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Porque razão foi necessário “limpar” o Novo Banco ainda em 2015?

O receio de que o Banco de Portugal perdesse para as autoridades europeias o poder de autoridade de resolução sobre o Novo Banco a partir de 1 de Janeiro e as imposições do BCE obrigaram o supervisor a tomar medidas ainda em 2015.

Miguel Baltazar/Negócios
30 de Dezembro de 2015 às 20:28
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Quando os resultados dos testes de stress ao Novo Banco foram divulgados, a 14 de Novembro, o mercado ficou a saber que a instituição de transição precisava de reforçar a sua solidez em 1.400 milhões de euros. E tinha nove meses, ou seja, até ao final de Agosto de 2016 para responder a esta exigência.

 

No entanto, o Banco de Portugal acabou por decidir avançar ainda em 2015 com uma decisão que justifica como parte da medida de resolução aplicada ao BES a 3 de Agosto de 2014 e que, na prática, se traduz num reforço da solidez do Novo Banco em quase 2.000 milhões de euros.

 

A "má" herança do BES

Entre os dois momentos, vários factores mudaram e justificam, para a entidade liderada por Carlos Costa, a necessidade de retirar do Novo Banco cerca de 2.000 milhões de euros de dívida sénior destinada a institucionais, que voltaram para o BES e que, desta forma, se traduzem em perdas para estes investidores. Para a instituição liderada por Eduardo Stock da Cunha, a decisão traduz-se num reforço de solidez que permite elevar o rácio de capital a 13%.

 

Uma das circunstâncias que se alterou e que, para o Banco de Portugal, justifica a adopção desta medida e o momento da sua decisão foi a constatação de que as perdas já assumidas ou a reconhecer pelo Novo Banco com créditos herdados do BES e que foram considerados irregulares totalizavam 2.000 milhões. E tratando-se de uma "herança" do BES, o supervisor entendeu que esta factura deveria ser imputada aos accionistas e credores do banco "mau".

 

"Esta medida é necessária para assegurar que, conforme estipulado no regime de resolução, os prejuízos do BES são absorvidos, em primeiro lugar, pelos accionistas e pelos credores daquela instituição e não pelo sistema bancário ou pelos contribuintes", sublinha o supervisor no comunicado de 29 de Dezembro.

 

Evitar as novas regras da resolução

Como a entidade liderada por Carlos Costa encara a transferência de obrigações para o BES como parte da medida de resolução decidida a 3 de Agosto de 2014, houve necessidade de concretizar esta decisão ainda em 2015 para evitar que a deliberação fosse enquadrada pelas novas regras europeias sobre a resolução bancária, que entram em vigor a 1 de Janeiro de 2016. Isto porque não é claro se, no novo enquadramento, o Banco de Portugal se manterá como autoridade de resolução com poderes sobre o BES e o Novo Banco.

 

No caso de ser o Conselho Único de Resolução a assumir esta responsabilidade, e tendo em conta as novas regras, poderia ser aplicada uma nova medida de resolução ao Novo Banco, cujos custos seriam assumidos pelo Fundo de Resolução, pelos investidores com dívida sénior – a instituição não tem dívida subordinada – depositantes institucionais e depositantes comuns acima de 100 mil euros, de acordo com a hierarquia que entra em vigor a 1 de Janeiro.

 

Com esta opção, o Banco de Portugal pretendeu, assim, "proteger todos os depositantes do Novo Banco, os credores por serviços prestados e outras categorias de credores comuns", como sublinha o comunicado do supervisor.

 

A pressão do BCE

As exigências de solidez que o Banco Central Europeu impôs ao Novo Banco e o calendário de cumprimento destes requisitos (1 de Janeiro de 2016) também desempenharam um papel na necessidade de avançar com uma medida que capitalizasse a instituição até ao final de 2015.

 

Tal como todas as instituições bancárias portuguesas, o Novo Banco tem de apresentar um rácio de capital mínimo de 10,5% a partir do início de 2016. Uma exigência que, tendo em conta a deterioração dos resultados do banco no último trimestre deste ano, obrigou a que tivessem de ser mobilizadas várias centenas de milhões de euros para cumprir os requisitos definidos pelo BCE.

 

Fontes contactadas pelo Negócios reconhecem que, independente da opção de "limpar" a totalidade das perdas que o Banco de Portugal atribui a créditos irregulares concedidos pelo BES (2.000 milhões), seria sempre necessário reforçar a solidez do Novo Banco num valor entre 500 e 1.000 milhões de euros ainda este ano. Por esta razão, o supervisor deixou cair a ideia de capitalizar a instituição com a venda de seguradora GNB Vida ao Fundo de Resolução, opção que chegou a estar em cima da mesa por se revelar insuficiente para as necessidades de capitalização.

 

Uma medida para "embelezar a noiva"

Ao optar por capitalizar o Novo Banco no quadro da medida de resolução aplicada ao BES a 3 de Agosto de 2014 e com perdas para os detentores de cinco emissões de dívida sénior, o Banco de Portugal procurou ainda criar condições para facilitar a venda do banco de transição, a retomar no início de 2016.

 

"Este desenvolvimento, bem como o recente acordo com a Comissão Europeia referente aos compromissos a aplicar ao Novo Banco, eliminam incertezas e contribuem positivamente para o relançamento, que acontecerá em Janeiro de 2016, do processo de venda da participação do Fundo de Resolução no capital do Novo Banco", sublinha o comunicado do Banco de Portugal.

 

Com a transmissão de 2.000 milhões de dívida sénior para o BES, o Novo Banco reforçou o seu rácio de solidez para cerca de 13%, segundo as estimativas anunciadas pela instituição, o que lhe dá margem para absorver as perdas esperadas em 2016, parte delas que o Banco de Portugal ainda imputa aos créditos irregulares concedidos pelo BES. Além disso, a instituição fica com folga para fazer face aos custos do processo de reestruturação que tem em curso.
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