiais aumentaram em 2006 e nenhum diminuiu. Este estudo apresenta um balanço da economia em 2006 e serviu de suporte a diversas discussões promovidas no denominado Fórum de Davos. Curiosamente, o documento é algo pessimista sobre os riscos mundiais, pois salienta que – a par do agravamento dos "grandes riscos" que pesam sobre a economia mundial – a capacidade para lhes responder não progrediu de forma concomitante, e existe até um desvio crescente entre a possibilidade de os riscos mundiais causarem perturbações sistémicas maiores e a capacidade para os atenuar.

Em particular, os riscos ligados a eventuais choques petrolíferos, ao défice norte-americano, ao abrandamento acentuado do crescimento económico chinês, a crises orçamentais ligadas à evolução demográfica, ao mercado imobiliário e ao sobreendividamento (de famílias, empresas e países) aumentaram em 2006. Paralelamente, ampliaram igualmente os riscos relacionados com o ambiente, nomeadamente com as alterações climáticas, o fornecimento de água potável, as tempestades tropicais e as inundações. Para tentar reduzir estes perigos de natureza económica e ambiental, o relatório preconiza a criação em cada país de um gabinete de riscos especificamente vocacionado para a sua gestão – que actue a nível internacional e de forma concertada com outros países – e que se incrementem relações interpaíses em torno da ideia de riscos comuns/partilhados.

O relatório do Fórum Económico realça ainda – ao nível das questões de segurança – a tendência para um aumento gradual do terrorismo internacional e para a existência de guerras e conflitos civis.

Ora, neste panorama, diria que Portugal permanece um país pouco exposto a riscos já que as empresas e as famílias encaram hoje o futuro com confiança, na expectativa de que o investimento produtivo se consolide e o desemprego baixe. No entanto, o país não se subtrai a alguns riscos. Desde logo a nível económico – e uma vez que a inflação parece estável – o maior parece ser o do endividamento. De facto – e uma vez que a retoma económica parece confirmar-se em Portugal – não deixa de preocupar o endividamento (que representa cerca de 70% do PIB) a três níveis: das famílias, das empresas e do Estado. O recente e rápido aumento das taxas de juro realça a vulnerabilidade de Portugal, sobretudo junto das famílias, pois como se sabe o perigo de desajustamento aumenta quando a um endividamento familiar elevado se combinam preços de habitação altos, podendo gerar um aumento do crédito mal parado. Depois, e porque o tecido empresarial português é constituído na sua quase totalidade por PME, na sua maioria dependente do crédito bancário, os sucessivos aumentos das taxas de juro podem comprometer a solvabilidade de muitas empresas. Por fim, importa destacar igualmente que estes aumentos oneram ainda mais o financiamento da dívida pública.

Depois, existem também os riscos relacionados com o ambiente. De acordo com o recente relatório de Nicholas Stern – encomendado pelo Governo britânico –, os países do Mediterrâneo, em particular Portugal, Espanha e Itália, poderão assistir a um aumento do stresse hídrico, de ondas de calor e de fogos florestais nos próximos tempos. O estudo prevê também que muitos países costeiros – nomeadamente os países desenvolvidos em latitudes baixas, como é o caso de Portugal – estejam mais sujeitos à subida do nível do mar. Além do mais, o aumento da temperatura global do planeta pode levar a uma redução na ordem dos 20% das reservas de água e a escassez de água limita o efeito de fertilização do carbono, conduzindo a quebras substanciais na agricultura (recorde-se que, em 2006, as colheitas nos países do Sul da Europa sofreram uma quebra de cerca de 25%, ao invés do que se verificou nos países do Norte da Europa onde se registaram aumentos). Foi portanto oportuna e pertinente a eleição do tema "alterações climáticas" para o debate mensal na Assembleia da República. Como então salientou José Sócrates, este sendo um "risco global, exige uma resposta global". Mas a verdade é que nenhum país pode "dar-se ao luxo" de esperar por consensos internacionais nesta matéria e está nas mãos dos dirigentes nacionais (responsáveis pela actual conjuntura) ter a coragem e a vontade de assegurar para as próximas gerações um crescimento sustentável. E o anúncio feito por Sócrates, durante o debate da semana passada, de aposta futura em tecnologias emergentes, no biogás, na biomassa e no biocombustível, é um sinal encorajador dessa vontade.

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