Opinião
Alta Tensão
É bom que os choques prometidos pelos partidos para endireitar Portugal resultem, senão os portugueses vão ter o choque da vida deles. O País só sai do pântano aos choques, e com todos, sem excepção. A dimensão dos nossos problemas assim o exige ...
O PEEM - Processo Eleitoral Em Curso que vivemos nesta nossa República está de facto a ser diferente. Já vimos um pouco de tudo nesta campanha, desde candidatos que andam ao colo até candidatos que perderam o pio, de candidatos que não o eram a candidatos que não o são, passando por anúncios de governos - ou governantes - que se o forem só serão de perfil, não de frente. Mas na minha opinião a grande novidade destas eleições são os choques.
Confesso que ao princípio pensei que era conversa de políticos. Mas depois pensei melhor e reparei que - e quanto me custa admiti-lo! - estava errado.
Com efeito, a Teoria Económica mostra bem que o País precisa de um choque. É sabido que o País está deprimido, basta ver o último Eurobarómetro: 93% dos portugueses e portuguesas considera que a situação está má. Como se inverte isto? A escola das expectativas racionais diz-nos claramente que a informação presente está toda ela reflectida na informação que hoje dispomos e consequentemente nos comportamentos actuais. Então, isto quer dizer que para acabarmos com o pessimismo precisamos de informação nova, de uma ruptura com o passado, por outras palavras, de um choque. Mas que choque precisamos? E com que características? É que choques, em Portugal, já temos tido e muitos.
Os choques, em Portugal, têm um conjunto de notáveis propriedades. Em primeiro lugar, são ubíquos - estão em toda a parte. Há choques na política: basta olharmos para os programas dos partidos e é só escolher, há para todos os (des)gostos. Há choques no futebol: até o FCP despediu um treinador e para quê? Para provocar um choque psicológico. O «povão» tem choques cada vez que o Governo anuncia novos preços, da gasolina aos transportes públicos. Até a minha irmã Manela, mal acabou de tirar a carta, teve um choque, e tem choques todos os dias que o meu sobrinho aparece em casa com o boletim escolar.
Em segundo lugar, os choques podem ter diversas formas. Há os choques redondos, aqueles que nos deixam embasbacados - tivemos disso nos últimos quatro meses. Há os choques ovais, designados por melão - e disto cheira-me que teremos muitos este domingo. Até há choques às listas, lá para as bandas do Ministério da Educação.
Em terceiro lugar, existem em todos os ambientes e a todas as temperaturas - temos os choques gelados, que provocam suores frios; as notícias escaldantes; os chamados choques siderais que nos deixam siderados; os choques vazios, vulgo bluffs e boatos, mas que muitas vezes são vazios só de nome, têm mais efeitos que os outros. E os Conselhos de Ministros, que nos chocam todas as quintas-feiras.
Mas infelizmente os choques que temos tido, apesar de muitos e variados, não chegaram. O Presidente da EDP resolveu chocar Bruxelas e veja-se o resultado: temos o sector energético às escuras. O Primeiro-Ministro andou a chocar os portugueses (e as portuguesas) durante quatro meses e veja-se o resultado. O PS anda a chocar alguma, mas ainda não percebemos exactamente o que é. Daí que as propostas de choques dos partidos, meus queridos leitores, tenham a minha entusiástica aprovação. Vamos aos choques! Mas não compreendo porque nos limitamos. Vamos fazer um choque tecnológico? Sim. Vamos a um choque de gestão? É necessário. Vamos a um choque de produtividade? Mas é evidente! E um choque de valores? Então se for o do meu ordenado, nem se fala.
O País só sai do pântano aos choques, e com todos, sem excepção. A dimensão dos nossos problemas assim o exige - um choque total, em todas as dimensões, o Pai de Todos os Choques. Temos aqui, portanto, o novo desígnio nacional: vamos pôr o País em Estado de Choque. Permanente. E assim temos a garantia de ter resultados: é que se os choques prometidos pelos partidos para endireitar Portugal não resultarem, os portugueses vão ter o choque da vida deles.
Frederico Bastião é Professor de Teoria Económica das Crises na Escola de Altos Estudos das Penhas Douradas. Quando, na sequência da divulgação dos programas partidários, lhe foi perguntado como reagiria a um choque, Frederico respondeu: «Da última vez até saltei! Foram 220 volts».