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Nacionalização da Efacec "foi impulsionada por gestores", que não salvaguardaram empregos

Auditoria do Tribunal de Contas à nacionalização da empresa responsabiliza gestores por não terem acautelado objetivos do resgate pelo Estado e anterior governo por ter decidido o resgate "sem fundamentação, técnica e independente, do interesse público".

Até abril deste ano, a Efacec tinha prejuízos consolidados de 21,5 milhões de euros.
Ricardo Meireles
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A auditoria final do Tribunal de Contas (TdC) à Efacec, empresa resgatada pelo Estado em 2020, conclui que "a nacionalização foi impulsionada pelos gestores" da empresa "estando estes, em simultâneo, a promover a venda de ações no mercado", lê-se no documento publicado esta segunda-feira.

Segundo o Tribunal de Contas, a nacionalização da Efacec "foi realizada sem fundamentação, técnica e independente, do interesse público" que a justificou. A fatura para o Estado poderá atingir os 564 milhões, segundo os juízes do TdC, confirmando o valor estimado na auditoria preliminar tornada pública no início deste mês.

O relatório de auditoria revela que "apesar do objetivo de salvaguarda dos postos de trabalho, durante a nacionalização os gestores da Efacec continuaram a promover a política de emagrecimento da empresa, incidindo sobre os melhores remunerados, em regra mais qualificados". "Em 2022, quase um terço dos trabalhadores tinha deixado a empresa", lê-se nas conclusões da auditoria.

No início deste mês, o Negócios tinha avançado que o apoio público à Efacec tinha sido pago às cegas e com os responsáveis protegidos

Agora, o Tribunal de Contas vem confirmar que o resgate à empresa anteriormente detida por Isabel dos Santos "foi efetuado sem identificação das suas causas e responsáveis (acionistas, credores, administradores) aumentando o risco moral destes ficarem protegidos contra as consequências das suas ações ou omissões".

"Sem atingir qualquer dos objetivos da nacionalização, o financiamento público da Efacec apenas contribuiu para manter a empresa em atividade até à sua reprivatização três anos e quatro meses depois", escreve o TdC.

O documento explica que "após a nacionalização, a Parpública levou três meses a nomear novo conselho de administração (CA) para a Efacec e reforçou o poder do presidente da comissão executiva que também passou a liderar o CA". "Decisões que não favoreceram a mitigação dos riscos reputacionais provocados pela antiga acionista", escrevem os juízes.

A decisão da nacionalização da empresa foi anunciada em julho de 2020, após uma reunião do Conselho de Ministros, e anunciada pelo então ministro da Economia, Pedro Siza Vieira.

O Conselho de Ministros de Portugal aprovou na tarde de 2 de julho o decreto de lei para nacionalizar "71,73% do capital social da Efacec", uma empresa nacional que "constitui uma referência internacional em setores vitais para a economia portuguesa", descrevia à época o Governo.

"A repercussão dos acontecimentos relacionados com a estrutura acionista da Efacec Power Solutions, particularmente os efeitos do arresto de ativos de alguns dos seus acionistas", escrevia o Executivo de António Costa numa alusão ao facto de a Procuradoria-Geral de Angola ter pedido o arresto de bens da filha do ex-Presidente angolano, "levou à impossibilidade de exercício dos direitos inerentes às participações que correspondem à maioria do capital da empresa, gerando diversas dificuldades no plano comercial e operacional e, em consequência, agravaram a situação financeira desta, situação que se tem vindo a deteriorar a um ritmo acelerado".

Linha covid-19 criada só para a Efacec

A auditoria do Tribunal de Contas, tornada pública esta segunda-feira, revela ainda que "o Estado privilegiou o Grupo Efacec ao criar uma linha de apoio Covid-19 específica e exclusiva para as sua empresas".

"O processo enfermou de falta de transparência, visto o publicado não mencionar a Efacec , dando a aparência desta linha se destinar a 'qualquer empresa sediada em território nacional' que cumprisse as condições estabelecidas".

"Nem há evidência de a Parpública ter confirmado, como lhe competia, que o produto dos empréstimos não foi utilizado para pagar à Winterfell 2", de Isabel dos Santos, e à MGI Capital, que tem 28,27% da Efacec e é detida a meias pelo Grupo José de Mello e a Têxtil Manuel Gonçalves.

Caderno de encargos da reprivatização era "menos exigente"

Os juízes do Tribunal de Contas concluem nesta auditoria que "o caderno de encargos que culminou na venda da Efacec foi menos exigente quanto à capacidade técnica dos potenciais investidores e os critérios de seleção não foram associados a ponderações, métricas e prioridades, o que, associado à falta de comissão especial de acompanhamento do processo de reprivatização não garantiu a plena observância dos princípios de transparência".

Mais, apesar de o negócio ter "impacto material para as finanças públicas e contribuintes portugueses", o contrato de compra e venda de ações à Mutares "está depositado em entidades privadas, fora do perímetro da administração do Estado português, em desfavor da transparência, do rigor, da isenção, da imparcialidade e da melhor defesa do interesse público".

Além disso, na escolha da Mutares "o Estado ao escolher a proposta com maior Taxa Interna de Rentabilidade (TIR) introduziu risco à operação", frisa a auditoria, uma vez que "para obter retorno futuro, mas incerto, gastou mais 271 milhões de euros". "Decisão ainda mais arriscada por ficar dependente do sucesso do investidores em inverter a tendência de degradação do volume de negócios da Efacec e vender a empresa a médio prazo (em 5 anos), pelo menos, por 563 milhões de euros, como projetado pela Mutares".

Tudo somado, conclui a auditoria do TdC, a reprivatização culminou, até maio deste ano, "no financiamento público de 484 milhões de euros" pela Parpública e 35 milhões de euros pelo Banco Português de Fomento. "E há o risco de subir até 564 milhões de euros", resumem os juízes.

Quanto ao acionista minoritário da Efacec, a MGI Capital, "não acompanhou o Estado no apoio financeiro" nem teve despesas com a reprivatização.

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