Opinião
Crise do “subprime” e taxas de juro
Em Fevereiro deste ano publiquei nesta coluna um artigo onde – a propósito da realização do Fórum Económico Mundial – destaquei os riscos que então se previam para 2007. Na verdade, o relatório anual do Fórum Económico Mundial – elaborado em colaboração c
Na verdade, o relatório anual do Fórum Económico Mundial – elaborado em colaboração com o Citigroup, Marsh and McLennan, Swiss Re e o Wharton School Risk Center – realçava que 15 dos principais 23 riscos mundiais aumentaram em 2006 e nenhum diminuiu.
Em jeito de avaliação, o documento salientava igualmente que, a par do agravamento dos “grandes riscos” que pesam sobre a economia mundial (onde se incluíam, entre outros, os associados ao défice norte-americano, ao mercado imobiliário e ao sobreendividamento das famílias), a capacidade para responder a estes riscos não tinha progredido de forma concomitante, o que aumentava a susceptibilidade de perturbações sistémicas acentuadas.
Ora, a já há algum tempo receada crise do “subprime” norte-americano acabou por se fazer sentir. O primeiro sinal chegou em Março deste ano, com o anúncio de falência iminente da New Century Financial – banco americano especialista em crédito imobiliário ao segmento “subprime” e um dos maiores do sector – e o consequente despedimento de mais de três mil pessoas. De facto, este florescente segmento de sector – assente em empréstimos concedidos a clientes de “alto risco”, financeiramente mais frágeis e/ou de duvidoso historial creditício – duplicou nos últimos cinco anos nos EUA e, para muitos, a crise adivinhava-se próxima.
Manifesta em Julho último, esta crise hipotecária norte-americana acabou por contagiar o sistema financeiro mundial, em particular o europeu e o japonês. E, à semelhança do que aconteceu com a Reserva Federal Americana (Fed), quer na Europa quer no Japão os Bancos Centrais procuraram imediatamente acalmar os mercados, introduzindo grandes somas de liquidez.
Na Europa (à excepção do Banco de Inglaterra que, curiosamente, se absteve de injectar liquidez no seu sistema financeiro), o Banco Central Europeu (BCE) viu-se obrigado a intervir, assim como no Japão o fez o Banco do Japão (BoJ), embora de forma mais modesta, uma vez que a economia japonesa se encontra muito menos exposta à crise do “subprime”.
Contudo, esta acção não evitou um clima de desconfiança generalizada no sector financeiro. A verdade é que a crise arrebatou a banca europeia: as quinze maiores entidades bancárias europeias perderam mais de 100 mil milhões de euros e chega a noticiar-se que a banca europeia perde entre 9,5% e 10% do seu valor em Bolsa.
Mas agora que parece serenada a “tempestade”, a dúvida que se coloca é a de saber se esta crise do “subprime” pode ter repercussões mais vastas no plano socioeconómico.
A dúvida justifica-se. Se a crise se propagou ao mercado interbancário, nomeadamente na zona euro, a maioria dos bancos ficará menos confiante na concessão de crédito e, naturalmente, ou aumentará o custo do dinheiro ou recusará com maior facilidade empréstimos às famílias e às empresas, reduzindo a liquidez em circulação no mercado. Perante este cenário, ao nível socioeconómico os riscos associados ao endividamento, à diminuição do consumo, e ao aumento do desemprego nas economias mais afectadas por esta crise, podem agora elevar-se.
Procurando afastar as perspectivas mais pessimistas, diversas entidades financeiras – como a Fed, o BCE e o Boj – têm vindo a garantir aos investidores internacionais que a crise do “subprime” não afectará nem o sistema financeiro mundial, nem o crescimento económico. Também o Fundo Monetário Internacional já fez saber que entende que a forte volatilidade dos mercados financeiros mundiais não colocará em causa a estabilidade do sistema, e que as consequências sistémicas da reapreciação em curso do risco de crédito são geríveis em ambiente de forte crescimento mundial.
Não obstante, e preocupados com o futuro, muitos investidores aguardam este mês, com redobrada expectativa, dois importantes anúncios: nos EUA espera-se que a Fed baixe a sua principal taxa de referência – actualmente em 5,25% – e, na Europa, que o BCE anuncie ou a manutenção ou mesmo a redução da sua taxa de referência.
Nos EUA, o frágil crescimento económico (que este ano oscila entre 0,6% no 1º trimestre do ano e 4% no 2º trimestre) e a actual crise de Julho e Agosto últimos levam muitos analistas a antever algumas contrariedades para a economia. Longe da pujança do crescimento de países como a Índia ou a China, e a atravessar esta crise do “subprime” – que já se traduziu em diversas falências e no desemprego de milhares de pessoas –, a economia norte-americana parece necessitar de novo folgo, pelo que o anúncio da diminuição das taxas de juro por parte da Fed podia significar essa resposta.
Também na Europa, com uma taxa de inflação estável nos 1,8%, urge redefinir a política monetária para a zona euro. A verdade é que, a par do fraco crescimento – recorde-se que, por exemplo, a OCDE estima um crescimento de apenas 2,25% em 2007 para a zona euro – os bancos estão já a aumentar as suas taxas de juro (muito acima da taxa de referência do BCE, actualmente em 4%) e a restringir a disponibilidade do crédito para novos investimentos. Esta situação afectará negativamente a confiança dos investidores e dos consumidores, reflectindo-se no emprego e no crescimento.
Ora, para restabelecer a confiança dos europeus, cumpre ao BCE dar um sinal inequívoco de que está preparado para defender o crescimento e o emprego, reduzindo as taxas de juro se necessário.