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[679.] Mini, Citroën, Hyundai, Nissan, Mercedes-Benz 

Satisfazendo a procura - ou antes procurando nova procura -, a indústria faz de um produto dois ou três, ou metamorfoseia-o até ele ficar irreconhecível. Cabe à publicidade tornar a metamorfose normal e necessária.

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A marca automóvel Mini, fabricada pela BMW desde 2000, tem um modelo maxi. Tanto assim que, diz o anúncio, "o teu novo Mini Clubman não é só teu. É também da tua família, do teu cão ou da tua bicicleta. Há espaço para tudo." Para uma marca que, no nome, nas dimensões iniciais e até na mitologia que desenvolveu, tudo girava em torno da sua pequenez, a metamorfose é grande. A fotografia do reclame pretende precisamente mostrar a grande dimensão do veículo: as quatro portas abertas, mais as duas folhas da porta traseira. O carro, em plano picado, pode ser comparado com o espaço: tem uma garagem enorme só para ele e a porta ao fundo é anã.

 

Mas uma novidade, no capitalismo de consumo, nunca vem só. Além da dimensão maxi, o Mini traz "todo o equipamento de série que sempre quiseste ter". O dois em um do veículo é condensado no título do anúncio: "Tão espaçoso que vem cheio de equipamento."

 

Nada é impossível na publicidade e, por isso, o título do reclame do novo Citroën Jumpy diz precisamente "Nada é impossível". No Terreiro do Paço, um carpinteiro coloca umas tábuas de sobra numa Citroën Jumpy que tem pintada lateralmente o nome da empresa do carpinteiro: "Carpinteiro."

 

Até aqui é vida comum, excepto que o Arco da Rua Augusta mostra uma "impossível" porta de madeira a toda a altura. O resultado é tão estranho à vista que os publicitários, sempre desejosos de nitidez para as suas mensagens, imagéticas ou escritas, sentiram a necessidade de escrever por cima do Arco da Rua Augusta a seguinte descrição: "Arco da Rua Augusta." Fica bem, porque faz eco com o carpinteiro da empresa "Carpinteiro". O anúncio pede ao observador que pense, o que significa obrigá-lo a olhar por alguns segundos, um conseguimento por vezes difícil na publicidade fixa: o observador precisa desses segundos para concluir que o carpinteiro da empresa "Carpinteiro" fez a porta que está no Arco da Rua Augusta e que é identificado como "Arco da Rua Augusta". Daí que nada seja impossível, desde que haja imaginação.

 

E, para os anúncios automóveis, por vezes já é uma carga de trabalhos não repetir ou copiar slogans anteriores. O novo Hyundai Tucson apresenta-se humildemente sem frase sonhadora ou de promessas, dizendo apenas "Agora com 141 cv e caixa TDCT". A campanha do Nissan Qashqai optou pela oferta única de venda, reclamando a originalidade: "Existem crossovers e existe 'o' crossover", porque, como diz no final do texto, "original, há só um!"

Já o novo Mercedes-Benz GLC Coupé anuncia-se com a frase "Atitude em todos os terrenos." Pura poesia, dado que um carro só tem "atitude" se assim o quisermos imaginar. A frase, porém, faz da "atitude" do condutor - ele é que terá "atitude em todos os terrenos" - a atitude do próprio automóvel. A frase mistura com felicidade o condutor - e o observador - com o veículo. Parece nada dizer, mas diz, porque "atitude" é, neste contexto, uma palavra "chique a valer", para citar uma personagem de Eça. Tanto quer dizer "postura", "porte" ou "ar", como "sinal exterior de riqueza", tendo em conta que o preço é superior a 60 mil euros. De forma que, se o carro tem "atitude", o proprietário tem muito mais, na condução e na carteira. Os publicitários reutilizaram uma palavra já conhecida de campanhas doutras marcas para sugerir tanto a classe do automóvel como a classe social do proprietário. 

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