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Pedro Bragança Ferreira - Economista 28 de Julho de 2015 às 19:30

Crédito ao consumo, outra vez, em níveis elevados

Importa alertar que o excessivo endividamento do país e os elevados graus de alavancagem da banca é que nos trouxeram até aqui e, nesse sentido, seria fundamental evitar que se cometam os mesmos erros do passado.

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A banca afirma que, decorrente da crise que vivemos desde 2008, do abrandamento da economia portuguesa, dos níveis de desemprego e do incumprimento, em especial desde 2011, os critérios de risco na concessão de crédito foram revistos, tornando-os mais exigentes e consequentemente mais difícil o acesso ao crédito. Nesse cenário seria expectável que os níveis de crédito diminuíssem, o que realmente aconteceu durante algum tempo, contudo o facto mais estranho é que consistentemente, desde o início de 2015, o valor global do crédito ao consumo concedido em Portugal, tem vindo a registar níveis equiparáveis ao período anterior à entrada da troika no nosso país e pré-crise. Será uma consequência da melhoria das perspetivas económicas anunciadas pelos diversos órgãos nacionais e internacionais ligados às questões macroeconómicas? Será por o preço dos combustíveis permanecer baixo durante tanto tempo (reduzindo os encargos das famílias)? Será pela redução "ligeira" da carga fiscal e da reposição parcial dos rendimentos aos funcionários públicos? Será a queda das taxas de juro e a baixa dos spreads praticados pela banca? Será o ritmo positivo de criação de emprego e a descida do desemprego?

 

É inevitável questionarmo-nos sobre os motivos que estão na base de tal facto, já que ninguém deseja que os bancos tenham problemas em termos de gestão do risco de crédito e muito menos voltem aos resultados negativos registados.

 

Por outro lado, não deixa de ser intrigante que os níveis de concessão de crédito ao consumo estejam a crescer este ano e consistentemente elevados nos últimos meses, quando os últimos dados divulgados pelo Banco de Portugal indicam que, o crédito malparado referente às famílias terá aumentado em 2014 (4,37%), face a 2013 (3,98%). Estes valores tornam-se ainda mais impressionantes se considerarmos apenas o crédito para outros fins (consumo, cartões de crédito, etc.), onde a taxa de incumprimento se cifrou em 16,18%, em 2014 (1.607 milhões de euros), versus 12,63%, em 2013 (1.296 milhões de euros).

 

Estudos recentes que envolveram 28 países europeus (relatório europeu sobre crédito no segmento particulares e pequenas e médias empresas da consultora Norte Americana Oliver Wyman e da empresa sueca especializada em gestão, serviços e recuperação de crédito, Intrum Justitia) revelaram que Portugal no domínio do incumprimento de crédito global se situa como o 8.º pior entre os 28 analisados. Este índice piora ainda mais, quando falamos exclusivamente dos créditos pessoais, posicionando o nosso país na 5.ª pior posição neste domínio, de entre todos os países estudados.

 

Ainda o trimestre passado, a Comissão Europeia alertou Portugal para que os bancos portugueses, apesar de terem melhorado os seus rácios de cobertura (percentagem de provisões para suportar eventuais perdas em empréstimos em incumprimento ou em risco de incumprimento – atualmente em torno dos 60%), teriam "capacidade limitada" para suportar uma vaga de incumprimento nos empréstimos, sem injeções de capital adicionais.

 

Não se quer com isto dizer que não seja positivo ver que a economia volta a ter sinais de recuperação. Nada disso, antes pelo contrário. Que o nosso país recupere, é o desejo de todos nós. Apenas importa alertar que o excessivo endividamento do país e os elevados graus de alavancagem da banca é que nos trouxeram até aqui e, nesse sentido, seria fundamental evitar que se cometam os mesmos erros do passado.

 

Desta forma, a pergunta é legítima, no sentido da prudência e do escrutínio sobre o qual a banca deverá estar, especialmente depois de todos os casos que tiveram lugar no nosso país e que abalaram a confiança até aqui existente por parte do povo português num setor historicamente sólido, até então: estarão os atuais critérios de risco da banca adequados à conjuntura atual?

 

Vamos, sinceramente, esperar que sim.

 

Economista

 

Este artigo está em conformidade com o novo Acordo Ortográfico

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