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12 de Janeiro de 2021 às 09:40

Relançamento e reforma da economia – (II)

À medida que os efeitos da pandemia se prolongam no tempo, aumenta o risco da saída do mercado de trabalho – através do desemprego, de reformas antecipadas ou, quando possível, da emigração – de mão-de-obra e sobretudo de experiência especializada e de talento.

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1.O arrastamento do choque pandémico está a pôr a Europa perante dois tipos de problemas: a nível global, está a “forçar” a procura de formas de articulação e de cooperação em áreas de importância económico-financeira e social críticas. Como resultado, o projecto europeu pode vir a dar passos considerados politicamente inviáveis antes da pandemia. Refiro-me à implantação e operacionalização de mecanismos e de instrumentos de estabilização e de relançamento das economias do euro. Trata-se de apoiar com adequadas políticas orçamentais a “exausta” política monetária do BCE que – com efeitos perversos crescentes – continua a suportar a estabilidade dos mercados financeiros do euro. Questão crítica à luz dos desequilíbrios e das dificuldades com que a crise actual está a confrontar as economias mais frágeis da área do euro e que irei abordar adiante. Na verdade, face à crescente gravidade do choque pandémico, a Europa parece ter compreendido que a alternativa ao avanço do movimento de integração será a fragmentação económica e social com uma intensidade que colocará em risco o próprio projecto europeu; por outro lado, a nível nacional, os efeitos do choque pandémico estão a fazer-se sentir de forma transversal, com um impacto estrutural que depende da reacção das respectivas políticas públicas. Como esta resposta está a ser fortemente assimétrica nas diferentes economias, tem-se vindo a agravar o já elevado nível de fragmentação com que a economia da Zona Euro tinha saído da crise financeira.

2. A nível interno, a pandemia está de facto a colocar os governos perante problemas e desafios de gravidade sem precedentes em tempos de paz. Embora a vulnerabilidade das economias europeias não seja a mesma – varia com a estrutura produtiva e com a situação orçamental – o arrastamento da crise pandémica está a enfraquecer os sectores produtivos mais expostos e a atingir de forma crescente os grupos sociais mais vulneráveis.

O prolongado choque pandémico está mesmo a ter um impacto estrutural crescente, destruindo capital produtivo e reduzindo o potencial de crescimento de sectores-chave. Em paralelo, está a provocar uma queda abrupta do investimento com um impacto negativo inevitável sobre a produtividade e o enfraquecimento do tecido produtivo.

Acresce que à medida que os efeitos da pandemia se prolongam no tempo, aumenta o risco da saída do mercado de trabalho – através do desemprego, de reformas antecipadas ou, quando possível, da emigração – de mão-de-obra e sobretudo de experiência especializada e de talento, cruciais para o relançamento.

No entanto, esta evolução não está a reflectir as ameaças que hoje impendem sobre um número alargado de empresas. Para o compreender temos apenas de ter presente a intensidade com que as políticas públicas têm “lançado mão” de algumas medidas especiais – em particular, de garantias e de moratórias.

Utilizadas para evitar um choque imediato sobre a situação orçamental, estas medidas apresentam-se com riscos e com efeitos potenciais perversos que podem vir a fazer-se sentir no pós-pandemia: por um lado, as empresas mais expostas à crise vão sair da pandemia muito endividadas e com estruturas financeiras ainda mais frágeis; por outro, como resultado das dificuldades destas empresas, os bancos correm o risco – em particular no caso das moratórias – de ter de absorver novas imparidades com origem na deterioração da qualidade das suas carteiras de crédito. Evolução que, a verificar-se, conduziria à destruição de capital bancário o que faria correr o risco de uma redução do financiamento bancário às empresas, com um inevitável efeito de travagem do relançamento pós-pandemia.

Este quadro coloca-nos perante três tipos de questões: desde logo, qual a margem de actuação das políticas públicas para responder aos problemas indicados, de modo a proteger a capacidade produtiva instalada e a relançar a actividade económica? Depois, para além das medidas e dos programas públicos, qual o papel que caberá aos mercados financeiros – ao mercado bancário tradicional e às instituições especializadas – no financiamento do esforço de relançamento e de modernização? Por último e na linha do que referi no artigo anterior, quais as reformas estruturais críticas que devem nortear os programas de reorientação do nosso modelo de crescimento económico? (a continuar)

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