Opinião
Centros de decisão nacional
Tem estado recentemente em discussão a problemática sobre a manutenção dos “centros de decisão” nas mãos dos investidores nacionais e o risco da sua transferência para o estrangeiro. Este debate surge reforçado após a consciência plena do que é (pode ser)
A abordagem
Tem estado recentemente em discussão a problemática sobre a manutenção dos “centros de decisão” nas mãos dos investidores nacionais e o risco da sua transferência para o estrangeiro. Este debate surge reforçado após a consciência plena do que é (pode ser) a globalização. Fará sentido esta discussão no quadro da nossa integração no espaço económico e social comum, no âmbito da União Europeia? Seremos demasiado proteccionistas? Acreditamos que pelo menos merece haver espaço para esta reflexão.
Há uma grande diversidade de argumentos, uns a favor e outros contra a transferência do capital das empresas nacionais para mãos estrangeiras. Em ambos os entendimentos encontramos posições razoáveis e sensatas. Por isso acreditamos que a questão não é simples e de conclusão linear. Encontrámos, entre outros, alguns dos argumentos que nos merecem maior reflexão e discussão.
i) A favor da transferência do capital para estrangeiros:
– a importação de conhecimento, novas tecnologias, “know how” e novas competências de gestão;
– a criação de emprego, o aproveitamento da mão-de-obra especializada que, se bem gerida, revela bons níveis de competência e produtividade;
– a captação de importantes níveis de capital não disponível em mãos de investidores nacionais;
– a possibilidade de alavancar a economia para novos graus de produtividade e desenvolvimento tecnológico;
– a integração de Portugal nos modelos de crescimento dos países parceiros mais desenvolvidos da União Europeia (caso da Inglaterra, Holanda, Suécia ou Espanha).
ii) Contra esta posição de deslocalização do capital:
– a procura pelos estrangeiros de um modelo de mão-de-obra barata que desqualifica o país;
– o risco de provocar o desemprego, com o impacto social negativo consequente, quando este modelo de baixo custo da mão-de-obra sofre a concorrência de países como a China, Índia, República Checa ou Roménia;
– o mesmo fenómeno que o anterior mas baseado na deslocalização da produção para os países da Europa de Leste, cujas qualificações da população são mais elevadas;
– o mero aproveitamento dos benefícios fiscais do estado por um longo período de anos, findos os quais se encerra a actividade e se deslocaliza para os países atrás referidos;
A política
Apesar dos argumentos acima apresentados, continua para nós a não ser simples uma tomada de posição a favor ou contra os mesmos, uma vez que tais argumentos não reflectem por si só a profundidade do problema. A exemplo de países já referidos como a Holanda, Suécia, Reino Unido ou Espanha, também em Portugal será de grande conveniência permitir a transferência do capital para accionistas estrangeiros (quer de grandes, pequenas ou médias empresas), desde que estes investidores nos tragam não só novos capitais, mas também uma forte capacidade financeira que permita ao País mais desenvolvimento, inovação e criação de riqueza. Isto é igualmente aplicável a negócios em sectores estratégicos para Portugal. No momento em que tanto se fala (e trabalha) para a captação de investimento estrangeiro, o País não pode e não deve actuar em contradição com esta politica, dado que a criação de riqueza permitirá a obtenção de sinergias com outras empresas a montante e a jusante (“clusters”) tão importantes para o País.
Os reguladores
O risco da transferência de capitais, a existir, poderá ser significativamente reduzido, extinto mesmo, se houver uma forte política reguladora em Portugal (como no Reino Unido). Acreditamos que uma forte entidade reguladora em cada sector estratégico permitirá dar cumprimento às normas estabelecidas no mercado de cada sector, o que permitirá a protecção dos interesses económicos, políticos e sociais nacionais, reduzindo o perigo de uma nefasta detenção de capital nacional em mãos estrangeiras. Estes riscos, se os houver (desemprego acelerado, encerramento de operações e desinvestimento, atropelo das normas de concorrência, políticas empresariais com impacto social negativo na sociedade, fragilidade na defesa e coesão nacional) serão minorados com uma politica reguladora de rigor e exigência. A existir tal politica, será possível manter em Portugal o capital na posse de quem terá melhores condições para criar valor de forma mais acelerada mas desenvolvendo (e protegendo) um modelo de coesão social.
Uma dúvida nos assola. Deverão as entidades reguladoras que definem as regras do mercado e da concorrência contribuir igualmente para a definição do que são as políticas estratégicas nacionais para o sector? Estamos inclinados a concluir que não. Essa tarefa é da competência dos concorrentes.
O Estado
Caberá ao Estado em última instância responder pela manutenção do modelo de coesão social, soberania e segurança nacionais. A questão que mais dúvida nos suscita é se o estado deverá sobrepor-se aos reguladores sectoriais. Se tomarmos como certo que tal não deva acontecer, poderá (deverá) o Estado, no limite, proceder a compensações fiscais em sede de IRS, IRC ou outros. Um exemplo: havendo decisões num mercado ou sector com impacto negativo directo nos rendimentos dos mais desfavorecidos, o Estado compensará quem recebe o salário mínimo nacional ou rendimentos abaixo de um valor/limite mínimo estipulado. A isto se chamaria actuação seguindo o interesse nacional.