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PJ faz buscas à REN e EDP por suspeitas de corrupção. Mexia e Manso Neto arguidos

Sexta-feira de buscas à REN, EDP e à consultora BCG. A PGR suspeita de corrupção activa, passiva e ainda participação económica em negócio. António Mexia e João Manso Neto são arguidos.

Miguel Baltazar/Negócios
02 de Junho de 2017 às 14:31
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A Polícia Judiciária empreendeu, esta sexta-feira 2 de Junho, buscas aos escritórios em Lisboa da EDP, da REN e da Boston Consulting Group (BCG). Corrupção activa, corrupção passiva e participação económica em negócio são as suspeitas da investigação que decorre no Departamento Central de Investigação e Acção Penal (DCIAP). António Mexia e João Manso Neto foram constituídos arguidos. 

Tanto a eléctrica presidida por António Mexia como a gestora energética sob o comando de Rodrigo Costa confirmaram as buscas. 

"A REN - Redes Energéticas Nacionais confirma que, durante o dia de hoje, decorreram diligências por parte das autoridades judiciais, na sede da empresa, em Lisboa. A REN continuará, como sempre, a colaborar com as autoridades em tudo o que estiver ao seu alcance", foi a posição oficial da companhia.

Mais tarde, em comunicado à CMVM, a empresa liderada por Rodrigo Costa confirmou o âmbito da investigação: "a REN – Redes Energéticas Nacionais vem, pelo presente, informar o mercado e o público em geral que, durante o dia de hoje, a Polícia Judiciária realizou buscas na sede da sua subsidiária REN – Rede Eléctrica Nacional e que, pela informação disponível, o inquérito que subjaz às buscas abrange o período entre 2004 e 2014 e estará relacionado com a introdução no sistema Português dos designados Custos para a Manutenção do Equilíbrio Contratual (CMEC)".

No mesmo documento, adiantou que a REN não foi constituída arguida e que "colaborou activamente com as autoridades e manterá, como é seu dever, tal atitude de plena cooperação".


Também a EDP confirmou a operação e a recolha de informação, garantindo a colaboração com as autoridades. "A sede da EDP foi objecto de uma visita de um Procurador da República do DCIAP, acompanhado de vários inspectores da Polícia Judiciária. A visita dos referidos elementos insere-se no âmbito de uma investigação que teve origem numa denúncia anónima, reporta-se a matéria relacionada com os Contratos de Aquisição de Energia (CAE) e a sua substituição pelo regime dos Custos de Manutenção do Equilíbrio Contratual (CMECs) - iniciada no ano de 2004 - e visou a obtenção de elementos documentais relacionados com os referidos procedimentos", sublinhou a eléctrica em comunicado.

 

A administração da EDP diz ter dado "instruções específicas e muito claras no sentido de ser facultado aos investigadores o acesso irrestrito a toda a informação", acrescentando que "foi prestada toda a colaboração com vista ao esclarecimento dos factos". No mesmo comunicado, adianta que foram constituídos como arguidos os representantes da EDP que, à data, assinaram os contratos respeitantes a esta temática. "A EDP continuará à disposição das autoridades para prestar os esclarecimentos tidos por convenientes", remata.


Também a consultora BCG já reagiu: "A The Boston Consulting Group confirma que a Polícia Judicária esteve presente no escritório em Lisboa, tendo disponibilizado todos os elementos necessários à investigação em curso, e que continuará a colaborar com as autoridades no que for necessário assegurando sempre a confidencialidade dos seus clientes". 


Suspeitas de corrupção

A Polícia Judiciária, que está a coadjuvar o processo, não faz comentários. A Procuradoria-Geral da República é que explica o motivo das diligências que decorreram no âmbito de um inquérito a correr no Departamento Central de Investigação e Acção Penal (DCIAP), onde o Ministério Público tem os dossiês de maior complexidade económica. 

"O inquérito tem como objecto a investigação de factos subsequentes ao processo legislativo bem como aos procedimentos administrativos relativos à introdução no sector elétrico nacional dos Custos para Manutenção do Equilíbrio Contratual (CMEC). Os designados CMEC são uma compensação relativa à cessação antecipada de contratos de aquisição de energia", indica o comunicado oficial da PGR. 

A notícia das buscas foi avançada pela SIC Notícias, que adiantava que os departamentos financeiros, contabilidade, informática e os gabinetes de administração foram os visados pelas buscas. 

O Ministério Público, coadjuvado pela Unidade Nacional de Combate à Corrupção da Polícia Judiciária, indica que em causa estão "factos susceptíveis de integrarem os crimes de corrupção ativa, corrupção passiva e participação económica em negócio".

A TVI e a SIC Notícias adiantam que António Mexia, presidente da EDP desde 2005, e João Manso Neto, presidente da EDP Renováveis, foram constituídos arguidos - ou seja, suspeito de ter praticado factos susceptíveis daqueles crimes enunciados pela PGR. "Confirma-se que António Mexia e João Manso Neto foram constituídos arguidos", avança o gabinete de comunicação da PGR. 

Também Rui Cartaxo, que foi presidente da REN e que é agora chairman do Novo Banco, estará na lista de arguidos, segundo começou a SIC Notícias, que depois negou a informação. Neste caso, não há confirmação por parte da PGR. 

No campo da REN, os arguidos são João Conceição e Pedro Furtado.

A EDP e a REN não quiseram fazer comentários a estas informações. 


CMEC e CAE

 

A transição dos contratos de aquisição de energia, denominados por CAE, para custos para a manutenção do equilíbrio contratual, os chamado CMEC remonta à década passada. 

 

Os CMEC foram uma forma encontrada pelo Estado português, com o aval da Comissão Europeia, de conseguir compensar o fim antecipado de contratos de aquisição de energia que estavam em vigor em 2007 em infra-estruturas da EDP. Esses contratos, que representavam uma receita certa da eléctrica, foram rasgados, facilitando a entrada no mercado interno de energia, imposto por Bruxelas. 

Para facilitar o fim dos CAE vieram os CMEC, que asseguravam uma compensação adequada para garantir uma neutralidade financeira à eléctrica. A ideia da compensação pelo fim antecipado dos CAE foi decidida no Executivo de Pedro Santana Lopes (de que Mexia fazia parte), no final de 2004, mas só executada pelo Governo de José Sócrates, em 2007, com Manuel Pinho no Ministério da Economia e com António Mexia já à frente da eléctrica nacional.

Neste processo, o fim dos CAE implicava a REN como a EDP: a primeira como entidade concessionária; a segunda como produtora com uma licença de produção de energia eléctrica que abastece o sistema eléctrico de serviço público.

Não é a primeira vez que surgem notícias em torno de investigações judiciais às CEMC – a última barragem da EDP a beneficiar desta compensação deixa de ter essa vantagem em 2027. Em 2014, o Negócios avançava que a Procuradoria-Geral da República estava a investigar as garantias dadas à EDP, tendo inclusive ouvido várias personalidades.


Na época da troika, o Governo de Passos Coelho classificava os CMEC como "rendas excessivas", uma qualificação recusada por Mexia - visando a redução dos custos para os contribuintes devido a estas compensações à EDP. Aliás, a Comissão Europeia quis abrir uma investigação aprofundada a todo o dossiê, tema para o qual também a Autoridade da Concorrência olhou. 

OS POSSÍVEIS CRIMES INVESTIGADOS 

A PGR refere que, nas buscas, estão em causa suspeitas de práticas que se podem enquadrar em matéria de corrupção activa, corrupção passiva ou participação económica em negócio. O Negócios elenca estas práticas, segundo o Código Penal.

Corrupção passiva (373.º) 
Quando um funcionário directa ou indirectamente, solicita ou aceita, para si ou para um terceiro, uma "vantagem patrimonial ou não patrimonial, ou a sua promessa, para a prática de um qualquer acto ou omissão contrários aos deveres do cargo, ainda que anteriores àquela solicitação ou aceitação".

Corrupção activa (374.º) 
Quando alguém, directa ou indirectamente, dá ou promete a um terceiro uma vantagem patrimonial ou não patrimonial "para a prática de um qualquer acto ou omissão contrários aos deveres do cargo, ainda que anteriores àquela solicitação ou aceitação".

Participação económica em negócio (373.º) 
"O funcionário que, com intenção de obter, para si ou para terceiro, participação económica ilícita, lesar em negócio jurídico os interesses patrimoniais que, no todo ou em parte, lhe cumpre, em razão da sua função, administrar, fiscalizar, defender ou realizar";

"O funcionário que, por qualquer forma, receber, para si ou para terceiro, vantagem patrimonial por efeito de acto jurídico-civil relativo a interesses de que tinha, por força das suas funções, no momento do acto, total ou parcialmente, a disposição, administração ou fiscalização, ainda que sem os lesar";

"O funcionário que receber, para si ou para terceiro, por qualquer forma, vantagem patrimonial por efeito de cobrança, arrecadação, liquidação ou pagamento que, por força das suas funções, total ou parcialmente, esteja encarregado de ordenar ou fazer, posto que não se verifique prejuízo para a Fazenda Pública ou para os interesses que lhe estão confiados". 



(Notícia actualizada às 19:23 com mais informações, nomeadamente que António Mexia e Manso Neto são arguidos, e às 19:55 com o comunicado da EDP)

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