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Benjamim Formigo 18 de Agosto de 2006 às 13:59

A nova vitória terrorista

A descoberta de uma alegada conspiração para fazer explodir em voo um número indeterminado de aviões de linha com origem e destino a Londres e EUA foi razão mais do que suficiente para um alerta generalizado das autoridades aeroportuárias, ...

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A descoberta de uma alegada conspiração para fazer explodir em voo um número indeterminado de aviões de linha com origem e destino a Londres e EUA foi razão mais do que suficiente para um alerta generalizado das autoridades aeroportuárias, o cancelamento de milhares de voo em todo o Mundo e a perturbação da vida normal dos cidadãos.

Os prejuízos materiais e morais desta nova tentativa, que não será a última, são impossíveis de estima. Pior, as consequências as médio e longo prazo estão para além dos horizontes. Se do ponto de vista policial poderá ter sido uma vitória dos Estados de Direito, do ponto de vista político foi mais uma derrota.

As operações militares contra as alegadas bases da Al Qaeda no Afeganistão não resultaram senão num caos generalizado do país e que corre o risco de se espalhar aos seus vizinhos. O ataque para a destruição das armas de destruição massiva de Saddam Hussein foi um logro que descredibilizou governos, lançou também o caos no Iraque e abriu as suas fronteiras aos radicais do Afeganistão. As vitórias de Pirro que forma a queda do regime talibã e de Saddam Hussein transformaram-se em guerras prolongadas que consomem recursos humanos e financeiros e demonstram a inutilidade das acções militares contra bases terroristas.

Ao longo da Guerra Fria os aliados criados para combaterem a expansão soviética tomaram vida própria e, ao contrário do Ocidente, olharam para o futuro, para o dia em que se tornariam desnecessários, mesmo incómodos. O dia em que o confronto iria continuar mas contra o aliado conjuntural. Esse mesmo aliado que conjunturalmente também continua a apoiar regimes impopulares e nepotismos na errada convicção de que esses regimes se eternizarão, ou na inconsciente decisão de deixar para a ocasião uma resposta às suas quedas.

Ao apoiar esses regimes os chamados países ocidentais - uma designação resquício da Guerra Fria - vêem criando anticorpos nas populações dominadas pela minoria favorável ao Ocidente.

Quando na década de 80 se falava em investir nas zonas pobres promovendo o seu desenvolvimento e impedindo as migrações ilegais de desempregados e desfavorecidos estava-se a discutir um caminho que iria minar as bases de apoio aos movimentos terroristas que do Corão fizeram as mais distorcidas interpretações sem curarem que estavam a estigmatizar todo um povo. O medo é um fenómeno irracional. Os que têm medo vêm nos árabes terroristas em potência, no Corão uma filosofia do terror. O fosso não só se criou e se aprofunda como se acentua a intolerância.

Esta consciência de intolerância conduziu à adesão de intelectuais favorecidos às causas radicais tornando um fenómeno já de si intolerável numa cruzada e dando-lhe uma pseudo filosofia.

O verdadeiro combate ao terrorismo não está nas armas. Reside no desenvolvimento económico, na promoção da igualdade, nas mentalidades de quem quer combater por um Estado de Direito. Os recursos financeiros e humanos usados na acção militar devem ser canalizados para a interdição do território de recrutamento, para a prevenção, a integração social. Uma integração que de resto só favorece as policias e os serviços de informação na recolha de elementos que levam ao desmantelamento das redes terroristas cuja dimensão - e mais preocupante ainda - capacidade financeira se desconhece.

Para trás ficou mais uma batalha vencida pelas forças de Direito numa guerra que está a ser perdida para os terroristas. Existe contudo um indicador positivo: o de as pessoas estarem a lidar com este fenómeno perverso sem medo e sem se deixarem intimidar. A esta atitude dos cidadãos falta a correspondência política dos seus governos enredados nas atitudes de força e pouco apostados nas políticas de desenvolvimento e integração.

A punição tem de ser exemplar, mas não pode ser antecedida ou acompanhada de campos de concentração como Guantanamo ou rapto de presumíveis terroristas, prisões clandestinas, etc. Hoje isso funciona contra alegados terroristas. Quantos deles o são não é possível dizer pois os advogados não têm acesso aos detidos. Amanhã estas práticas podem-se tornar um hábito.

É a falta desses hábitos que até agora nos tem distinguido da barbárie.

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