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22 de Outubro de 2014 às 21:20

Economia e geoestratégia

Portugal transformou-se num interessante mercado de oportunidades de investimento, principalmente, para os países emergentes. China, Brasil, Angola, México (estes dois últimos, não propriamente tão emergentes como os anteriores) aparecem a disputar as aquisições de empresas estratégicas ou situadas em setores estratégicos em Portugal. É quase como se tivéssemos voltado aos Descobrimentos, só que, desta feita, em vez de sermos nós a descobrir os outros, são os outros que nos andam a descobrir.

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Nesse tempo, também descobrimos riquezas noutros territórios, agora, para usar terminologia contemporânea, são os nossos ativos que começam a ser adquiridos e utilizados por esses outros. A história das nossas opções estratégicas, ao longo dos séculos, é uma constante dialética entre a opção pelas potências marítimas ou pelas potências continentais.

 

Na prática, mesmo na política de casamentos dos cortes europeias, tratava-se sempre de fazer o equilíbrio – desequilibrado para um lado ou para o outro, consoante as épocas – entre os matrimónios de príncipes e princesas de cada uma dessas potências da Europa. Como disse, esta diversificação de investimentos e de investidores, seja menos ou mais planeada, configura um posicionamento objetivo de Portugal, como a tal plataforma de que há tanto tempo se fala de circulação desses países de outras partes do mundo através desta "porta" ocidental da Europa. Só que, para além do mérito que tenha essa nova realidade, importa sublinhar a importância do valor da solidez dos caminhos estratégicos de um Estado. Nós voltámos à Europa, sim, depois de terminar o Império e é na Europa, e com a Europa, que temos de viver e de nos afirmar no Mundo.

 

Pese embora a enorme crise que se tem feito sentir, é este o espaço territorial e é este o pólo geoestratégico a que pertencemos. Ora, nesta realidade geoestratégica que integramos, a nossa relação com os Estados-membros da União Europeia assume uma premência diferente da que se verificava aqui há uns anos, antes da crise do sub-prime, antes da considerável implosão de várias estruturas do sistema financeiro internacional, antes da crise que fez estagnar as economias da Zona Euro e, em geral, da União Europeia.

 

É neste novo quadro que o Estado português tem de equacionar o que lhe importa e o que lhe interessa na definição das parcerias ou das alianças, mais ou menos tácitas ou expressas, que sempre representam os grandes investimentos em empresas de setores estratégicos de um país. Por exemplo, tanta presença de investimento chinês em Portugal – como aconteceria de igual modo se fosse outro país a fazer um investimento da mesma dimensão nesses processos – terá naturalmente consequências significativas nos anos vindouros da nossa economia e da nossa sociedade.

 

A economia portuguesa abre, cada vez mais, as suas portas principais a investidores estrangeiros, num tempo em que aumenta significativamente o afluxo de turistas a Portugal. Ou seja, a economia portuguesa acentua, cada vez mais, a sua natureza de economia aberta e com profundas ligações ao exterior. Só que, no meio de toda essa abertura, de toda essa diversificação, e de toda essa novidade em investimentos estratégicos, como referi, nós continuamos a estar na União Europeia. Por isso mesmo, será de ponderar os termos em que continuamos a considerar como naturais, investimentos de regiões do mundo mais distantes, e a considerar normal um processo em que, nos setores estratégicos, cada vez mais deixamos de ter controlo sobre eles, e esse controlo passa para fora das fronteiras da própria UE.

 

Como é evidente, as relações económicas são uma componente importantíssima das opções geoestratégicas de um país. Aqui há anos, falava-se muito da necessidade de diversificar dependências entre os diferentes países europeus cujas empresas investiam em Portugal. Outra época houve – com essas duas épocas, por vezes, a entrecruzarem-se – em que se discutiam as vantagens de diminuir, ou pelo menos não deixar aumentar, a presença de empresas espanholas em Portugal. Na verdade, existiam mesmo algumas reticências de muitos setores quanto à venda de posições em empresas estratégicas a empresas de países mais poderosos da UE.

 

Passámos agora de empresas da União Europeia para empresas de países distantes, com os quais temos laços históricos, menos ou mais profundos. O mercado é livre, mas tem regras. E para além de regras, tem naturalmente princípios e valores. E é no quadro dessas regras e desses valores, e desses princípios, que os Estados e os governos devem definir as suas opções, as suas omissões, as suas diligências, os seus atos. Estamos num tempo muito relevante da história de Portugal e da sua economia enquanto Estado independente. Temos diante de nós casos como o da TAP, o da PT e o do Novo Banco. É preciso que quem tem responsabilidades aos mais variados níveis, com influência nos destinos dessas empresas, tenha bem presente que as decisões que agora se tomarem marcarão a história de Portugal durante muito tempo. 

Este artigo está em conformidade com o novo Acordo Ortográfico

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