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Personalidade Internacional: Elon Musk, o presidente não-eleito dos EUA

O multimilionário e Donald Trump vivem um "bromance". A dúvida consiste em saber se dois egos insuflados conseguem manter uma relação saudável. Para já, Elon Musk conquistou um enorme poder político sem ir a votos.
Celso Filipe 26 de Dezembro de 2024 às 13:00

Poderoso influenciador
Elon Musk usa a rede social X como vértice de uma estratégia que o tem tornado uma figura incontornável. Conduziu entrevistas a Trump, é capaz de fazer senadores republicanos mudarem de opinião, defende a extrema-direita alemã e critica juízes italianos. O multimilionário assume-se como um manipulador do espaço político.


Elon Musk tem, por estes dias, o estatuto de presidente não eleito dos Estados Unidos da América. O seu empenho e a circunstância de ter colocado a rede social X ao serviço da campanha foram fatores decisivos para garantir o regresso de Donald Trump à Casa Branca. Este já lhe começou a pagar o esforço, nomeando-o para liderar o departamento de Eficiência Governamental. Neste organismo "sui generis", Musk terá todos os poderes que Trump lhe quiser atribuir, com a vantagem de escapar ao escrutínio do Congresso norte-americano, na medida em que não irá ocupar formalmente um cargo público. Mais, como consultor externo do governo federal, vai manter todos os investimentos e os cargos que ocupa nas suas empresas.

O multimilionário nascido na África do Sul assegura assim o melhor de dois mundos. Por um lado, pode usar o papel de consultor para beneficiar as suas empresas, da Tesla à SpaceX passando pela Neuralink, por outro, garante acesso a uma quantidade brutal de informação classificada e terá enorme capacidade de influenciar decisões.

De tal forma que a Força Aérea lhe negou recentemente um acesso de segurança de alto nível devido aos riscos associados a ele - e alguns aliados dos EUA, entre os quais Israel, já manifestaram as suas preocupações sobre a possibilidade de Musk partilhar com terceiros os dados a que terá acesso, dando razão à máxima segundo a qual "informação é poder".

O Semafor, jornal online norte-americano, num artigo publicado a 6 de novembro, foi perentório nesta matéria: "Após as duas últimas eleições presidenciais dos EUA, surgiram dúvidas sobre o que elas significariam para a indústria tecnológica. Depois desta, os resultados são claros: o grande vencedor é Elon Musk e o seu vasto império de carros elétricos, foguetões, implantes cerebrais e centros de dados de IA".

"Elon Musk tem um poder que nenhum outro empresário do capitalismo teve" resume Josep Ramoneda, filósofo espanhol, numa entrevista publicada no site do Instituto Humanitas Unisinos.

O empresário já possuía uma notoriedade mediática muito acima da média, devido à sua riqueza, mas também por força de um persistente comportamento excêntrico. Agora, com o apoio a Donald Trump, galgou para o patamar de influenciador político. Aliás, há mesmo quem lhe atribua um grau de preponderância sobre o presidente eleito dos EUA superior ao do vice-presidente JD Vance.

A efetividade deste poder ficou patente na semana anterior ao Natal. Elon Musk recorreu à rede X para criticar o compromisso que o presidente da Câmara dos Representantes, o republicano Mike Johnson, havia alcançado com os democratas para financiar temporariamente as operações do governo dos EUA até meados de março. Resultado, os senadores republicanos acabaram por votar contra a proposta que tinha sido avalizada pelo seu próprio líder. O próprio Donald Trump teve de ir a reboque de Musk, declarando publicamente que também se opunha ao projeto de lei de financiamento do governo.

Dois egos enormes

A influência do empresário extravasa fronteiras e ele faz um uso progressivo dela em nome das suas opções políticas. É a esta luz que se deve analisar o facto de ter recorrido à rede social X para manifestar o seu apoio à extrema-direita germânica. "Só a AfD pode salvar a Alemanha", escreveu Musk.

O empresário envolveu-se também na política interna italiana, verbalizando críticas a juízes de Roma, devido às suas decisões contrárias à política migratória do Governo italiano de extrema-direita. "Esses juízes precisam de sair", sentenciou. "Já não é a independência do poder judicial que está aqui em causa, mas sim a soberania do Estado italiano", reagiu a vice-presidente da Associação Nacional dos Magistrados, Alessandra Maddalena.

 

A primeira-ministra, Giorgia Meloni, ao invés, mantém uma relação de proximidade com ele. "Posso ser amiga de Elon Musk e, ao mesmo tempo, chefe do primeiro Governo italiano que criou uma nova lei para regulamentar a atividade privada no espaço", disse a governante já este mês de dezembro.

Elon Reeve Musk nasceu em Pretória a 28 de junho de 1971, sendo o mais velho de três irmãos. Aquele que é um dos mais bem-sucedidos empresários de sempre, o que faz dele o homem mais rico do mundo (com 313 mil milhões de dólares) e que nas últimas semanas se manteve na ribalta também pelo forte apoio a Donald Trump, é considerado um excêntrico e também imprevisível – características que talvez tenha ido buscar à sua infância menos feliz.

O pai era um engenheiro sul-africano e a mãe uma modelo e nutricionista canadiana. Quando o casal se divorciou, em 1980, Musk viveu sobretudo com o primeiro – a quem mais tarde chamou de "um ser humano terrível". O hoje empresário foi vítima de "bullying", tendo chegado a ser hospitalizado, e o pai ainda lhe terá batido devido a isso, episódio que Musk nunca perdoou.

A sua argumentação maniqueísta casa na perfeição com a visão de Donald Trump - e o poder que este agora lhe outorga confere a Musk uma capacidade de influenciar a ordem mundial, não apenas no plano económico, mas igualmente no político. Sem ir a votos, o empresário venceu as eleições norte-americanas de 5 de novembro de 2024, e os seus comportamentos anteriores abrem espaço para que se conclua que estão abertas as portas para uma relação promiscua entre negócios e política.

"Dois homens com egos enormes mas visões do mundo bastante divergentes a partilhar o Salão Oval? O que pode correr mal? Pessoalmente, dou menos de 50% de hipóteses de o ‘bromance’ [expressão inglesa utilizada para designar um relacionamento íntimo, não-sexual e romântico] Trump-Musk sobreviver aos primeiros 100 dias", vaticinou Gabriel Gatehouse, antigo editor da secção Internacional da BBC Newsnight, uma análise publicada a 23 de novembro, no Financial Times. Aceitam-se apostas.

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