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[562.] Divani & Divani

Cada fotografia é uma narrativa. Tem um antes e um depois. Cabe ao observador imaginar o passado e o futuro da imagem.

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Acontece mais numas que noutras. Em geral, as fotos de composição assimétrica e com elementos dinâmicos, sugerindo movimento, são mais narrativas que as simétricas e estáticas. Os anúncios de jóias ou outros produtos, que pretendem associar ideias de durabilidade e de sublime aos produtos, diminuem ou anulam o movimento dos elementos das imagens. Os anúncios interessados em espicaçar o modo de vida "carpe diem" dos observadores estão quase sempre marcados pelo dinamismo da composição.

 

Os publicitários escolhem entre uma e outra opção para narrativizar o olhar do observador, mas há um meio termo. Um anúncio singelo de sofás Divani & Divani mostra na perfeição um exemplo intermédio entre o modelo estático e o modelo dinâmico. Não é a primeira vez que esta marca opta pelo modelo intermédio. Para criar a tensão entre o estático/sublime e o movimento/narrativo, recorre de novo no presente reclame a um elemento subtil: o olhar entre um homem e uma mulher.

 

Os anúncios de sofás e mobiliário em geral precisam de apresentar pelo menos uma pessoa, para o observador poder avaliar a dimensão dos produtos. Neste caso, há, como em casos anteriores da marca, um homem e uma mulher. O sofá anunciado, nem por acaso com o nome Borghese, ou burguês, é modular, pelo que pode ocupar um grande espaço, como no exemplo da fotografia. E grande é a sala mostrada: o homem e a mulher ocupam um pequeno espaço, para dar a dimensão do sofá, mas suficiente para não diminuir a "humanidade" da narrativa.

 

A sala é grande, tem duas enormes janelas para um jardim, com cortinados leves de vários metros de altura. Na parede, um quadro de metro e meio por metro e meio, nos mesmos tons claros e quentes do conjunto. A fotografia capta a sala do amplo chão envernizado até ao tecto, muito lá em cima. Tudo muito calmo, burguesmente sublime. Será o sofá símbolo cimeiro da vida burguesa?

 

E a narrativa, onde está? As linhas de força da fotografia afunilam da esquerda, onde aparece o homem de pé, para a direita, onde está o seu destino, a mulher sentada no sofá.

 

Há e não há movimento. Ele olha intensamente para ela, de mãos nos bolsos, enquanto parece acabado de chegar da empresa e dá um passo em direcção a ela, qual felino conquistador. A fêmea, sentada, de perna cruzada, entre a posição elegante e relaxada, sorri para ele: acolhe-o, espera-o. Ele vai a caminho da mulher-sofá, ou do sofá-mulher. Essa é a narrativa comercial: compra o sofá burguês e conquista-a. Agarra a mulher, amarra a mulher à casa.

 

A frase de acesso confirma a potência de narrativa sugerida ao observador, a narrativa burguesa da imagem: "Bem-vindo a casa", a casa com sofá e mulher disponível nele sentada. Uma vida sem problemas depois do trabalho. Ela, a mulher-sofá, esperar-te-á.

 

Com o híbrido estático-movimentado, o dinâmico "carpe diem", ou "agarra o dia", torna-se com o sofá num calmo "agarra muitos dias", e, também, "agarra a mulher". De um dia para muitos dias. De "what a difference a day makes" para a transfiguração comercial: "What a difference a couch makes!"

 

eduardocintratorres@gmail.com

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