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27 de Novembro de 2006 às 13:59

A resposta europeia à imigração ilegal

O tema da imigração ilegal tem vindo a ocupar um lugar central na agenda política internacional e a Cimeira Ibérica de Badajoz permitiu que os dirigentes políticos de Portugal e de Espanha abordassem, uma vez mais, a questão.

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Na União Europeia (UE), o assunto é de tal forma central para os poderes políticos que – embora de forma lenta – vem sendo objecto regular de reflexão das últimas Cimeiras Europeias (formais e informais).

Senão vejamos. Há cerca de um ano, em Hampton Court, foi discutida a política migratória na UE. Volvido mais de meio ano – em Julho passado – o Conselho Europeu continuou a reflexão, tendo sido feito um "apanhado" das iniciativas aprovadas em Hampton Court. Em Setembro, num encontro em Madrid, os ministros dos Negócios Estrangeiros e do Interior de oito países do Sul da Europa – entre os quais Portugal – analisaram o problema da imigração ilegal e a necessidade de definir uma política europeia comum de imigração e de integração. Os ministros destes países reclamaram "urgência" e forte mobilização da UE na resolução do problema da imigração ilegal no Mediterrâneo, assim como um maior envolvimento dos países de origem, de trânsito e de destino dos migrantes. No entanto – e enquanto tarda uma resposta europeia comum – Espanha, França e Itália comprometeram-se (e não obstante as conhecidas divergências na abordagem ao problema pelos actuais executivos destes países) a elaborar uma proposta conjunta sobre políticas de imigração. E, também em Outubro deste ano, na Cimeira Europeia informal de Lahti, na Finlândia, se analisou a necessidade de definir uma política comum face à imigração ilegal.

Um dos executivos mais empenhados em responder ao problema da imigração ilegal parece ser o espanhol. Percebe-se porquê. Espanha – tal como outros países do Sul da Europa – confina, por via marítima, com África, tornando-se assim uma das principais portas de entrada para muitos imigrantes. Só em 2006 calcula-se que às Canárias tenham chegado 30.000 pessoas, das quais 1.300 permanecem em centros de acolhimento. Por outro lado, o crescimento económico espanhol tem também atraído muita imigração do continente Sul-Americano. Em 2005, foi notícia a legalização de 500 mil imigrantes residentes em Espanha. Mas a imigração ilegal em Espanha não cessa de aumentar e, segundo sondagens recentes publicadas na imprensa escrita espanhola, a imigração é considerada – secundarizando o terrorismo – o principal problema social para 59,2% dos espanhóis. Em consequência, alguns reclamam já a criação de um gabinete de crise ou mesmo de um ministério específico. O governo espanhol que – até ao momento tem optado por um discurso moderado relativamente ao tema – acautelando eventuais focos de nacionalismo e/ou de xenofobia junto da população espanhola, tem promovido uma política "pedagógica" relativamente ao fenómeno. Por exemplo, em 15 de Novembro último, o executivo espanhol tornou público um relatório onde realça a contribuição globalmente positiva da imigração para o crescimento da economia espanhola, frisando que os trabalhadores estrangeiros são responsáveis por 30% do crescimento do PIB na última década. O estudo reconhece ainda que – embora o cenário possa "mudar em 2030" quando os imigrantes, que hoje trabalham, começarem a reformar-se – a imigração é igualmente positiva, a curto e a médio prazo, para o Sistema Público de Segurança Social.

Além do mais, e parecendo querer minimizar os efeitos de uma tardia política europeia sobre imigração, as autoridades espanholas têm dinamizado a discussão do problema, em particular junto dos seus vizinhos França e Portugal.

Em França o problema da imigração – sem ser novo – assume novos contornos: segundo dados oficiais, neste país vivem cerca de 4,5 milhões de imigrantes, estimando-se que haja cerca de 400 mil imigrantes ilegais. Os franceses - confrontados em 2005 com uma grave crise social – recuperam ainda (com sequelas pontuais) do choque das "banlieues". Em Maio deste ano, o executivo francês – pela mão do ministro do Interior, Nicolas Sarkozy – apresentou uma proposta de lei sobre imigração onde, genericamente, se opta por uma imigração "eleita", reforçando a exigências em termos de "competências" para alguns estrangeiros; se limita a entrada dos estrangeiros; e se restringem condições de permanência e de regularização automática. Aquando da discussão do diploma, Sarkozy recusou aceitar processos de regularização extraordinária, semelhantes aos que aconteceram em Espanha em 2005, considerando que "estes apenas estimulam a imigração ilegal". Mas – e não obstante as divergências de entendimento entre os executivos dos dois países relativamente ao assunto – na XIXª Cimeira Hispano-Francesa, realizada em 16 e 17 de Novembro último, Rodríguez Zapatero e Jacques Chirac debateram o tema da imigração e do encontro resultaram, entre outras medidas, a criação de um gabinete comum para a cooperação em matéria de imigração e a elaboração de uma Carta de Direitos e Deveres para os Imigrantes.


Já entre Portugal e Espanha, a partilha de entendimento relativamente ao tema parece ser maior. Os dois executivos anunciam-se defensores de uma política multidisciplinar que contemple medidas comuns de acolhimento, de repatriação e, de controlo e de segurança da fronteira marítima a Sul. E, nesta medida, a cooperação luso-espanhola pode ser frutuosa, designadamente junto do continente africano. Aliás, a recente Cimeira Ibero-Americana – que teve lugar de 3 a 5 de Novembro – demonstrou já existir sintonia entre os dois países. Como realçou então o Primeiro-Ministro José Sócrates, perante o fenómeno da imigração ilegal os Estados têm, em geral, duas opções: ou enveredam pela via securitária e unilateral, ou optam por consolidar um sistema baseado na segurança, mas também no espírito humanista e na cooperação com os países de origem dos imigrantes. E esta última parece ser a via preferencial a seguir quer por Portugal, quer por Espanha.

Finalizo realçando que a análise do fenómeno da imigração na UE evidencia um aspecto fundamental na actual conjuntura política europeia: a incapacidade de uma resposta institucional rápida da UE aos seus problemas mais prementes. A imigração ilegal e o tráfico de seres humanos – que afectam não só os países do Sul da Europa como também toda a Europa – são problemas humanitários e sociais e, como tal, exigem medidas urgentes. Nesta, como noutras áreas – onde, pela complexidade dos temas, se impõe uma política europeia convergente – as respostas tardias condicionam o presente e, o que é mais grave, poderão comprometer o futuro. Ora, em véspera do Conselho Europeu de Dezembro, este bem poderá ser um tema para reflexão conjunta.

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