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02 de Novembro de 2005 às 13:59

Ambição dá saúde e faz crescer

Os movimentos de crescimento do BPI e do BCP têm de ser observados e rectificados não só pelos seus accionistas e stakeholders, mas também pelo próprio Governo português.

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Segundo conta a imprensa financeira, o BCP Millennium terá oferecido cerca de três mil milhões de euros por uma posição de 61,9% para assegurar o controlo do Banco Comerciala Romana. Para alguns analistas financeiros, isto exigirá ao banco português um aumento de capital entre os 1,5 e 2 mil milhões de euros. Em consequência destas novidades, as acções do BCP Millennium afundaram para os 2,10 euros, interrompendo a trajectória ascendente que levam desde meados de 2004.

Convém, antes de mais, reconhecer que o BCP é uma das melhores coisas que os portugueses fizeram nas últimas décadas. Em 20 anos – e nascido do nada – o banco transformou-se no maior dos bancos privados portugueses, senão mesmo o maior banco nacional, atraindo capital nacional e estrangeiro para o seu projecto empresarial. E muitas das inovações que o BCP introduziu no mercado financeiro acabaram por fazer história, tornando-se «benchmarketing» em muitos aspectos do negócio bancário. Claro que o banco sofre com um problema de custos, que resulta tanto da série de aquisições que foi realizando no seu percurso de crescimento por aquisição, como dos salários gordinhos da sua alta direcção. Quando compara com os «cost to income» dos seus congéneres internacionais, o Millennium não fica muito bem na fotografia. Mas, para diluir estes custos de estrutura, o banco só pode acelerar a sua expansão. Até porque o crescimento em dimensão é a única forma de impedir uma oferta pública de aquisição hostil, por parte de um qualquer concorrente estrangeiro. Por estes motivos, uma política de aquisições internacionais – especialmente em mercados não maduros, onde o seu «know-how» seja relevante e diferenciador – é, para a administração do BCP Millennium, um acto de boa gestão e até de prudência estratégica. Já se sabe que a melhor defesa é um bom ataque.

Mas os desafios de crescimento do BCP Millennium não são apenas uma questão para os seus accionistas. Da mesma forma, aliás, que a prestação da banca portuguesa é uma questão estratégica para toda a economia nacional. O sistema financeiro é, obviamente, um dos mais importantes de qualquer economia. A banca decide quem «favorece» ou não, no sentido em que há empresas e projectos empresariais que são ajudados pelos laços de confiança entre os administradores dos bancos e os gestores e empreendedores de cada país. Um país sem banca é um país fragilizado. Portugal tem quatro grandes bancos com dimensão: para lá do BCP, contamos com a CGD, o BES e o BPI. A Caixa é do Estado e não será, por isso, opável. Tem um problema de continua erosão do seu mercado e de incapacidade em gerar e gerir uma estratégia de expansão internacional, resultado das constantes mexidas e jogadas políticas que sofre a sua administração. O BES está mais protegido pelas ligações familiares de muitos dos seus accionistas, que para mais se emaranham numa série de negócios cruzados. Já o BPI e o BCP acabam por estar mais expostos aos apetites dos grandes grupos bancários espanhóis, que são naturalmente os que maior interesse têm pelo mercado português. Por isso, os movimentos de crescimento destes dois bancos – o BPI mais focado em Angola e o BCP nos mercados emergentes da Europa – têm de ser observados não só pelos seus accionistas e «stakeholders», mas também pelo próprio Governo português. Não faço, obviamente, a mínima ideia se Fernando Ulrich ou Paulo Teixeira Pinto conversam com o Governo português sobre estas matérias, mas se não o fazem, deviam. O Executivo português está basicamente a governar sobre matérias económicas – as reformas estruturais que Sócrates tenta implementar não são mais do que reformas de índole económica – para transformar – com ou sem sucesso, isso logo se verá – uma economia socializada numa verdadeira economia de mercado.

Ora, esta economia de mercado vai precisar de bancos nacionais geridos por gestores portugueses, que facilitem a vida aos empreendedores portugueses, porque é assim em qualquer lado do mundo. Os banqueiros espanhóis ajudam os empresários espanhóis, os banqueiros alemães ajudam as indústrias alemãs e mal dos portugueses se não tiverem banqueiros para os ajudarem nas suas aventuras no mundo dos negócios. Ora, se o BCP Millennium conseguir uma vitória em solo romeno, pode ser uma maçada para os seus accionistas, que lá vão ter que ocorrer novamente a uma chamada de capital. Mas do ponto de vista do interesse português, é isso que faz sentido e tem interesse. Por isso, é bom que esta questão esteja a ser tratada também diplomaticamente como merece. Ou seja, como uma oportunidade importante para o reforço dos interesses portugueses no mundo e como uma forma de contrariar o apetite estrangeiro por uma das nossas melhores empresas, ainda para mais no sector financeiro.

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